sábado, 31 de dezembro de 2011

Novo

Deuses choram pelos homens inapropriados,
por suas maçãs e seus pecados.
Giram os Céus, rodam os Anjos
enquanto rezam as carolas
e bêbados proféticos
alertam para as pragas
em todas as águas.
Que houvesse logo a renovação
que os "Sacros Textos" anunciam.
Que Shiva não tardasse
e que o novo mundo breve chegasse,
para que nem todo sonho acabasse.

sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

Romã

Apenas os lírios imerecidos
resistem no jardim sombrio.
Estão secas as seivas do desejo
e inférteis estão os ardores.

Daninhas ervas
esterilizaram as sementes
do Futuro que se quis

e o perfume
de ontem a noite,
perdeu-se nesse
dia desconhecido.

Que, então, as sombras
tivessem retido
a noite passada.
Ainda se esperaria
o amor da amada.

Agora, não mais.
A romã não se partiu
e a chuva só caiu
em meados do finado Abril

quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

Traição

Malha a bigorna
o coxo Hefesto,
enquanto remói
o ódio, o ciúme
e todo o resto.

Maldito Ares, vocifera.
Maldita besta-fera
que trouxe o gozo
para Afrodite,
a amante insaciada,
qual fêmea alucinada.

E presto, Homens e Deuses
planejam a vingança
(e nela pôem a última
esperança).
Febre malsã
de todo amanhã.

Que se exponha à censura,
a vergonha do adúlteros.
Que lhes cessem toda mesura,
pois eis que trairam
o sonho que permitiram.

Que gemam cativos
na rede dos mortos-vivos.
Que peçam clemência
pelo estupro da inocência.

E que implorem
por um gesto de nobreza,
da traída certeza.

terça-feira, 27 de dezembro de 2011

Novo Ano do Dragão

Insistem os Profetas
sobre o fim do Mundo
cantado pelos Poetas;

e louvam a racional
conduta reta,
como se a Vida
só tivesse
um face Concreta.

Como se fosse um
teste de Virtude,
ainda que essa
seja apenas um
amestrado de atitude,
conforme o Tempo
e a Latitude.

Esquecem do "Engenho Humano*"
e que mesmo com alguns recuos
a Nave do Homem ainda Navega,

E que, como Argonautas,
seguimos em busca
do Velo dourado
e do esconjuro
do Mal profetizado.

Esquecem da bondade de tantos
e dos nossos Guias, Anjos e Santos.
Esquecem que entre tantos predadores,
ainda brota um Girassol
isento de rancores.

Que ainda nasce uma nova manhã,
por graça de Iansã;
e que há puro amor
no gesto de limpar
o que chamamos de Lar.

              
                        *da Poética de Luiz Vaz de Camões.

segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

Sátiras

Sátiros selvagens
destroem velhas imagens
e entopem as ruas
e as artérias
de espessa serragem
e nebulosa friagem;
e do horror de
gritos pavorosos
que minam qualquer
coragem.
Faunos proclamam
o Império da Luxúria,
da orgia e da incúria.
Tudo vale em camas comuns
de amantes incomuns.
Reinam as feras do Umbral,
os zumbis do Portal
e a sanha do anormal.
Virgens violadas
gemem amedrontadas,
mas anseiam
por novas escapadas.
Derrubam-se Muros e Morais
nesses dias de libertos infernais
e de libertinos angelicais.
Menos é mais
em rúpias
de volúpias
pelas indianas prostitutas
que sonham com a negra Kali,
pois só o Diabo as escuta.
Enquanto tal, um maestro sem batuta
adere à religiosa labuta
na dança que se dança
em lúgubre disputa.
Reina Ares, amansador de Cérbero,
antepassado do infame Nero.
De tudo eu quero,
mas de ninguém espero,
como repete Ravel no Bolero*,
pois a vida é escrita
a fogo e ferro.
Balas perdidas
são mortes indevidas.
Ceifadas estão as Margaridas,
as malditas flores possuídas
por falos e mentes
dementes.
No vidro da mesa,
só uma "carreira de acidentes".
São dos "Dias do Senhor"!
De choro e ranger dos dentes.


                   *da obra de Maurice Ravel "Bolero".

sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

Natalício

O cheiro do assado
permite-me saborear
alguns Natais que vivi.

Ainda ouço, quando atento,
alguns dos antigos sons:
um misto de riso embriagado
e discurso esperançado.

E se mais atento,
ainda sinto o que
o Tempo quase levou,
mas que um bom genio deixou:
perdões dados e recebidos,
beijos trocados
e uma trégua nas lutas cotidianas
e nas costumeiras cizânias.

Lembro-me que ao redor da mesa
eu pouco falava,
pois ali já estava
o que, de fato, imperava:
Um simulacro de fraternidade,
chegado da Eternidade.

quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

Fernanda Atriz

Vê-se que cumpriu
a vida e viajou seu
tempo.
No rosto, ostenta
rugas majestosas.

E fala, com a sabedoria
dos escolhidos, do
companheiro por
sessenta anos, da
nobre dificuldade
de seu ofício e do
viver sem o medo
do que seremos.

Linda mulher de setenta,
oitenta, noventa anos.
Sem a mesquinhez de
uma pele artificialmente
lisa, como fruta de cera.
Linda Arlete que ostenta
sua Fernanda como estandarte
de uma dignidade cada vez
mais rara.

                   Homenagem pouca à Fernanda Montenegro.

terça-feira, 20 de dezembro de 2011

Arco-Iris

Chove uma saudade
que não cessa
e sinto o peso
de tua ausência
em cada gota
que recomeça.
Mas ainda visto
um Arco-Iris de Promessa,

pois o Sol que prevejo
será mais que um
simples lampejo

e haverá de iluminar
tudo que fizermos,
pois amores são eternos.

                     

segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Mestrado na USP

Peço licença aos meus queridos (as) leitores (as) para externar minha imensa satisfação em comunicar que meu filho Thyago, ao concluir sua Graduação pela UNICAMP,  foi aprovado para fazer o Mestrado na USP.

Filho, não custa repetir que você me dá mais que orgulho; você faz a vida valer a pena. Um beijo enorme.


Voragem

A paixão que me cega
e o desejo
que Eros sobrecarrega,
fazem-me desdenhar
de todo juízo e
mergulhar deliciado
nesse turbilhão alucinado.

A voragem que me traga
cobra-me alguma sobrecarga
e tanto gira a vida
que já nem sei
até quanto me dei.

Talvez, no Futuro, eu sofra
e me arrependa,
pois o Amor não é coisa
que se entenda;

mas, não agora.
Ainda que digam que já
não é hora
e que a Paixão é um precipício
do qual só se sabe do inicio,
viverei até o limite
essa querência que
a vida me permite.

domingo, 18 de dezembro de 2011

sábado, 17 de dezembro de 2011

Calendários Astecas

Rugem as bestas-feras
das Novas Eras.
Anunciam as trevas
das gentes, pencas e levas
a caminho do Armagedon,
profetizado por quem tem o dom
de ver o negro Futuro
envolto pelo Sol escuro
e pintado no sudário impuro.

Fim do pós-pangéia
da confusa geléia
fervida por Circe e Silvia Réia.
Inicio do Hades obscuro
e do terror intra-muro.
Começo doutro círculo dantesco,
da catástrofe prevista pela UNESCO
e da 3ª Guerra do tedesco.

Tempo de novos Minotauros,
de Faunos e Centauros
anunciando os novos Dinossauros.
Tempo de Shiva destruidor,
de Kali e do sangue vingador
que haverá de seduzir
a última Parca a urdir
os fios dos viventes sem dentes.

Século do anti-herói,
do murro que dói,
do aço que se corrói
e da ira que nada constrói.

Homem! O que fazes?
Por que só a Morte tu trazes?
Se teu foi o Paraíso
onde esquecestes o Juízo?

Prometeu maldito!
Por que lhes deu o Fogo e o Rito?
Quem, doravante, calará seu grito?
Maldita Afrodite!
Por que os fez procriar
e como a Peste se espalhar?
Vejam deuses:
demos o que de melhor havia
e tudo arruinaram.
A tudo arrasaram.
E festejam como Dionísio,
copulam como Narciso
e esperam Nova Esperança.

Vá Pandora!
É chegada a hora.
Renove suas Esperanças
que não tardarão suas novas matanças.
Em breve acabarão
como o que julgávamos
o ápice da Criação.
Ouçamos seu alarido
e vejamos seu Gênesis invertido...

quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

Vésper

Fresca da brisa
diga à moça da esquina
que tudo se suaviza,
que tudo se alisa,

quando Vésper chega
e nos oferta o beijo urgente
da vida embrulhada
para presente.

E mesmo que
o dia quase ausente
ainda pinte o que se sente,

já se sabe da noite chegada,
da Lua escancarada
e da querência de mais nada.

                        

quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

Poços de Caldas

Bem sei das estátuas
que descem dos pedestais
e caminham entre as Caldas
nas alamedas do teu jardim.
E das outras, que refletem
a cigana noite
em Poços adormecidos;

pudesse, eu queria te ninar,
como disse o *Poeta.
E acariciar as matas
que te ornamentam
como ciros e cílios
de teu nobre olhar.

Banharia meu corpo cansado
no morno rio que tuas entranhas
escondem.
Banharia minha alma exausta
na certeza de ter
voltado ao ninho.

               * da Poética de Vinicius de Morais .

segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

As Matinas

Olha-me a Lua
com seu branco segredo.
O que comentam
as samambaias do corredor,
ao me verem caminhar
em todas as madrugadas
dos últimos 54 anos?
Em que medida eu
participo das coisas?
Até quando sou eu;
e não só uma das personagens
desse antigo porta-retrato
de familia?
Saberão que ainda vivo,
que choro, rio e tenho
vontade; que tenho alguma bondade,
e que tenho, sobretudo, saudade?

Foi aqui que vi uma bola de fogo
vinda do Céu. E brinquei com um
cavalinho branco que, também,
veio do Céu.
Mas o tempo... Tempo... Tempo.

Logo eu ouvirei "As Matinas" na
Igreja próxima. Será a hora
de tomar outra Morfina
e de fazer a última ronda da noite.
Amanhã, farão 55 anos que percorro
esse caminho.

                             Para Thyago, meu motivo.

Cult

Dormem os Gatos vagabundos
sobre os Pensares Profundos.
Já os vadios Cães
sonham aos pés de Guimarães.
Os Grilos da Consciência
ainda tentam despertar
uma outra clarividência,
mas os Ratos sorrateiros
já roem os Saberes Verdadeiros.
Ao Galo, só resta comandar
a muvuca do puleiro.

Que se queimem os livros derradeiros!
Sim! Decrete-se o fim da Cultura,
silva a Serpente, inimiga da Leitura.
Sim! Que se idiotize a distinta platéia,
uiva a feroz Alcatéia.
Que todos se hipnotizem
até a beira da vertigem,
zurra o Burro Pimpão (que
nem por isso assiste ao
"Grande bbb Irmão")
.

Que se deleitem com
a orgia Pantagruélica
e Freudiana, suspira
a Borboleta Machadiana...

E riem à sorrelfa
os lépidos animais
ao saberem o
quanto se paga,
por uma câmera a mais...

- Talvez todo ouro roubado da Gerais.
- Ora, ora, ó pá, de quem tu falais?
- Psiu! não lhes (nos) interrompam os Instintos Bestiais.


E dança, canta e balança
a bicharada que se lança
ao festim dos incultos
e dos pobres estultos.

E assim caminha,
em fila errada,
a Humanidade adestrada,
que a um comando
ri uma gargalhada
e assiste à "TV-Nada".

domingo, 11 de dezembro de 2011

Érika

Se a bala foi perdida,
ou se foi indevida,
o que importa agora?

A boca do forno
crema primeiro
a pouca fantasia
que viveu
e a morte
que antes lhe ocorreu.
Dupla morte
para o sonho
de consorte.

Depois, o ramo de jasmim
desce à barca de Caronte,
ao rés do horizonte.

Acima ficamos nós.
Acima, ficamos sós.
Que AEDO eternizará
uma Érika que já não há?

               Para a Sra. Gertrudes e Sr. Christopheer.

sábado, 10 de dezembro de 2011

A Lágrima e a Chuva

Contraponto da chuva,
uma lágrima cai.
Entre ambas,
uma vidraça
separa as dores de ir
e a de ficar.

Tristeza comum que
repete lugares-comuns:
e se fala da distância
que o Tempo aumenta
e da saudade de quem
se ausenta.

E era pouco
o que se queria:
só um amor de calmaria,
mas o adeus inesperado
não se fez de rogado
e entre a chuva e a lágrima
levou cada qual para um lado.

               Para E.

sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

Desterros

Belo como o de Narciso,
revejo teu sorriso
e me calo conciso,
pois bem sei
o quanto te preciso.

Amparados num
muro sem arrimo,
como tolos
nos ferimos;
e sem bem saber
o que fazer
com a felicidade
que nos foi dada,
deixamos que a sordidez
nos tornasse três.

Já fomos queixume
de um mesmo ciúme,
e juntos nos servimos
da vida em bandeja;
mas, ingênuos, e sem
que se visse,
interromperam o banquete
e varreram nosso amor
para baixo do tapete.

Agora, há que se aguardar
a nova Aurora chegar.
E que os nossos erros,
sejam corrigidos por esses
duros desterros.

quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

Semestre

Seguro por tua mão
faço fácil
a travessia,
para o Futuro
que seria.

E nem faz
tanto tempo assim;
só um Semestre,
desenhado pelo deus-criança,
habituado às inconsequências
das puras inocências.

E pensar que antes
a vida era só escambo...
Uma garfada de maxixe,
um passo de mambo
e um destino mulambo...

E sempre a esperar
a boa sorte que viria,
a roupa da lavanderia,
a herança d'alguma tia,
o ouro da ouriversaria
e uma ou outra fantasia...

Agora não mais.
O que nos aguarda,
doce amada, não sei;
Mas sei-te Oceano
em que desaguo
o rio que me tornei.

quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

Camadas

Desconheço
quem me olha
do espelho.
O que a vida fez
com aquele Homem?
Será que ele conservou
algumas das esperanças
que juntos tivemos?
Das quimeras que vivemos?

A espuma do sabão
espalha-se pela barba,
mas por mais
que eu a raspe,
não consigo
remover as camadas
que o Mundo acrescentou.

Abaixo delas
conservou-se o
que sonhei?
Aquilo que pensei?
Quem eu amei?

O que foi que sobrei?

terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Chover

Cai uma chuva
tão suave,
que se pensa
que Deus nos acaricia.

Tudo existe
para findar o
que é triste.

O cheiro de terra molhada
preenche todo vazio
e é de toda sede
o pleno sacio.

O tempo passeia
no relógio
e a tarde se estende
até onde se compreende.
A vida, aos poucos,
se entende.

       

segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

O Homem e um Cão

Um Homem chuta o cão. Sem motivo.
Vive tal Homem por qual motivo?
Quem lhe encharcou de maldade?
Quem lhe injetou crueldade?
Aquilo que nunca teve,
mas lhe deixou saudade?

Ressinto a dor do Cão chutado.
Pressinto outro golpe no costado,
mas o Homem se vai;
e de sua ausência
nenhuma humanidade cai.

O Homem se vai,
um resto de decência se esvai.
Findou-se qualquer colorido
quando o Cão chorou seu ganido.

Também me vou,
incerto do que sou.
Nada fiz contra a covardia.
Apenas, segui meu dia.

domingo, 4 de dezembro de 2011

Medievallis Humanitas

Jarra de jade,
em que armário
ficou tua outra
metade?

Porcelana de Cantão
(de antes da China em massa)
conte-nos o que passa
e o que queres
que o Mundo lhe faça.

Aristocrático Serviço de Chá
da "England" matriz,
relate o que se ouve
da Colônia que houve.

Nobres baixelas e
cristais de Bruxelas,
para onde segue
vosso barco
sem velas?

Digam, empertigados
mordomos,
o que será feito
de vossos donos?
O que lhes circunda
a mesa rotunda,
dos nobres salôes
alegrados pelos bufôes?

Que fim levaram
Reis e Rainhas,
Duques e Duquezas,
o Clero e a baixa nobreza?
Foram decapitados em Paris?
A Revolução os venceu?
Justo quando se pensavam
em pleno apogeu?
Ou só estão
nos Castelos de Verão?

E os Bardos, os Menestréis?
Ainda empanturrados
de proezas e pastéis?
E as cortesãs
ainda vos alegram
com o lúbrico
Cancan e o
fingido afâ?

Digam, louças serviçais,
vosso Deus
ainda exige Prata
nos castiçais?

E os Homens da África
ainda são levados
como gados?
E os do Novo-Mundo
ainda são exterminados,
digo, catequisados?

A vossa Inquisição
ainda persegue
o que julga pagão?
E prende, tortura e mata
quem não lhes comunga
a fé vagabunda?

Oh! Tempos de antanho,
é tão estranho
ver-te reproduzido
nesse agora sem sentido.
Ver tuas mazelas,
tuas falsas donzelas,
cometerem de novo
o Pecado
que se pensava acabado.

Ver que a sucessão dos dias
só mostra noites vazias.
Que tua alma, pouco ou nada
evoluiu;
e que ainda carregas
os germes da
Servidão e da Submissão.
Que ainda se rende
ao "Nho-Nho estrangeiro"
que lhe prende.
Que praticas o sofrimento
e não se arrepende,
pois só o que queres
é o tosco prazer hedonista,
estampado numa capa de revista.

                            Para Natália Mantovani

Re-Chegada

Eis que um
verso é chegado.
Talvez cante
um amor, uma saudade,
uma dor, uma vontade.

Talvez cante
uma florada,
uma volta, uma chegada;
ou o riso da Amada
e sua pura nudez
em plena madrugada.

Talvez cante a calma
do orgasmo saboreado
e a do Nirvana conquistado.

Talvez cante a esperança
da utopia que não se alcança
e a da liberdade
sem fiança.

Quiçá cante
o regresso de um sonho
e a vida devolvida,
ou a poesia
que em qualquer jardim
era colhida.

sábado, 3 de dezembro de 2011

Ernesto Che

Ver-te morto
como um trapo,
não diminui tua aura
de heróico guapo.

Feriram-te o atraso
e o pensar raso
de trevas seculares
e mentes tumulares.

Feriram-te covardes
em longe arrebalde;
e, no entanto, debalde,

Pois em ti
a Revolução vive,
e junto, a liberdade
de ser livre.

                Homenagem pouca a Ernesto "Che" Guevara.

sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

Escola Primeira

Moveis cobertos
por lençóis empoeirados
contam do esquecimento
a que foram lançados.
Dias tantos,
tantas noites,
passaram por entre
as carteiras vazias
e a voz da última professora
ainda ressoa
como eco de abandono.
Foi ali que vivi
parte do que sou.

Dali eu via a Mantiqueira
que, com o tempo,
virou só lembrança.
Escola primeira
da primeira professora:
Marilia, sem poema
e sem Dirceu,
na Escola Primeira
que um dia abrigou
quem seria eu.
Abrigou, o Mundo
que seria meu.

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

Poesia e Rima - Ensaio

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Já se disse que “ninguém é poeta por saber rimar”. É certo. Pois, ainda que seja louvável a arte de buscar com denodo palavras de sons iguais e, além, composições métricas que fazem de simples frases sentenças melódicas, não está aí o quê pode definir a Poesia.
Em perfeito pari-passu com a História do Homem, a poesia adquiriu com o correr do tempo as mais variadas formas, passando de versos alexandrinos a parnasianos, a românticos, a simbolistas, a concretos etc. até que em meados da década de 1920, chegou-se ao predomínio dos Versos Livres.  No Brasil, esse momento se deu mais especificamente durante a Semana de Arte Moderna em 1922, com a ascensão de Carlos Drumonnd de Andrade, entre outros.
Versos livres, por serem literalmente libertos das amarras acadêmicas de Rimas, de Metros e de Esquemas e Fórmulas. A poesia pôde, enfim, voar em seu elemento: o sentir!
Não que antes não bebesse dessa fonte, pois os Sentimentos sempre foram o alimento da Poesia. Porém, a exemplo do amor que cantava, o Poema vestia tais e tantas armaduras que a beleza de sua alma ficava restrita aos poucos possibilitados de entendê-la. Aos demais restavam os arremedos indigentes da arte, fato que ensejou o surgimento dos folhetins, das trovas pornográficas, das novelas popularescas e outras expressões que florescem em meios brutos e incultos.
A poesia, como arte, ficou restrita aos Saraus da pernóstica burguesia e, depois, aos bancos escolares com a imposição de antigas poesias, com suas formulas e temas vestutos. E esse panorama sombrio só mudou - primeiro na década de 1920 - e, depois, em meados de 1968 com a explosão cultural que seguiu às rebeliões contra o antigo Sistema. A poesia, como gênero literário, foi redescoberta a partir do surgimento de uma nova e talentosa geração de poetas. Se nos anos de 1940 a 1950, algo parecido já acontecera, agora o movimento abrangia a quase todos os seguimentos sociais. Letras de Rock, de Baladas, de Sambas, de “Músicas de Protestos” etc. cantaram amores e Causas com tal beleza que taxá-las de Poesia foi uma decorrência natural. E aqui no Brasil se fez mais. Junto com o talento de Chico Buarque de Holanda, Caetano Veloso, Milton Nascimento, Simone e tantos (as) outros (as); poetas já renomados como Vinicius de Moraes, trocaram a caneta pelo violão para declamarem seus versos. Outros, sem o talento musical do Poetinha, foram integrados à explosão cultural e o Mundo viu o esplendor de Drumonnd, João Cabral de Melo Neto, Manuel Bandeira, Cecília Meirelles, Thyago de Mello etc. serem mostrados em Teatros, em Cinemas, em Shows, Sambódromos etc. Em paralelo, assistia-se ao nascimento de Menestréis do porte de Cazuza, Wally Salomão etc. Fez-se Poesia!
E é nessa trilha que aprendizes como este escrevinhador se lançam. Homens velhos e novos poetas buscam ofertar o que lhes passa, o que lhes marca e o que lhes fica. Cantamos amores findos, amores vindos. Falamos do que vimos, do que ouvimos. Contamos das lutas que lutamos; das utopias que buscamos, dos sonhos que abandonamos e, principalmente, declamamos o que somos: poetas. Porque sentimos, mesmo sem saber rimar.

Rio, 16 de Novembro de 2011


Quietudes

Silenciosa
é a ausência.
Inodora, insonssa,
por nada
conter nas entranhas.

Em vão espera-se
o telefone.
Que fosse apenas
"por engano",
pois "atenção dada"
quebraria o Vodu
da palavra negada.

Trilha sonora
de tempos indecisos,
a quietude reclama
do vazio na cama.

Espremido, um verso
cai.
À forceps, alguma poesia
sai.
Nascimentos indevidos
de ausentes
pais desconhecidos.

      

terça-feira, 29 de novembro de 2011

Despir

Despida pela
brisa do Mar,
caminha tua nudez
em lúcida insensatez.

O cheiro da noite molhada
ladeia a passarela
em que desfilas
a pós-tarde amarela;

e, depois, só vestida
de chuva ligeira
recolhe-se ao abrigo
do novo amor antigo.

Então, reclinas a alma
e abandonas-te
ao carinho que te aguarda,
na cama enluarada.

                       

segunda-feira, 28 de novembro de 2011

Call Center

Como fazia,
Alice
não nos disse;
e adentrar o espelho
é o grande mistério
que levou para
o cemitério.

Pena que assim foi,
pois vivemos a
Era da Superficie,
a de conceitos ordinários
e de tosca mesmice.

Teleguiados pelo
mitico "Sistema"
(Sr. o "Sistema" não permite...)
reduzimo-nos a meros
componentes
de "Sistemas" pleno-abrangentes.

Cativos despercebidos
rolamos a rocha
pressentindo ser inútil
Platão e a tocha,
nessa caverna
eterna.

Gado de gente
perdemos o diferente.
Uniformizamos
o que resta viver,
sem achar quem
possa responder:
de que lado da vida,
fica a realidade escondida?

                        Para Carla, "porque vejo gênios entre as acácias".

domingo, 27 de novembro de 2011

Pacífico

Cavalguei o Pacífico,
enfrentei o tirano
terrífico
e amei as virgens
montanhas
ao deflorar suas
entranhas;
mas nada vi ali
que não houvesse aqui.
Exceto, talvez, a cor
de que se abusa
ao se amar
uma nova Musa.
Com Bete caminhei
a Revolução
que pouca houve
(e da qual já nem
se ouve).
Ousamos sonhar
entre sonos aferrados
das burguesas panças
saciadas de
churrasco e cerveja
(e de igual, seja).
Com outras,
ousei pensar
entre cérebros atrofiados
e nunca desconfiados
de serem títeres manipulados
por capachos violentos
de deuses sangrentos.
Se filosofia existiu,
entre dois nas camas,
foram só breves chamas.
Porém de uma dessas alcovas,
eis que sugiu alguém que eu
gostaria de ter sido.
Eis, vivo de repente,
o gênio afetuoso
que chamo de filho.
Gajo de garbo,
desfila pela vida
a elegância de seu
pensar sutil,
e por ora ostenta
o fecho de ouro
que lhe guarda
como tesouro.
Assim, as vidas passadas
em camas desarrumadas,
levaram-me meio-século
da vida que herdei,
de quem não sei.

Agora, vejo que o Pacífico
que um dia montei,
foi apenas um cavalinho
de carrossel
circulando num só eixo.
Que as montanhas
que deflorei, eram apenas
a irmãs-putas que me
saciaram algum desejo
e, certo dia, roubaram-me
um beijo.
Que Bete e a Revolução
forma quimeras
desterradas de outras
Primaveras.
E que eu uso a caneta,
como um bêbado a sarjeta.
Nelas dormimos,
tentando não acordar.

             Para Bete, saudades.

Macio

Quero sempre a delícia
de saber-te em minha vida.
De saber-te riso colorido
em cada minuto acontecido,
em cada carinho havido
e em todo dia amanhecido.

A delícia de sentir-te
em meu abraço:
saber-te a distância
de um passo,
na certeza de sermos
um só espaço.

A delícia de sentir-te
em meu beijo.
De sentir-me em
teu orgasmo
e de poder pressentir
que ainda há tanto
por vir.

Saber-te,
moça do Rio,
Razão e desvario
desse tempo
tão macio.

                    

sábado, 26 de novembro de 2011

Jardins

Como gerânio
recém regado,
aspiro
a úmida esperança
no chão renovado.

Vislumbro outros jardins
a serem caminhados
e novos Girassóis
a serem semeados.

Que lá, as velhas inocências
sejam descartadas
e que diferentes messes
sejam buscadas.

Que bem-vindos canteiros
abriguem nossas rosas
e que um seguro Recanto
seque nosso pranto
e aninhe teu encanto.

                           

sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Protocolos

Frios votos protocolares
não saciam a fome
que de ti eu tenho.

Eu deveria, bem sei,
sufocar o amor que
por ti eu sinto,
mas não consigo
trair essa verdade.
Nem saberia
mentir-te.
Mentir-me.

Não te desejo amiga,
pois o que te sinto
espalha-se pelos
"Quatro-Cantos"
e reverbera
em outros tantos.

Quero-te mulher.
Quero-te Lua.
Quero-te mesa crua.
Quero-te cama nua.

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

Semi

Fez-se a descoberta
pela janela semi aberta:
o amor já não é
uma rota certa.

Semi silêncio
de indecisas situações
permeiam
essa quadra e meia;
e a angústia
de um fim anunciado,
ainda que não proclamado,
antecipa o funesto ensejo
do vazio
que não desejo.

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Past Time

Tempo em que
saudade havia,
na noite
que não amanhecia.

Tempo em que
tudo se dividia,
pois a cumplicidade
nos percorria.
E de coração se cria
que de nada se
lamentaria.

Tempo hospedeiro
do querer derradeiro
e do único sentido,
amor verdadeiro.

Tempo de crença
na paz que chegaria,
como se fosse
a próxima poesia.

Tempo...tempo...
Porque o Tempo
substitui a dor pela saudade.

Ceia

Não consigo engolir
esse bolo de angústia
que me sufoca.
O cinza que chove
aumenta a apnéia
e sinto que cresce
a inapetência
pela vida.
A gorda mulher diz
estar sem calcinha
para não marcar o
vestido. Que importância
teria sua roliça sugestão
nessa orgia sem sentido?
Banquete mal servido
por anfitriões carrancudos.
Pratos disformes
acompanham vinhos ordinários.
E desde a Entrada
até a Sobremesa,
impera uma rudeza
que nunca se pensou.
Acepipes da semana
que passou ja se deterioram,
sugerindo os venenos
que tomam os comensais,
ainda iludidos
que à mesa,
afetos serão servidos
(e os ódios esquecidos).

A sopa cinzenta,
de horrores cozida,
jaz à minha frente
como lembrança funesta
de tudo que não presta.
Ceia fatídica
de tristeza impudíca
que avança
em minha solidão.
Apenas eu insisto
em salvar a aparência,
sem pensar o porquê
dessa inconveniência.

"La nave que vá..."

terça-feira, 22 de novembro de 2011

Elementais

Matas encantadas
por gnomos e fadas
contem-me uma história
cujo fim seja a glória.

Preciso ser iludido;
qualquer fantasia
será o bastante
para que eu esqueça
o restante.

Preciso ser seduzido
para de novo acreditar
que o Mundo que se diz
não está por um triz.

Reunam-se bruxas e feitiços
e operem algum prodigio
que me convença
de que a vida compensa.

Então, sem que se veja,
despirei toda incerteza
e verei com clareza
a realidade que me escapava
por ultrapassar a tosca racionalidade
que eu endeusava.

Verei, assim, a outra vida.
A que nem sempre é percebida,
mas que preenche o cotidiano
com a dose necessária
do Supra Humano.

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Movimento

A tudo
a vida alude,
buscando, talvez,
alguma virtude
no afeto
que se nega amiúde.

Mas ainda
que vigore
o elogio
do fastio,
alguma relutância,
em alguma instância,
resiste
à medíocre circunstância
e brada
a ternura dada.

Sim! O amor
refaz-se do nada.
E em cada
madrugada
alguma rosa
será ofertada,
uma música
cantada
e uma carícia
trocada.

Uma jura
sem usura
vencerá
a incerteza
e
a paúra;
e
o amor,
em pleno conjugar
haverá de ficar,
pois todo Sentimento
transcende o movimento.

                

Motivo

Talvez Bete soubesse
que viver
não seria em vão,
ainda que a rua
fosse contra-mão.

Tanto girou
a Roda,
a faca e
a Poda...

E eis-me sobrevivente
sem saber
porque diferente.

Destinos desiguais,
sinas surreais
em Tempos imorais.
Caminhos num Brasil,
que pouco se viu.

Talvez Bete soubesse
o quanto é belo
morrer por um motivo.
Enxergar outra luz
num Círio votivo.

                    Para Beth, porque o Tempo substitui a dor pela saudade.

domingo, 20 de novembro de 2011

Ventos

Vento
que invento,
para alisar
tua face
no duro momento.

Vento
que invento
para te cessar
todo lamento.

Vento
que invento
para te beijar
novo alento.

Vento
que invento
para te assoprar
meu pensamento:
é teu, meu sentimento.

                   

sábado, 19 de novembro de 2011

Poesia Concreta

Cantam os Campos
a Concreta Poesia
do rude asfalto
de só sobressalto;

e se a poeira
apaga as estrelas,
como disse Caetano*,
o verso desenhado
acende o Céu insano;

e se a dura poesia
esquadrinha a realidade,
há que ser ler
uma lirica quadrinha
em cada entrelinha;

e se por ambos e mais um**,
o Parnasiano recolheu-se
à arca do Passado,
há que se saber
que nesse Concreta Via,
ainda se ouve
a Quinta Sinfonia.

* da poética de Caetano Veloso.
** Os irmãos Augusto e Haroldo Campos e Décio Pignatari, criadores do Movimento Concretista. A eles, essa pouca homenagem.

sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Amores Acabados

Amores acabados
são barcos separados
que navegam
em rios isolados.

Talvez levem
a incerta esperança
de que noutro cais
a corrente volte atrás.

Talvez nada levem,
sentindo o alivio
de carga nenhuma,
mesmo que a dor seja alguma.

Talvez, em outro
tabuleiro de xadrez
cada qual refaça
o rumo outra vez.

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Lâmina

Dias inúteis
arrastam-se no
Tempo vão.
As barras
que me conteriam
perderam as trancas,
mas a prisão permanece
como se dela
eu relutasse sair
por temer a liberdade
da lâmina que me tenta.
Mas a cada resfolegar
do comensal à frente,
como loas a Pantagruel,
eu sei que uma das mortes
seria o renascer
de quem sobreviver.

"Inautênticos",
chamou-os Sartre.
"Homens sem Arte",
outro sábio diria.
Personagens do eterno
"Dejà Vú" que Truffault
embutiria nos dias inúteis
que se arrastam no
Tempo vão.

quarta-feira, 16 de novembro de 2011

Niilista

A falsidade
da risada me irrita;
pressinto o capacho
que riu.
Sinto pena do
soldado morto,
mas dizem
que ser herói
era apenas
o seu trabalho.
Ofende-me a gorda
flacidez da
mulher que repete
sua sobremesa
burguesa.
Porque pressinto
um Sol além da Porta,
sei da inutilidade
da noite que passou.
Dizem que ali
existe um tesouro
enterrado.
Seria bom ter o
suficiente
para comprar um
bocado de solidão.
Aqui, nessa toca,
estou livre do Armagedon.
Testemunharei os últimos
dias e as mortes
das jovens consortes.
Talvez, então, eu
descubra algum sentido
para o fato
de ter sido parido.

Orvalho

É suave o
orvalho que
substitui a
chuva recem finda.
Estão livres
as passarelas
onde desfilam
as esperanças
das novas estrelas.

Talvez o gênio
do Bem
povoe esse tempo
e afaste as mágoas
que não se quis
e que tudo
colocam por um triz.

Uma rosa
exala essa noite fresca.
e as sombras
que ainda se avistam
já não ameaçam
a Paz do Mundo.
São apenas sombras
que alguma luz futura
apagará desse cenário.

Como se todo mau
contexto,
findasse por graça
de um novo
texto.

Noite de Promessa
renovada,
em cada Estrela
avistada
e em toda busca
retomada.

terça-feira, 15 de novembro de 2011

Escorrida

Vida escorrida,
do relógio caída
sem outra parede
em que se segurar.

Pinga uma
chuva insistente.
Fina como os fios
em que me seguro.
Incerta como o Futuro.

O cinza de ontem
repete-se no Céu
que pouco se ilumina.
Alguém haverá
de blasfemar
e outrém se resignará
cônscio da marionete
que a vida lhe fez
nesse teatro
de fantoches
em que a liberdade
é só um deboche.

Mas escorrido do relógio
eis que nasce
o novo dia.
Alguma calma
vem a reboque
e, talvez, no
último carro
chegue alguma
Esperança.
Oxalá a brisa do Mar
faça uma moça suspirar;
à outra faça sonhar.
E aos demais, delirar.

segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Ameixeira

Ameixeira de antes
no semi silêncio igual.
Pretendo o mesmo
sabiá
aninhando-se nessas
árvores
que já foram minhas,
ainda que outro muro
delas me separasse.
Ruídos de folhas caídas
repetem os sons
que embalavam
o que eu sonhava.
Repetem a cantiga
que Nana cantava
enquanto o aconchego
de seus braços
afastava o que
eu temia (e tanto eu
preciso desse canto
que nunca mais ouvi)
.
Mandala da vida
em eterno ir e vir.
Sons, cores, cantigas
de tantos anos
no momento agora.
No verde, ali fora.

domingo, 13 de novembro de 2011

Árvore

A mangueira
que se esquecera,
derrama-se pelo muro.
Andanças de meio século
para o reencontro
do verde
e de um cinza inesperado
no Rio que sempre se pensa
azul.
Coisas de antes
regressam com a manga
despreendida no chão.
Despreendida do Passado.
O que aconteceu
com os círculos andados?
Que fim tiveram
as ruas percorridas?
Em quais paradas
desse trem
ficaram os rostos,
os corpos e as vozes
que viajaram comigo?
Até onde irá
esse trecho do caminho
que caminho?

sexta-feira, 11 de novembro de 2011

Deus, o Homem e o vinho


Deus, o Homem e a Uva.

É um engano imaginar que a maior dificuldade que Deus experimentou foi criar o Homem. Um simples amontoado de elementos químicos. O “barro primordial” para os crédulos, ou a “sopa de moléculas” para os céticos. Um punhado aqui, outro ali, uma remexida, um acerto, um retoque e o seu indispensável Sopro. E pronto! Eis a criatura!
O que foi complicado mesmo foi definir como seria o invólucro que envolveria cada uma das criaturas. Sim, porque tão logo as terminou, Ele viu que errara na proporção entre o poder dos mesmos e o tamanho das dificuldades que eles enfrentariam. Era preciso que fossem protegidos. Que cada um deles fosse recoberto e tivesse ao seu redor um “Mundo” em escala mínima. Que ele, então, “vivesse no seu Mundo”. O “outro Mundo”, o inteiro, era muito grande e muito complicado. Era excessivo para a fragilidade humana.
E como Ele é pensamento e ação, assim pensou e assim fez. Porém (já existia o porém, então), o resultado não ficou de seu agrado. Acontece que ao fazer os Homens, não se sabe por que, a receita com as medidas dos elementos primordiais foi perdida, mas Ele continuou mesmo assim e no fim viu espantado que ao contrário do que pretendia, nenhum dos Homens ficou à Sua imagem e semelhança, pois havia aquele que era alto, o que era baixo, o que era magro e o que era gordo. Uma completa miscelânea.
Quanto à questão da Imagem e Semelhança Ele logo encontrou a solução, pois Ele também era multifacetado e a variedade dos formatos e de Suas criaturas simbolizaria a sua variedade de faces. Além, disso, pensou, cada um deles me verá de um jeito e naturalmente associarão a sua imagem comigo, portanto, não devo preocupar-me com isto.
O diabo (Ele teria pensado se não fosse quem Ele é) são os malditos invólucros. Para alguns ficará muito largo, para outro muito apertado, ou curto, ou comprido. Maldita pressa! Por que Eu não pude refrear a minha ansiedade? Tinha que terminar tudo em seis dias?
O incipiente Universo ressoou com aquela fúria. Estava colocado: o problema do tamanho. A angústia dos Homens com o tamanho. Todos querem um nariz de tamanho pequeno, mas . . .
Por fim, aquele que tudo perdoa, perdoou a Si mesmo e achou por bem deixar de histeria e encontrar uma solução. E não é que a Solução foi mesmo Divinal? Ele inventou o material elástico. Assim, estava resolvido o problema do ajuste, pois cada qual teria o seu invólucro protetor conforme a respectiva estatura. Muito bem, Pensou, mãos às obras e num misero instante dotou a todos os Homens de seu “mundo particular”.
E dessa vez satisfez-se com o resultado. Achou muito bonitinho. Aquele amontoado de cápsulas escurinhas e juntinhas. Tão grudadinhas. Uma gracinha . . . aquilo lhe pareceu alguma coisa, mas foi inútil tentar lembrar o que seria. E para não perder tempo com alguma coisa do passado (que para Ele não existe, pois é Eterno) transformou o que seria uma lembrança em uma inspiração e criou assim o:

Distinta platéia, com vocês, from to Big Bang, o sensacional e inédito: Cacho de Uvas!

Em várias partes as Sagradas Escrituras fazem referência às uvas, mas ao contrário do que as traduções (ah, esses copistas) nos fizeram acreditar, elas não foram tão citadas por suas simbologias de fartura, doçura ou outros signos menores. Não senhor. A leitura correta é aquela que nos indica que são tão reverenciadas por sua simbologia maior: a Humanidade é um Cacho de Uvas, todas juntas, mas cada qual contido em seu compartimento. Ali vivem e com os demais competem pela luz.
É preciso ter mais luz que os outros concorrentes, pois é através dela que se aumenta de sabor e é preciso ter mais sabor para que se atinja a finalidade que se espera das uvas e dos Homens: agradar.
A carência essencial. Querer ser amado. A consciência de não ser nada além daquilo que os outros avistam. A tragédia dos Homens: apenas existir graças à retina do outro.
Todavia, Ele não se importou com esses questionamentos e tampouco se preocupou em aprimorar os casulos que, dessa forma, ficaram opacos e aderentes. Uma situação estranha: embora sem vislumbre do mundo inteiro, as criaturas pressentiam as suas iguais e a elas se iam unindo. Um magnetismo invencível. Por contatos de casulos procriaram e cada nova criatura herdava o seu próprio invólucro e a mediocridade do mundo ancestral.
Assim foi. E como já era o Sexto Dia daquele trabalho imenso (ou insano?), Ele sentiu-se esgotado, cansado, estafado e (conforme os dias atuais, que segundo Einstein já acontecia) estressado.

Não!
Eu não quero livros de auto-ajuda!
Não! Eu não quero ansiolíticos ou antidepressivos!
Eu quero a paz! A paz da paz, como diria Drumonnd.

Na próxima segunda-feira eu retomarei o trabalho de criar o Mundo. Se . . . Eu. . . quiser! Está claro?
Mas como para Ele não existe a próxima segunda-feira, pois Ele é atemporal, não voltou para concluir a Sua obra. Ele nunca mais voltou.

Ficaram os Homens e as Uvas.

As uvas logo criaram uma maneira de exercitar a sua libertação e se transformaram em vinho. Os Homens seguiram os seus passos e comemoraram a liberdade em relação ao Pai e sugaram o vinho da Mãe. Esbórnia terrível! Devassidão inenarrável! Um horror! Porém, Freud explica.
O vinho da “Mãe Uva”, sua forma original, despertou-os para o fato de que haveria um mundo além do que lhes fora dado. Uma minoria insignificante descobriu (Ave Platão!) que além do vinho, lustrando o seu compartimento, poder-se-ia vislumbrar o que se chamou de “Mundo Maior”. E esta minoria avocou a pretensão de ser a vanguarda da Humanidade. E desde então um escreveu sobre o outro que lhe era igual. Surgiram as “cavernas”, as “gaivotas incansáveis” que voavam sempre para mais longe; as lagartas que se transformaram em borboletas e todos os textos que glorificam a busca, o arrojo e o descortino.
Tal qual as uvas, a Humanidade também se dividiu: a minoria que lustra os casulos e consegue enxergar além assumiu a identidade dos vinhos nobres, reservados ao Supra Sumo da vida. A esmagadora maioria contentou-se com o papel de vinagre que tempera a rotina dos dias iguais.
Tratados de enealogia proliferaram. Biografias ilustres também. Retrata-se o “Mundo Maior” e com alguma insistência a vanguarda iluminada tenta relatar o que enxerga para a patuléia que nada vê.
Os primeiros insistem pois sabem que essa tentativa lhes poupará o desgosto de ter que trabalhar. Os segundos resistem porque intuem que é um desperdício escutar alguém que, nessa crise toda, venha lhes falar de Humanidade, vinhos e uvas. Ora, vá trabalhar! Eu quero lá saber se há outro mundo? Eu quero é Grana. Eu quero é Poder. Eu quero é Segurança. Eu quero ser doce . . .  eu quero que me queiram.
E finalizando essas mal traçadas linhas devo dizer-lhe, caro Rousseau, que nos explicou que entre a Liberdade ou a Segurança optamos pela segunda, que você também não pôde sorver o Champanhe, pois nas seguranças dos casulos não há espaço para a garrafa e sequer para a fantasia que dela se desprende.
A segurança do casulo, do cacho, da videira. O que haverá em cada um desses casulos? Será que a Alma que ali está aprisionada voa?

quinta-feira, 10 de novembro de 2011

Desfecho

Sinto o fogo do desejo
percorrer a insônia
que carrego, mas só
abraço o vazio que se
deita comigo.

O vento morno que adentra
esse quarto estranho
não refresca a febre
dessa saudade.
Sou apenas vontade.

Logo a "Máquina do Mundo"
despertará os Cérberos
que a todos mutilam.
E as burocráticas Hydras
e os venenos que destilam.

Ainda cumpro
um pouco de exílio
e pago uma andança
por outro trecho,
mas já te sei
doce desfecho.

             

quarta-feira, 9 de novembro de 2011

CORES

Quero-te em
cada insônia,
e em devasso
desejo,
como rito
da antiga Babilônia.

Quero-te fogo
que me percorre,
saudade que numa
lágrima escorre
e o verso
que me socorre.

Quero-te
chegada sem partida
e branca folha,
de amor preenchida.
Quero-te Papillon
Quero-te vida.

             

terça-feira, 8 de novembro de 2011

Fronteiras

Tu caminhas
em meu Tempo
e trazes o
próximo momento.

Preenches meu
Espaço e alargas as
fronteiras
em que habito.

Sei-te vento,
sei-te alento.

Sei-te presença
de que necessito,
pois está em ti
a certeza de que
existo.
                      

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Tristes Belezas

O quê se pensou
derradeiro,
afunda
nesse espinheiro
de saudades doídas
e lágrimas caídas;

são as tristes belezas
que agora só refletem
as dores mal disfarçadas
e multifacetadas.

Tristes belezas,
caladas pelas armas
de infelizes Karmas.

Entretanto, tua chegada
repõe a Estrela quebrada;
e de novo iluminada
a Noite mostra
que até a angústia
é bela,
se nela
houver teu carinho
desenhando
o novo caminho.

                 

domingo, 6 de novembro de 2011

A Vanissima Senhora *

Alguém haverá
de gostar
do longo Poema
do Negro poeta.

Prolixo e superficial,
outros dirão (mais
o poeta que sua obra)
enquanto mastigam
a última sobra.

Eu nada direi;
e por pura
covardia
nenhum juízo farei.

Eu só quero
a lanhosa paz
de quando se diz "Sim".
Meu tempo correu
e meu "Não" está
semi extinto.

Abstenho-me
do Absinto,
do Absoluto
e do "Ab (SUS) penso".

Sou apenas
a sombra que vaga,
assustando os incautos
e quem ainda divaga.

Minha antiga insolência
já nada deflagra
e só me resta aguardar:
alguém num Domingo;
Elza, que logo virá fingir
que me banha;
Madalena, depois, que
finge alimentar-me e,
por fim, Helena. Não a
de Troia, "off course".

A todas e a todos
eu espero.
E, também, a quem mais
eu quero: a "Vaníssima Senhora"
que canta o Negro poeta.

Já tenho tantos anos,
que o meu ofício é  só esperar.
Meu tempo é aguardar.

* da poética de Fausto Antonio - Ed. Quilombhoje - Coleção "Cadernos Negros - volume 28"

sábado, 5 de novembro de 2011

Anti-Versos

Versos mancos
declamam
vazios brancos.

Algebra inexata
do tempo
sem data.

Versos tortos
escrevem
poemas mortos.

Gramática maculada
e poesia violada.
Tudo, fez-se nada.

sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Quem me dera

Quem dera,
o momento
fosse mais
que uma
quimera.
Quem dera
eu pudesse
ofertar-te
meu desejo,
liberto em
cada beijo.
Quem dera
eu sentisse
o calor
de tua vontade
e soubesse
da querência
que nos une,
como amantes
que Tânatos
não pune.
Quem dera
a saudade
nunca fosse
pequena
e cada
reencontro
fosse uma
fúria serena.
Quem dera
não findasse
o Canto,
não se quebrasse
o encanto
e a Poesia
replicasse
o acalanto;
quem dera...

              

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

Rosa dos ventos

Que a Rosa dos ventos
aponte meu norte
e que lá eu aporte
livre das incertezas
que me sobraram
das camas e mesas.

Que lá os amores
sejam constantes
ainda que distantes;
e que eu ache
a paz que procuro
e a saída
desse triste
labirinto escuro.

Que haja suavidade
que haja verdade
e que se junte
cada metade.

     

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Voar

Voo caminhos
em busca de novo ninho.
Pedágios e adágios
em vias e sinfonias
Na rota retorta
que a vida
comporta.

Voo caminhos em
busca da minima amada.
Talvez numa esquina alada
Eu lhe sonhe madrugada.


   

terça-feira, 1 de novembro de 2011

Reality Show

Simão Bacamarte,
alienista de Assis
(e alienado por um triz)
junta Loucura e Arte
e eis Napoleão, montado a giz,
cortejando Josefina sem nariz.

E Homens da Lua
e Mulheres de Marte
esparramam doidice por toda parte,
pois o pouco juízo não se reparte.

É dom de Deus,
exceto para os Ateus
que arderão na Eternidade
a descrença na Cristandade.

E segue Assis,
nossa flor do Lácio, ou de Liz;
que tudo conta e tudo condiz,
pois vê abaixo do verniz.

Pena de maior talento
desse Pindorama sonolento
que assiste "O Grande Irmão" iletrado
ficar no lugar de Mestre Machado.

E continua Assis Machado,
bem antes do austríaco,
a expor o Inconsciente; que de rico,
virou palco de jerico.

Coisa de Alienista Alienado
que ruge alucinado
ao comando que lhe é dado:
- como assim?
Pergunta a mulher
à massa qualquer.

É o fim...

domingo, 30 de outubro de 2011

Das Minas

Vivemos as Acácias
de todos os jardins,
ouvimos as Liras
de todos os Serafins
e bailamos com
todos os Arlequins.

Ai de mim, ai de mim...

Geme Marilia
sem Dirceu,
no preto ouro
que se perdeu...

Liricos poetas,
falsos profetas
e disformes estetas
refazem as Minas
de outrora
no triste
verso de agora.

São caminhos
que a caneta
percorre,
contando
a saudade que
nos escorre.

sábado, 29 de outubro de 2011

Ofensas

Rudes homens
sem nomes
vociferam:
fora!
Que nos importa o teu Saber,
se dele eu não preciso
para ter?
Que me importa, Ser?

Seria bom
se não me chamassem
Aleijado.
Doeu além
do que o alivio
da Morfina contém.
Bom seria,
de Canceroso
não ser rotulado,
pois sou mais que
uma doença.
Talvez, um ajuntado
de crença e
uma inoportuna
presença.

Que gente é essa
desenhada a tosco traço
e só amestrada
a ponta de laço?
Que lugar é esse,
cujo mormaço
não permite
o próximo passo;
e onde a mediocridade
só gera
homens pela metade?

sexta-feira, 28 de outubro de 2011

AMORES

Amores de antes
repetem-se
em novos amantes.
Carinhos de sempre
percorrem novos corpos
e beijos esquecidos
renascem atrevidos.

Amores de agora
repetem
o fim da hora;
e a urgência
dos desejos proibidos
e só a custo contidos.

Amores sem Tempo
viajam pelas vidas
e como gerânios
impensados
só aguardam o momento
de serem rebrotados.

Amores em todos Espaço
aguardam seus hospedeiros
e sem a menor cerimônia
embarcam nos corações
passageiros.

Amores atemporais
seguem os Homens
feitos irracionais.
Neles habitarão,
quais Deuses e Tiranos
de todos os Arcanos.

         

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

DROPS

A dor goteja
como chuva
que não passa.
A agonia
do ponteiro imóvel
tinge de escuro
a noite que não anda.
Empurro em vão
cada minuto
e inútil assopro
cada segundo.

Escura dor
na noite escura,
só aos poucos
tu escorre
numa lágrima
impura.

terça-feira, 25 de outubro de 2011

Prenda

Nua Prenda
dispa esse
resto de renda,
pois a Eros
tu será oferenda
como reza
a antiga lenda
da grega calenda.

Caminhe tua
triste senda
e rejeite todo
amor que lhe prenda,
ainda que em
dourada tenda.

Siga os caminhos
do vento
e seque teu
doído lamento.
Teu destino
é espalhar
o amor entre
os Homens
e incitar-lhes
outras fomes.
Fazê-los numerosos,
como os soluços copiosos
que escapam do peito
de quem não tem
mais jeito.

Siga sempre, Prenda minha;
os Mitos e os Ritos
contarão tua história
e dourarão tua memória,
até que um dia
todos achem
que tu é uma mera fantasia,
uma triste alegoria
do que já não havia.

           

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Aquarius

Digam
aos quatros ventos,
que cessem a Fúria
dos Elementos,
pois novos deuses
à Terra são chegados
e outros códigos
serão proclamados.

Que se restaure
a confiança no porvir,
já é tempo do Homem abolir
e de acabar, minha Prenda,
com a humana moenda.

Aquarius é chegado.
Dias em que tudo
de todos será,
qual rosa que viceja
no jardim que se deseja.

Caminhemos baby,
ao nascente da Nova Era.
Outro Futuro nos espera,
pouco antes
da próxima quimera.

               

domingo, 23 de outubro de 2011

Lar

Adentremos
a nova morada
e deixemos
no Passado
qualquer temor
encontrado.

Que o nosso amor
seja sempre Presente
e que a intensidade
nunca seja diferente.

Que cumplicidade
rime com sinceridade
e que a nossa Lua
esteja sempre Cheia
para iluminar
a paixão que nos incendeia.

E assim, doce menina
que o nosso Lar seja
iluminado com tua
luz cristalina.
E que da maldade,
esteja acima.

             

sexta-feira, 21 de outubro de 2011

Gira

Gira a borboleta
um voo de purpurina
e traça no abstrato
um outro retrato.

Figura que só se sente,
pois como num "repente"
o verso descrito
não pode ser escrito.

Sabe-se, então, de
uma folha que o vento leva.
De um segredo que não se entrega
e duma paixão que tudo carrega.

Sabe-se ainda
de uma amante,
de um verso de Dante
e que a vida é só um instante.

E de mais se sabe
antes que o voo acabe,
pois se viu num segundo
o tamanho do Mundo.


quinta-feira, 20 de outubro de 2011

O Poema

O poema é o instante que se deixa apanhar,
o sentimento que se deixa entrever,
a alegre irreverência de se desnudar,
a pura indecência de viver. 

Revira-se o tempo até chegar ao Passado
onde se julgou feliz. Pouco importa, agora tudo está perdoado.
Quanto ao Futuro, não se preocupe, está muito distante.
Será incapaz de reter o poema que é um só instante. 

Momentos, murmúrios, lamúrias, agruras.
Em cada esquina acha-se um poeta exercendo o seu oficio,
ainda que ele não saiba disso. 

O poema é o instante que se apanha,
a vida que se assanha,
a dor que amaina. 

quarta-feira, 19 de outubro de 2011

A Paz de Drummond

- Quando será a biópsia? E a consulta?
- Não sei. Dormi na asculta.

- Você tem que acreditar!
- Tenho? Prefiro alucinar.
- E tua idade, hein?
- Alucina comigo. Ficamos bem.

- Você tem que lutar!
- Tenho? É, você tem razão...
(como lhe explicar que já é o oitavo sermão?)
- Você é forte!
- Sou sim (adoram esse mote).

O meu ofício é responder;
é esconder
essa vontade de nada dizer.

Seria tão ótimo (gente que fala errado),
viver só de um lado.
- Olha, eu conheço um caso...
a Medicina está tão avançada...
para Deus nada é impossível...

Seria excelente (gente de linguajar fluente),
se a todos eu pudesse convecer
que não basta o exercício da vontade
para a cura lhes oferecer.

Mas não me queiram mal,
eu irei lhes agradecer.
Por favor, tentem compreender.

(Drummond, Drummond!
como se faz
para morrer na tua paz?)

* Inspirado no poema "Apelo aos meus dessemelhantes em favor da paz", de Carlos Drummond de Andrade.

terça-feira, 18 de outubro de 2011

Insone

Insônia pelo
ar que te falta
e pelo Tempo
que tudo faz longe.

Insônia pelo frio
do leito vazio.

Insônia recheada
pela dor instalada.
Pelo choro que
sempre tarda
e nem sempre
o horror retarda.

Insônia da madrugada
e do fantasma
de minha casa
assombrada.

Insônia que me visita
e que traz o paletó
da partida e
do abandono
em cada ida.

Insônia de ficar.
De só estar.

domingo, 16 de outubro de 2011

Medos

As garras do escuro
sufocam o que me pensei.
Há tanto vazio,
tanto medo,
na angústia que bebo.
Arranha-me a garganta
a acridade
da agonia
que tomo
em largos
tragos
estragos.
Entre tantos
rasgos
e raros afagos.
Foi-se uma luz
serena.
Foi-se uma
esperança que tanto
sorvi.
Fiquei-me.

Tantos e Tantos

Há tanta cama
em tua ausência,
tanta mesa
em tua impermanência.
Tanto espaço
no vão abraço
e tanto escuro
no umbral
por onde passo.

Tanto silêncio
no fone calado
e no poema
inacabado.

Tanta saudade
de quem meu chamou
de metade,
e sussurou a minha
verdade.

Tanta carência
da nossa urgência,
da nossa inocência
e da nossa sacra
indecência.

sábado, 15 de outubro de 2011

Trágica

Bebo a trágica
tristeza
da Partida.
Sinto o gosto
da liberdade
indesejada.
Sinto o gosto
do Nada.

Vazio que
me rodeia,
qual porto
que o Mar
incendeia.

Aonde ficou
o corpo que amei,
o erro que errei
e a certeza
que um dia achei.

Dias que tomei
nos Domingos
que foram nossos.
Noites que bebi
nos amores
que foram nossos.

E agora só resta
tanto Espaço
a nos separar,
sem o Tempo
que nos fez
acreditar
na eterna Permanência
do que tivemos em Essência.

Chove.
Em cada gota
a saudade diz teu nome.

sexta-feira, 14 de outubro de 2011

A Poesia Ausente

Calaram minha poesia.
Disseram-me o que não se deveria.
Ouvi, o que não queria.

Pedem-me o que não tenho.
Cortam-me com duro lenho.
Com ausente riso, em duro cenho.

Seria bom dormir sem sonhar.
Sem realidade para acordar.
Isento, de qualquer amor ofertar.

Agora, fugiu-me a Cotovia.
Agora sei o horror dessa agonia.
Calaram minha poesia,
última voz que ainda me pertencia.

E assim foi, ...

Reina o silêncio, marrom e denso.
Pouco importa o que sinto e penso.
Meu verso é um ato suspenso.

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Blues

O homem negro insiste com o trompete.
A branca mulher geme em falsete.
Espalha-se o "blues"
em leves acordes azuis.

Balança um copo solitário
na mão do homem vazio.
Alguém se queixa de frio,
da solidão e do próprio desvario.

Um sax chega aos sustenidos.
A mulher retoma os gemidos
e sonha desejos proibidos.

Sente-se o visco do mormaço,
a angústia por tanto espaço
e o simples desejo de um só abraço.

quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Ausência em Amarelo

O diabo é essa solidão que me atordoa,
esse silêncio que nada ecoa,
essa tristeza que se amontoa
e essa liberdade à toa.

Tua ausência habita minha casa.
O jantar que te fiz, esfriou.
A vela apagou,
a lavanda acabou,
mas você não passou.

Tentei te escrever uma poesia,
com rima, métrica e galhardia.
Mas só eu sei da triste ironia
de achar que você já não me doía.

Só eu sei do choro que retenho,
do gesto que contenho
e da saudade que te tenho.

Na tela, em amarelo, você me sorri.
Meu mundo, cabia ali.

terça-feira, 11 de outubro de 2011

A Cidade

Na moderna cidade,
caixa de concreto,
prevalece o ângulo reto.
Na grade, avisa o aviso:
baniu-se o sorriso.
No muro, informa o cartaz:
cães (e donos) anti-sociais.

Sonhos e desejos em Néon.
Grafites escuros em Cryon.
São cavernas dos homens de Cro-Magnon.

Apocalípticos prevêem o Juízo Final.
Bêbados desperdiçam um triste riso.
É mais um sinal.

Neuróticos temem a morte por Antraz.
Para os suicidas, tanto faz.
Não há retorno, nem volta para trás.
Que todos descansem em paz.

Velhas putas buscam o que lhes deem sustento.
Poetas tentam sê-lo, mas as rimas não saem a contento.
Jovens mulheres choram um triste lamento.
Atos simultâneos de um só momento.

Quando a noite chega, a cidade dorme.
Novos seres a povoam. Gente disforme.
Citadinos noturnos. Sem luz nem nome.

Carregam suas cruzes. Viajam avenidas
e no fundo, acreditam em outras vidas.

segunda-feira, 10 de outubro de 2011

Mestra

Sábios Mestres
buscam Mestras Sábias,
pois há nesse Mundo
outro tipo de argamassa,
outro tipo de fundamento:
aqui, uma rocha de cultura,
acolá uma outra de conhecimento.

Dons de poucos, eis que formam
e fortalecem esse organismo
de puro intelecto;
pai gerador das respostas
ao que o Mundo
propõe
e que só a pura Sabedoria
dispõe.

        

domingo, 9 de outubro de 2011

Réstia

A pequena réstia de luz
aos poucos vai desnudando
o pesado escuro
dos dias sem
palavras.

Lá dentro alguém
declama um Poema;
e eu sei das Mandalas
mesmo sem procurá-las.

Cá fora sinto minha
alma rebrotar.
Talvez com um
pouco de adubo,
ela saia do tubo
que, indevido, abrigou-a.

Talvez com o tempo
e mais um e outro
elemento
ela refloresça e frutique,
pois ainda há
quem me peça que fique
e que o amor multiplique.

Talvez alguma paz
chova em seu canteiro,
e o que restava da mágoa,
embarque no trem derradeiro.

Talvez,
eu volte
a ser inteiro.

sábado, 8 de outubro de 2011

R...

De novo sou eu,
a mala
e a estrada.

Sinto uma dor
dificil de ajeitar
e um choro
retido,
pelo que não
deveria acabar.

- Mas assim é, poeta.
Está feito,
o sonho desfeito.

Junte teus pedaços,
solte os últimos laços
e siga teus passos.
O devaneio que tu
viveu,
mostrou-se não
ser teu.

sexta-feira, 7 de outubro de 2011

Desilusões

Fantasmas roubam-me
o sonho
que ingenuamente
sonhei.

A Terra-de-ninguém,
o Oeste sem lei
acolhe-me novamente
e o Passado
corrói o Presente.

Karma que resgato;
essa seca
no regato
(que antes saciou
minha sede)
insiste em borrar
o amor
no Porta-Retrato.

Quantas ilusões
ainda tenho
para perder?

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

Cadeira

Impotente como
leão enjaulado,
sinto inútil
a força que
me resta.

Vejo o Mundo
pela metade.
Estou confinado
a duas rodas
e à cobrança
que me fazem:
seja forte,
sorria,
vença!

Cadeirante estreante,
arrisco uma
verdade petulante:
Tenho medo,
tenho raiva
e choro de
tristeza; e
sonho com pernas
estendidas,
nas ruas que
me foram conhecidas.

Não sou quem
esperam.
Sou quem
desesperam.

segunda-feira, 3 de outubro de 2011

*Anjos Pornográficos

Anjos pornográficos
derramam os malfadados
cálices do Armagedon.
É hora das trevas
e do chá de Sete-Ervas.
Já nada ilumina o Futuro,
que chamavam porvir.
Já nada incendeia
o amorfo Presente
de um Passado
disforme.

Anjos caídos,
sapos engolidos
e gnomos mal-resolvidos.
O Programa Padrão
deleta fantasias,
tolas quimeras humanas,
movidas a Canabis
e a doses de Cana.
Rezam carolas
e pulam as Sete-Marolas,
mas Yemanjá
não vem.
Findo está
o onírico
lirico.
Lúdico já não há,
porque idade
não há.

Fecha-se a cena
e a filosofia de
Avicena
é declamada
nos bordéis
dos putos
menestréis.
Fecha-se o poema,
pois a Musa foi
engolida pelas Minas.
São as tristes sinas.


* Inspirado no título do livro de Ruy Guerra "Anjo Pornográfico".

domingo, 2 de outubro de 2011

Dores

Reparta comigo
a tristeza
que te veste
e divida tua dor
agreste.

Venha,

caminhemos ao Leste,
participemos do Nascente
onde a dor
ainda é ausente,

caminhemos ao Oeste,
participemos do Poente
onde a dor
já não se sente.

E ao Sul e ao Norte
caminhemos;
da dor logo
esqueceremos.

                

sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Lirica

Que a lirica
dos versos
e verbos
do louco Poeta Errante
celebre os ritos
do amor constante

e

que o Canto de Orfeu
vença o Hades sombrio
e restaure a esperança
que esteve
por um fio

e por fim, que tudo
mais aconteça
para que poetas e loucos
façam ouvidos moucos
à fealdade do Mundo;
e que tais só descrevam
o lirismo de Cristina,
como só a poesia
ensina.

          

quinta-feira, 29 de setembro de 2011

Ir

Por que tu
não pára, homem?
Por que não deixas
o Mundo
em sossego?
O que esperas
encontrar nesse
outro lugar?
O amor que
nunca teve?
A paz que
sempre te fugiu?
São quimeras,
homem.
A vida haverá
de se repetir
e teus horrores
voltarão.
De novo cobrar-te-ão
a felicidade
que não tens.
O vigor que
te deixou
e o dinheiro
que acabou.
Cobrar-te-ão,
homem,
o que já não és!

Talvez,
voz do Conselho,
talvez...
Entretanto, irei;
morde-me ainda
o gosto e a vontade
de ser feliz.
Ainda respiro
o incerto prazer
da andança.
E ainda sonho
com a felicidade
dos ingênuos.
Aqui, algumas camas,
oferecem-se-me,
mas já não quero
o vazio de antes,
de durante e de depois.
Eu só quero,
voz da Razão,
tentar novamente
e quem sabe,
virar gente?
Eu só quero,
voz do sizo,
libertar meu riso
e pensar que
cheguei n'algum
Paraíso.
Irei, sim,
voz da Prudência,
pois só eu sei
de minha urgência.
Só eu sei
dessa mágoa
que me domina;
e só eu sei
da esperança
que chamo de
Crihstina.

quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Eros Amante

Percorro tuas curvas
e aspiro teu perfume.
Mordo tuas uvas
e ouço teu falso
queixume.

O calor do desejo
aquece minha mão;
e nela sinto
tua feminilidade
ávida pelo encontro
que nos faz um.

Tu me acolhe
em teu abrigo
de todo perigo;
e juntos rumamos
para o Nirvana
espalhado em
nossa cama.

Eros nos possui
até que a saciedade
nos cubra
na jovem
Aurora rubra.

Fizemo-nos amantes.
E a vida se refaz
nesses instantes.
Outros amores faremos,
pois amantes,
sempre seremos.

Bem-Querer

Grita-me o Carcará
que a seca
no peito
chegou sorrateira
e já devora
o amor
que em verde
desabrochou
na Primavera
que recém terminou.

Alma ressecada,
ressecada Terra,
aqui jaz
o afeto
que se encerra.

Bateu asa o Curió,
Bateu asa a Sabiá.
Bateu asa
o bem-querer
e o sonho
de reviver.

terça-feira, 27 de setembro de 2011

A Angústia

Se digo frases secas
e versos ocos,
é para minha angústia
não encontrar
caminhos fáceis
para me deixar.

É a última companhia
que tenho.
E mesmo assim sinto
que pretende abandonar-me.
Por isso a cerco com versos loucos,
esperando que sejam arames seguros.

Murmuro monossílabos,
pois temo que palavras
bonitas sejam carruagens
que me roubem o que restou.
Aflição do eu sozinho.

Além de remorsos, *Carlos,
a história é saudade...


* Da poética de Carlos Drumonnd de Andrade.

Lua Minguante

A Lua minguante,
minha doce Poeta,
sempre nos remete
para o que
nada promete.

Assiste-se no Céu
a redução dos Sonhos.
E pesadelos medonhos
geram "Dia-Monstro" cruel.

A Deusa Rotina
impõe sua disciplina.
E só uma cinza cretina
preenche a retina.

Na Lua Minguante,
tudo é passante.
E a cada instante
a Vida escorre
para a vazante.

segunda-feira, 26 de setembro de 2011

Fantasma

A sombra
que me habita,
escorre na
lágrima aflita.

Drama que acontece
tão logo
a noite desce.

Sinto a angústia
de Graciliano.
Sei-te dano,
sei-me engano.

Uma alma geme
a impossibilidade.
É minha última verdade.

* Graciliano Ramos, Angústia

sábado, 24 de setembro de 2011

Caminhar

Caminhante,
cantou o Poeta*,
caminha
teu caminho.

Bruto chão
aberto
em procissão
do Eu sozinho,
apesar da vela,
da reza
e do Canto em Latim
para
Eros Serafim.

Caminhante
**Judeu Errante,
segue o bicho
humano
em busca
doutro plano.
Talvez mais suave.
Talvez menos grave.

Que a água do batismo
lave teu pecado
e que,
purificado de todo mal,
destrave-se a tua sinceridade,
pois se tu sonhas
com o Paraíso
é necessário
que escrevas nesse diário,
no qual se nota
que a Solidão
é o choro
antes
da comporta.

* da poética de Antonio Machado, Sevilha, Espanha.
** do folclore europeu.

sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Desejos

Busco teu corpo
com a avidez
das urgências.
Quero-te toda,
quero-te minha,
paixão e desejo
em tudo que vejo.

Aguarda-te nossa cama.
Longas carícias
desenho em tua pele
e percorro tuas coxas
com a fome
que tudo come.

Eis-me dentro de ti,
no balanço de dois
igual a um.
Idas e vindas
no amor que se faz.
Vindas e idas
na saudade
que
aqui jaz.

    

quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Versos Iguais

Ainda que
fossem iguais,
jamais os Poemas
seriam banais,
pois eis que
celebram o Amor
que em Cristina
viceja.

E porque é
preciso cantar
(ave Vinicius*),
cantam os
Versos Iguais
o mesmo orvalho
que molha a Terra
e desperta o Mundo
de minha Princesa,
meu motivo e certeza.

Cantam as dores
das ausências,
as insônias
das saudades
e sobretudo,
a paixão que perdura
nesse amor
que findou minha procura.

                     
* Vinicius de Moraes, poeta maior.

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Brincar

Um, dois, três
repete a menina
que pula corda,
sem saber que
salta o Mundo.

Por instantes
voa como colibri
inocente,
tal qual a canção
entre os dentes.

Também queria
pular o Mundo
para ver Cristina.
Mas tal arte
não se domina
quando já se perdeu
a inocência
do colibri menina.

Mundo, Mundo
de tantas léguas
a caminhar,
cure minhas pernas,
cure meu andar
e me leve à
doce amada,
pois junto dela
aprenderei a voar.

terça-feira, 20 de setembro de 2011

Quase Adeus

Uma nuvem,
traz certo cinza
ao que há dois ou três dias era tão translucido. Era tão claro, era tão certo, era tão bom.


À minha frente vejo nosso retrato e não posso deixar de me perguntar aonde foi parar a plena confiança na felicidade que juntos vivemos. Por que, meras duas horas terminaram o sonho que parecia eterno e o encantamento que sentíamos definitivo?

Como lama viscosa, sinto que me invade pesada angústia. Junto dela, a busca inútil e aflita pela pedra que trincou esse cristal. Fantasmas que antes pareciam conjurados voltam à cena. Impiedosos, mostram que em tudo que ainda tentamos, o brilho é menor. Que a mágica da madrugada começa a ser deflorada pela tirana luz do dia/realidade. Que o encantado instante do amor sem reservas, já se submete ao julgamento da Razão e que a passionalidade começa a ser vencida pela burocracia do questionamento. Que, novamente, sinto escapar o amor que sempre busquei. Que caminho, de novo, para a solidão da cama feita e do sonho desfeito. Que...

Quem dera, eu pudesse acordar desse pesadelo. Ouvir, de novo, “amor” e não esse frio e distante “Fabio”. Quem dera, eu pudesse escutar novamente o riso seguro da minha Estrela e nele saber que ainda há espaço para minha poesia. Que ela ainda está ao meu lado, embora tanto chão nos separe. Quem me dera...


Quem me dará a força que preciso para conservar a certeza de que novas águas haverão de mover outros moinhos, enquanto fertilizam novas tulipas nas margens em que viajamos? Quem me dará força para crer que esse sonho mal haverá de terminar ao fim de cada perdão concedido? E que dele saiamos inteiros e com a ingênua crença que nos permitiu um dia, o direito sonhar?

São Paulo, 20/09/2011

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Passarinho

Fala-me um passarinho verde
do tesouro que achei.
Verde, que te quero Verde*,
seja sempre
a esperança
de tua fala;
e que sempre
me traga
a cura da
nova mágoa.

Sei-me excessivo.
Passional,
sentimental
etc. e tal.
Coisa de poeta aprendiz.
Daqueles, que sempre me quis.

E sei-te Estrela,
sei-te amada.
Daquelas, que
sempre procurei
e só entre bytes
encontrei.

Talvez critiquem
minha entrega.
E até tentem
corromper o que sinto
com laicas blasfêmias
de quem se vendeu
ao Sistema.

Mas em vão tentam,
verde passarinho.
Está em Cristina
o meu caminho.

* da poética de F.G. Lorca.

domingo, 18 de setembro de 2011

Porto

A trágica
tristeza
da Partida.
Sinto o gosto
da liberdade
indesejada.
Sinto o gosto
de Nada.

Vazio que
me rodeia,
qual Porto
fantasma
em Oceano
nenhum.

Onde ficou
o corpo que amei,
o erro que errei
e a certeza que
um dia pensei?

Dias que tomei
nos Domingos
que foram nossos.
Noite que bebi
nos amores
que foram nossos.

E agora só resta
tanto Espaço
a nos separar,
sem o Tempo
que me fazia acreditar
na Eterna permanência
do que vivemos
em Essência.

sexta-feira, 16 de setembro de 2011

Mudar

Sem destino,
uma Crença vagueia
sem se importar
que outrém
lhe creia.

Nela, algum Deus incerto
sopra a bonança
que há na mudança.
Sabe-se, então,
o que importa:
o riso
atrás da porta.

O cheiro de Pitanga
indica um inesperado
quintal;
e a nova casa brilha
na crença esperança
que só a amada alcança.

Tão bom vê-la crer
na vida que nos espera,
tão logo o Sol
cumpra a Primavera.

quinta-feira, 15 de setembro de 2011

Todo

Talvez algum
"Diazepan"
apresse a manhã
e eu escape
dos demônios
que povoam
minha insônia.

Por que segui reto?
Por que fiquei quieto?
Tolo vão obstinado.
Herói desusado.

Agora eu sei
que no breu da noite,
nem todos os
caminhos se cruzam.

A vida foi curta
para os meus desejos
e sempre faltaram
os ensejos.

A Mantiqueira
viu-me nascer,
mas a pretendida
Passágarda perdeu-se
em incertos passos
e dela só restou,
Mestre Bandeira,
esse pouco de
poeira.

Herdeiros de Montezuma,
choramos o ouro perdido
e o sonho proibido.
Disforme "Abapuru",
em colorido brasileiro.
triste herdeiro...

A Lua com conhaque
do Poeta mineiro
revelará algumas
amantes.
E contará das
histéricas Bacantes
que copulam
na cama de antes.

Qual gaivota
anunciará
a chegada da
"terra e orgasmo
à vista"?

Tudo, o Câncer me
corrói.
Mas ainda penso
em ti;
e na utopia que
vivi.

Referências às poéticas de Carlos Drumonnd de Andrade e Manuel Bandeira.

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Morada

Na outra ponta
de minha saudade,
mora Cristina.

Entreato
de meus atos,
no teatro
que já não
se repete.

Recomeço
de eterno
começo,
no novo Sol
que amanheço;
e no Amor,
que contigo
anoiteço.

Na outra ponta
de minha saudade,
mora a minha
melhor metade.

     

terça-feira, 13 de setembro de 2011

Mais-Valia

Vejo a máquina
de parir gente,
fazer o Homem
ausente.

Em qual
engrenagem ele
sucumbiu à moagem?
Quem lhe tirou
a essência,
deixando apenas
a subserviência?

Caminha em fila.
Dança, doença,
miséria e auto-ajuda
"facebook-compartilha".
E segue ordeiro
para o sacrificio
derradeiro,
sem ter vivido
por inteiro.

Apague-se o Candieiro
e se sopre o braseiro.
Partiu o Homem ausente,
cuja falta, pouco se sente.

Dele ficou, talvez,
alguma cria;
e a certeza doutra
vida vazia:
Servo ou Amo,
da Mais-Valia.

           Para Thyago, filho amado.

segunda-feira, 12 de setembro de 2011

Corcéis

Trotam os cavalos
de Apolo
seguidos pelo
Carro do Sol.

É a madrugada
da Aurora
que chega,
trazendo teu
perfume de jasmim.

Trotam os cavalos
de Apolo,
pois é tempo
de Febe
adormecer o
Mundo.

Sonhe poesias,
Musa do meu Parnaso.

Em qualquer
brisa chegarei
e só para ti
levarei
o Desejo que me arde
e a Ternura
que me invade.

Sonhe, doce Cristina.
Desviarei
os açoites da vida,
para que nada
mude o curso
do Rio que te
aquece,
enquanto outra
Estrela floresce.

Sonhe, minha amada,
pois em ti
repousa,
o inverso
do meu Nada.

domingo, 11 de setembro de 2011

Minas

Meia-noite nas Minas;
tempo de desejos
arfantes,
na lirica dos poetas
amantes.

Meia-noite
da noiva fantasma,
que percorre
caminhos e medos
na antiga
Inconfidência.

Que outro cinzel
esculpirá minha amada?
Qual montanha a seduz
e em qual Oratório
seu brilho reluz?

Saudade das Minas.
Saudade de Cristina.
Espaço e Forma
de um Tempo que retorna.

             

sábado, 10 de setembro de 2011

Temor

Temo a liberdade
do abandono.
Temo a tua partida,
temo a minha ida;
temo o fim
da vida.

Por que uma
esquina se fez
nessa quadra
do amor prometido?

Por que o tempo
já é ido?
Por que tudo
já foi vivido?

Por que o
carinho
foi banido?

Hora da mala.
De novo, a mala.
Talvez uma lágrima
e a porta da sala.

              

sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Azuis

Vento que leva
o azul do Céu,
deixe-me o amor
de Cristina,
pois nela está
a Promessa
de uma vida
que recomeça.

Nela estão os azuis
que virão.
Todos os azuis
desse tempo
pós Agosto.
Todos os azuis
de Mestre *Bandeira
em sua poesia primeira.

Deixe-me, azul do vento,
o riso de Cristina,
a Musa amante
que me escreve
o verso delirante.

Mas leve, azul do vento,
o paradoxo
de todo argumento,
pois a vida é breve
momento
a deslizar no
Rio sentimento.

            
* Da poética de Manuel Bandeira.

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Brilho

Porque todas as
estrelas brilham
em teus olhos,
qualquer escuridão
será efêmera.

Passarão os miasmas,
passarão meus fantasmas,
passarão as distâncias,
passarão as inconstâncias,
passarão as maldades,
passarão as saudades...

e tudo passará,
pois em ti está
o pleno vigir
da Noite a luzir.

     

quarta-feira, 7 de setembro de 2011

Idas e Vindas

Idas e Vindas
como onda
da preamar.

Tanto mar,
mestre *Chico,
nesse bem-querer
que me beija
a boca
e a alma...

Tanta ida,
tanta vinda.
Mas nunca
é cedo ainda...


*Da poética de Chico Buarque de Hollanda.

terça-feira, 6 de setembro de 2011

Orgasmo

Eu queria poder
sair das antigas
camas.
Eu queria poder
estar nas novas
camas.
Ser apenas Presente,
sem Passado nenhum.

Sombras me visitam
e sinto que o prazer
se fecha.
Pérola que se perdeu
naquele Mar
sem fim.

Onde encontrarei
o gozo
que perdi,
nas carícias
que insisto?

quinta-feira, 1 de setembro de 2011

Cerejeiras

As cerejeiras
floriram depois
de Maio.

Chegados estão
os maduros amores e
as maduras cerejas.
Brisas benfazejas
dispensam inúteis
proezas,
pois é tempo
de pura leveza.
Tempo de vontade
atrevida,
da saudade mais
doída
e da espera mais
sentida.
Tempo, de novo
brinde à vida.

As cerejeiras
só floriram
depois de Maio...

                     

quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Leve-me

Leve-me consigo
em busca da paz
que persigo.

Ensina-me tua
serenidade.
Teu alheamento*,
como disse Drumonnd.
Que meu pensamento
seja limpo, seja bom;
e que minha certeza
sobreviva a toda
correnteza.

Que eu, como tu,
mantenha ex amores
no peito;
e que de algum jeito
lhes conviva,
junto com amor
que passa no
momento.
E que tal se faça,
sem a maldade
das tolas afirmações.

Que eu, como tu,
acredite na vida
e na luta sem trincheira,
pois se o Mundo
é só barreira
que se leve a paz
a toda fronteira.

Que se tenha
a quase ingênua
bravata de todo
Sancho Pança,
ao se ater
a um só fio de
Esperança.

Que eu me liberte,
assim como tu,
de todo ciúme
e de todo queixume,
por saber que é na
resignação
que a vida se resume.

Que eu, assim como tu,
erga-me presto
das desilusões,
pois se todas passaram
e outras passarão,
só me resta
viver
até outra vida
acontecer.

* Da poética de Carlos Drumonnde de Andrade.

terça-feira, 30 de agosto de 2011

Belos Dias

Ficaram belos
os dias,
porque tu os habita.

Belos como o
amor que grita,
na paixão que
os corpos agita.

Belos dias
nos eternos festins
que a vida se tornou,
logo após a porta
em
que tu entrou.

Belos dias
pelo intransitivo
conjugar,
de Cristina
verbo amar.