segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

Ame-o ou Deixe-o


Já foi assim.
Foi no tempo do "boi da cara preta",
no tempo em que calaram a retreta
e louvaram o "deus-baioneta".

Tu te lembras, guerreira?
Aonde tu vives agora
existem lembranças?

Eramos jovens. E ríamos.

Lembra-te do gosto bom
de Buarque-Poesia
e do amor que se fazia?

Eramos jovens. E vivíamos,

apesar da tortura,
apesar da Ditadura...

Lembras guerreira,
do sonho que insistia,
do corpo que resistia
e do "Lobo Carrasco" que nos batia?

Mas, depois, guerreira,
tanto nos machucaram.
Violaram o teu corpo
e queimaram a nossa alma.

E até quiseram que o deixássemos.
E nós o amávamos tanto...

Então, um pedaço de mim
já não existia.
Tu, já não vivia...

Lembras,
do livro que eu escreveria,
das cores que tu pintaria,
do filho que o jardim pariria
e do novo Mundo que viria?

Mas, não veio a *utopia...

Lembras, guerreira?

           
                                                 Para Bete.

*Da poética de Carlos Drummond de Andrade.

sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

O Baile

O paletó já não acomoda
o homem que foi esbelto,
mas o gesto galante
ainda conduz a dama
das negras lantejoulas
por todos os salões
já dançados.
A música de ex amores
toca nostálgicas saudades
e uma lágrima jovem
corre pela face sozinha.
Mãos adultas acariciam
cabelos brancos e idéias passadas,
enquanto vozes semi cansadas
sussurram falsos dilemas.
A meia-luz das lâmpadas azuis
não substitui a Lua,
mas ainda assim, sonha-se.
Ama-se, talvez.

As noites de tantos antes
agora são essas.
Amanhã o Sol revelará
o que se quis esquecer.

quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

PRÊMIOS RECEBIDOS - Associação Artística e Literária Multiprofissional - ALPAS 21

Queridos (as),

tenho a grata satisfação de registrar as Menções Honrosas como Destaque Literário Nacional que me foram concedidas pela Associação Artística e Literária Multiprofissional - ALPAS 21 - no XVII Concurso Literário Internacional de Poesias, Contos e Crônicas  realizado em Porto Alegre - RS - em meados desse ano. Tive a grata felicidade de ter doze (12) poesias classificadas sob essa chancela, o que certamente contribui para aumentar minha satisfação por ter tido a oportunidade de bem representar o nosso País.






quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Espelho


Há desejo no olhar
que o espelho embaçado
aos poucos revela.

O corpo aprisionado
no casulo da toalha
logo ganhará asas,
pois é no voo da borboleta
que o lírio floresce
e o corpo se oferece.

Há pressa na mão
que logo será cem.
É preciso que todas as carícias
percorram o seio que arde.

E há paixão nos lábios
que beijarão todos os lábios.
E que murmurarão
a canção do amor maior.

Então, as vidraças embaçadas
esconderão as entregas
e proclamarão as verdades,
enquanto os sentidos
voarão as liberdades.

sábado, 22 de dezembro de 2012

As Estações

INVERNO

Cautela, filho, porque
grande é o Mundo
e tantos são
os labirintos de se perder.
Cuidado, mulher,
porque nem sempre
as carrancas do São Francisco
exorcizam os demônios,
nem sempre as brancas rendas
beatificam os dias,
ou as negras bençãos
afastam o infortúnio.
É preciso estar atento,
pois nem sempre
o canto de Iara se evita
e nem sempre a maré
espalha o azul pela vida.
E mais cuidado é preciso
quando o corpo da amada
ao prazer nos convida,
pois eis que nos espreita
a dor da saudade
e a solidão da idade.

OUTONO

Um vento amarelo
despe a árvore envergonhada
(o homem recolhe
as folhas caídas
no chão burocrático.
Quem fará igual
com as nossas almas?)
Quem, poeta?
O tempo, Musa de sempre.
Apenas o tempo
haverá de recolher
os nossos sonhos
e, talvez,
compensar as nossas ausências.
Apenas o tempo, Musa de sempre,
haverá de justificar
as novas crenças
e o Arco-Iris
que insiste no horizonte.
Apenas o tempo, Princesa,
trará a outra Primavera.

PRIMAVERA

E o tempo é de esperança.
E o tempo é de renovar a aliança.
Que tenhamos a força da generosidade
e que nunca nos falte a solidariedade.
Que ao amor sejamos convidados
e que por todos os perdões
sejamos perdoados.
Que o corpo experimente o gozo
e a alma, o orgasmo do repouso.
Que saibamos prover,
mas que nos esqueçamos de prever,
pois é no inesperado
que a boa sorte
revela o seu fado.
Que tenhamos,
até,
o gosto da melancolia,
apenas para sentir
o esplendor do novo dia.

VERÃO

Caminhe comigo, mulher.
Andemos por nossos corpos
e exploremos os mútuos prazeres.
O Mundo não teve fim
e a cor se renova
em cada rosa colhida,
em cada lágrima não vertida
e em toda mão estendida.
Bebamos os prazeres do vinho.
Experimentemos os sabores da romã.
E, principalmente,tenhamos a ventura de ver
que são estrelas os teus olhos
e são abrigos os teus braços.
Saibamos que a chuva do fim da tarde
haverá de trazer a fresca brisa
e que o balanço da rede
trará a cadência do amor.
Ande comigo, mulher.
A vida é o caminho.

               Para a Musa de sempre.

quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

Speratio


Que a esperança renovada
em cada semente germinada
reponha os deuses ancestrais
em seus coloridos pedestais.
Que a boa sorte nos cristais
predigam o fim do anjo nefasto
e do triste banquete
de intragável repasto.
Que a ideia imóvel,
que o tempo perdido
e o vicio da mediocridade
não resistam à luz e claridade;
e que a fantasia seja
a mais pura realidade.
Que abandonemos o rebanho
triste e lanho
e exerçamos a Poesia devida
em cada acácia devolvida.
Que ao labor não sejamos forçados,
mas ao amor sejamos destinados.
Que tenhamos a dignidade de um cão
e a generosidade do chão fecundo,
pois saberemos que mesmos ínfimos
somos o Mundo.
Que saibamos ser irmãos das Estrelas,
filhos das árvores e amantes do verso,
pois eis que nos saberemos Universo.
Que tenhamos mãos para o afago.
Que tenhamos um riso largo.
Que tenhamos uma lágrima caída
uma página virada, uma história vivida,
uma chegada, uma partida,
e, sobretudo, o milagre da vida.

Dedicado a todos os (as) amigos (as) e sobretudo aos Confrades e Confreiras da Academia Nacional de Letras do Portal do Poeta Brasileiro. A todos desejo um Natal e um Novo Ano repleto de tudo que lhes traga felicidade.

segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Preso Tempo


Preso tempo entre as paredes
que não passam.
Entre as gavetas que se fecham
em perpétuos segredos
da vida que não se fez.

Preso homem dentro do preso tempo,
dentro da presa gaveta
que guarda a vida
sem segredos.

Quem haverá, homem preso,
de quebrar tuas cadeias,
iluminar tuas candeias
e arar tuas areias?

Quem haverá, homem tempo,
de abrir tuas gavetas,
revelar teus segredos
e viver-te a vida
que não se fez?

Quem haverá, homem sozinho,
pois a estrela se foi,
o poema é segredo
e o tempo já não é...

Quem haverá?



Digitado pela Taisinha no noroeste do Estado de São Paulo.

domingo, 16 de dezembro de 2012

Colo


Quem dera eu pudesse despir
essa angústia que me veste.
Quem dera eu pudesse chorar
e o consolo de um colo
houvesse.

Lembras, doce companheira,
das cores que visitamos?
Dos caminhos que andamos
e dos amores que amamos?

Mas agora, quem dera meu grito fosse ouvido
e o teu carinho não me fosse proibido.
Quem dera o amor que tivesse havido
não se tornasse o momento interrompido.

Lembras, doce companheira,
do tempo que sonhávamos
a música que nos era exclusiva
qual a alameda da "sempre viva"?

Mas agora, quem dera a música
não fosse privilégio do Aedo
e eu pudesse tocar a certeza
de não ser só.

Lembras, doce companheira,
dos planos que imaginamos
e das fantasias que realizamos?

Mas agora, doce companheira,
eu só queria que o "blue" da negra voz,
fosse a ponte que me transporta.
E que te permiti.

    Porque os diamantes e a Musa são eternos.

sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

A Rua da Meia-Noite


A Rua da Meia-Noite
aquieta todos os rumores
para que das janelas cerradas
ouça-se a moça cantar
as águas passadas.

E antes que ao Burgo se chegue
alguém chora uma distância
e pelas brancas paredes caiadas
desenham-se saudades resignadas.

A sombra dissolvida na escuridão
já não modela os corpos amantes,
mas o perfume dos manacás
revela as mãos que se deram
e as lisas pedras do calçamento,
os poemas que se fizeram.

E quando ao Burgo se chega
as rosas de jardins modestos
protegem os Castelos
que são casas e são lares.

Ainda nas mesas jantares descansam
dos apetites saciados.
E os corpos cansados
sonham heroicos moinhos decisivos
e amam amores definitivos.

           

domingo, 9 de dezembro de 2012

Auto de Açucena


- Branca Açucena
que do fundo nos chega,
conte o que viu
na Terra das gentes.

- Pouco eu vi, poeta que pergunta.
E menos entendi,
pois o véu que o Mundo
nos obriga
roubou o que viam esses olhos;
e essa mão (que a Terra
haverá de comer),
só o cinza vazio segurou.

- Mas e a luz que às vezes avistamos?

- Dela, só soube que é semi extinta.
Que são os brilhos derradeiros
de quando o amor existia.
De antes que o medo e o orgulho
apagassem o bem-querer.

- E mais nada restou, Branca Açucena?

- Só a paúra de saber que no Futuro
haverá de se perguntar o por quê
não se deixou a Felicidade ficar.

- E a Ciranda que se ouve, Açucena?

- Essa eu vi. É quem canta e festeja
a tristeza de quem quer sonhar.
Canta e festeja
porque nela está
que em vão já sonhou
e quem nunca sonhará.
Canta e festeja, canta e pragueja
para os sonhos não sonhar.

- Tão triste, branca Açucena.
- Tão triste, poeta que pergunta.

sábado, 8 de dezembro de 2012

Gestos


E porque o Poema
é um gesto em azul,
sabe-se da aquarela
que a bailarina pinta
no espaço que preenche.

Sabe-se do som
que viaja memórias
e das luzes
de espadas, cruzes
e histórias.

E mais se sabe,
pois eis que as árias
são ecos de vidas
e as danças dançadas
são vias caminhadas
no cenário carmim,
com a certeza
do sim.

                    Para Glória.

quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

Que Sejam


Que sejam mansos
os mares que tu navegares.
Que sejam generosos
os portos em que te abrigares.

Que sejam ternos
os abraços que te acolherem.
Que sejam firmes
as mãos que te ampararem.

E que de todos
só recebas
um ramo de paz.

Que sejam dóceis
os solos que lavrares
e sejam muitos e gentis
os frutos do teu ensinar,
pois eis que a terra
saberá querer teu leve jugo.

Que brancas Luas inteiras
façam de prata as tuas noites;
e que todas as lavandas
perfumem os lençóis
que abrigam os teus amores.

E, então, quando tudo
assim se fizer,
esteja certa de que
se cumpriu a sua sina,
doce Musa de toda rima.

segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

Dança do Ventre

São amêndoas
os olhos de Nefertiti rediviva.
E neles se revelam
os antigos mistérios
que bailam sensuais
nos véus que cobrem
a pele dourada
da bailarina de ouro.

E neles as tâmaras da noite
saciam a sede de amor
e a fome dos corpos.
E enquanto os Anafis
evocam Isís deusa,
o hálito morno do deserto
conta do oásis que o futuro
haverá de trazer.

E tudo,bailarina dourada,
porque tu danças.
E tudo, porque a ti 
coube parir a beleza.


Modelo da Foto - Miucha Cicaroni.

domingo, 2 de dezembro de 2012

Sei-te Acácia

Em vão os olhos se fecham,
pois nem todo breu
diminui o brilho
da Estrela que viaja
a madrugada.

Sinto-te, gozo antecipado
e saciedade pressentida,
pois sei que longe,
logo estarão
as guerreiras colunas.

E sei de tua vinda.
Sei das acácias que trazes
e das árias de Verdi
que te anunciam.

E nos sei em lentos lençóis,
no vagar do amor de todo tempo
e na carícia
de cada momento.

               



sábado, 1 de dezembro de 2012

Macabéa Envelhecida


Eu não deveria ter dificuldade para descrevê-la, pois tanto já se disse sobre ela que são tantas. E eu sei que preciso escrever sobre ela. Talvez seja o único registro de sua passagem invisível por esse Mundo de meu Deus...

Parece que combinamos milimetricamente o espaço e o tempo. De Segunda a Sexta-Feira quando estou no 3º degrau para a fila do Caixa, exatamente as 12h45, ela assoma o hall do restaurante.

Nem preciso lhe ver para saber o traje do dia: nos pares, uma bermuda marrom e uma blusa florida, com quatro botões. Nos ímpares, a bermuda é preta e a camisa é de malha azul.

Imutáveis, apenas as sandálias grossas que abrigam os seus grossos pés relaxados e a companhia do homem cinquentão que se sabe traído pela esposa, mas que continua com a esposa por causa das crianças, entende? E que tem como principal característica o fato de usar no bolso dianteiro, no lado direito da calça de tergal azul marinho, um chaveiro que se articula em duas partes: a que escorre para o interior do bolso, prende as chaves. A que fica para fora, a guisa de enfeite, ostenta a medalha com o logotipo da imobiliária em que ambos trabalham.

Eu acho que ele também se chama igual, mas com a devida desinência de gênero; logo, Macabeu. Macabeu envelhecido.

Macabéa e Macabeu envelhecidos atrás das escrivaninhas que ocupam na Imobiliária do Dr. Sarmento desde que saíram do que ainda chamam de “Grupo Escolar”.

Dr. Sarmento, patrão de Macabeu e Macabéa, advogado cadeeiro, alcoólatra e putanheiro. Dr. Sarmento, jogador nos cavalos, nos carteados e no galinheiro. Dr. Sarmento, o demo primeiro.

E como desgraça pouca é bobagem, Dr. Sarmento é pai de Sarmentinho que em certo dia, após saciar a larica, desenhou um grande e estilizado “IS” e de sua criação se fez o logotipo que usa Macabeu que pensa que o usa.

Logotipo da Imobiliária que em suas mãos, prevê Macabéa, ira para o “beleléu”, pois o moleque é um maconheiro sem vergonha que não respeita ninguém e vive atrás das raparigas que acham que Farol de Xênon fica feio em carros populares, pois isso ele as ensina quando ao alugar-lhes a Kit net troca a exigência de avalista por uma rapidinha.

As nobres damas concordam, pois se sabe como são as pessoas que não gostam de Faróis de Xênon em carros populares, enquanto pessoas e a nível de... 

E “La Nave Va”. Dia após dia. Dias após dias.

Então, a face de Macabéa já não demonstra a severidade que pretendia na juventude.

Restou apenas um misto de amarga resignação enquanto secam os açudes dos olhos que já nem vertem as lágrimas devidas ao moço da telenovela que descobriu sofrer de câncer. Aliás, a nem a qualquer outro câncer, outro moço bonito e outra telenovela. Secou, como o Sertão de 1915.

Amarga resignação de sexo masturbado, de carinho feito apenas pelas manchas senis das mãos maternas, que são fortes e rijas já perto dos noventa. Resignação pela mesmice de Natais repetidos na chácara em que dança o sobrinho efeminado e que a todos chama de “Tato”. Amarga resignação pelos dias de noites ausentes e pelos poemas que não chegaram. Pelas dívidas irresponsáveis que nunca foram feitas, pelo porre que não se tomou, pela cama onde não se amou e, principalmente, pelo sonho que não se sonhou.

E La Nave Va... Dia após dia...

E eu não deveria ter dificuldade para lhe retratar, mas a cada dia está mais difícil olhar para o espelho.


Peça de ficção. Qualquer semelhança com a realidade terá sido mera coincidência.