segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Veraneio

Como se o Céu tivesse outra camada,
vê-se o voo da passarada
ao Arco-Iris da chegada.

Impera soberano
o cheiro de terra molhada
e se sente a querência
do amor primeiro,
após o uísque terceiro.

E tudo mais se fez
sob o vermelho-dourado chinês.
Paixões do Estio,
a espada e o fio.

E tudo vai até as águas de Jobim*.
Meio não há,
só começo e fim.


* As águas de Março, de Antonio Carlos Jobim.

sábado, 29 de janeiro de 2011

Luluzinha Vegetariana e os Micróbios

“é que fornecerei, depois de morto, alimento aos animais que me nutriram...” Sófocles, em FILOCTETES.


Luluzinha, menininha adolescentezinha, fragilzinha, mas revoltadinha, certo dia cansou de ser “Animal Pessoa” e quis sair da Natura.

— Não sou onívora como a natureza me fez, sou vegetariana como o senso me fez.

E se recusou a comer outro bichinho. Definhou, emagreceu e pensou que um animal talvez salvasse. Talvez dois, ou talvez três, ou talvez uma salva... E assim pensava:

Se João Antonio e Antonio João dizem que sou gostosinha, vou “tc” com minhas amiguinhas para contar que embarcarei na boleia de um caminhão da CEAGESP e só pararei em Porto Seguro do agreste. (Do agreste?!) A passagem para o bruto ela pagaria com seu corpinho nas mãos do caminhoneiro. Poderiam comê-la, pois ela era Safadinha (sem ser Bruninha), mas ela não comeria mais nenhum bichinho, que é tão fofinho. Ela não era mais da mamãe. Nem da biológica, nem da telúrica. Era da Supernatura.

Por que cismou que a morte da planta é menor que a do bicho? Quem lhe garantiu que planta não sente?

Sente sim! Piriripimpim! Notou o Micro bufão e chinfrim.

– E ademais, falou o Micro sagaz, As duas mortes já estão com ela. No seu rímel, no seu perfume, no seu sapato e noutros quetais. Quetais?!

E a magrela, falou o Micro Requenguela, é insolente, pois se acha melhor que a gente.

O estranho é que aquela cabeça, donde nada saía, firmou pé na resolução e nada comia, e emagreceu, e definhou, e quase morreu, enquanto pensava no animal que salvava. Aliás, pensou (para espanto geral) salvei um, dois, três salamê mínguê. Salvou, talvez, uma salva. Mas isto não pensou, porque ela não sabia que “salva” era coletivo, o qual MODUS OPERANDI, ELEMENTO, não era só o “busão”.

Tornaram a lhe perguntar: quem lhe dissera que a plantinha não sente dodói quando é arrancada, triturada, refogada, assada e comida? Bobinha... Amanhã mesmo, em Harvard, Princeton, Yale e na Faculdade que não gosta de vestidinho curtinho, um sábio dirá que: Sim! Sente, sim! PIRiripim... (foi bom ter-lhe olhado com a cara feia).

No caminho leitoso da Galáxia, instaurou-se RIGOROSO INQUÉRITO para descobrir o que pretendia A ELEMENTO LULUZINHA. Trovões de Zeus cortaram os Céus e as peles zimbelinas; e o balacobaco chegou de vez...

- Oui, oui, disse o Micro francês.

E naquela algazarra pós-incipiente e pré-deprimente; naquele caleidoscópio com jeitão de Falópio, o burburinho do “little Joe”, ou “Zé Povinho”, foi calado pelo ilustre Micro Filósofo, que ordenou:

— Pulemos, para a próxima sub-partícula!

O Pseudomicro Pseudopoeta atendeu-lhe enquanto chupava uma bala toffee.

Continuou o Micro Filósofo:

— Companheiros e Companheiras (antes da Presidenta, vou tomar a saideira) Micros e Bac. (Hã? Bac? Bacteriazinhas patricinhas) nada tem de suave esse momento tão grave. Estalou os olhos e disse PERGUNTO: quem fez o transunto? (hã?). PERGUNTO: Lulu tem boa intenção ao massacrar uma forma de vida em beneficio de outra? Será? Ou não? Será apenas comodismo, ou modismo, ou avançado estudo do simbolismo russo?

HÃ?

— Ou estará brincando de ser pobre? Sempre à beira do abismo?

— Pero, poco importa, disse o mano HERMANO, és todo lo mismo!

— O diabo (Ave Maria, cruz credo), falou o Micro Filósofo que não acreditava em Deus; (e no Diabo, só depois de conhecer a terra do Tiago); é que ela deixará de alimentar milhões, bilhões, trilhões de nano-animais quando chegar a hora de seu abate.

— SIM! Piriripimpim! Disse o Micro Bufão (e chato). Onde terá ficado a carne que deveria ser dela e nossa?

— Não sei, retrucou o Micro Sagaz.

— Não, não sabe, resmungou o Micro Requenguela, mirando o “buraco negro” de sua panela.

E volta o Micro Filósofo dos Micros Poderes de Foucault:

— É certo que não temos o garbo de um boi pardo.

— Mas bicho é “gente humana”, falou a Bac cigana.

— Somos bichos também, gemeu o Micro Ghost do Além.

— Até Camões já nos citou, disse o Micro Letrado no Pelô.

— Não temos culpa de sermos como somos (isso amiga! Tenha atitude!)

A palavra volta ao Micro Sagaz:

— Por mim tanto faz! Mas se pudesse eu lhe diria: não há Lulu, como sair dessa Roda que a Natureza cria. A minha morte (malditos antibióticos) manter-te-á viva.

— Manter-te-á? Oh! Que lindo! Urrou a turma do “vamos indo”.

— Mas a tua morte, retornou o Sagaz, alimentaria trilhões de pequenos animaizitos. Aliás, tais animaizitos são teus ancestrais, como bem dizem os cabedais.

Retornou o Filósofo que era mais que o Sagaz, embora isso lhe custasse a paz:

— Não te importe só com a altura do decote. Veja Pequena Soraia (ouvira isso de um apresentador de programa policial, mas como era Filósofo de Lei, só assistia escondido na TV do Warley).

— Hã, hã! Fez-se silêncio para a fala do Micro Sábio, do astrolábio e do alfarrábio:

— Não te importes se somos microscópicos. Existimos. Mormente nos Trópicos. Cuide de nós. De todos nós. Isso sim!

— SIM! SIM! PIRIRIPIMPIM! (chega, cale-se!).

— Não suporte, pequena Soraia Sereia (caraca, isso é cristal na veia), que os bípedes nos maltratem. Prenda o “Bípede Domador” na jaula; faça o “Bípede Latifundiário” refazer o pré-primário; ordene que o “Bípede Torturador dos Rodeios” vá para a Escola dos Sacos Cheios. Faça o “Bípede Caçador” endoidecer da caraminhola de tanto cheirar cola. E faça que todos os outros “Bípedes Covardes” puxem carroças pelas manhãs e pelas tardes.

— Como assim? Falou Luluzinha Pequena Soraia.

—Burra! Quando você mata e come um bicho, só está seguindo o que a Natureza te obriga a fazer. Outros bichos farão o mesmo contigo. Tal como eles, você não está além da Natura.

—Como assim?

—Estúpida e Patética (eles acham que patética é sinônimo de deplorável, ah, ah, ah, não ria, isso é sério). Você já viu os Leões obrigarem os Cervos a serem servos? Já os viu combinando uma tortura institucionalizada chamada “Rodeio” ou “Farra do Boi”? Já viu a lagartixa, o besouro e os outros vermes que comerão teu corpo, torturar antes as suas refeições? Você já viu um pobre animal obrigar um “Bípede” a saltar entre arcos de fogo? Dizer-lhe que o montará (opa!)?

— Como assim? Insistiu a pequena Soraia-Lulu

—Faça "Serzinho Inteligente", que a Vida e a Morte do irmão- bicho seja de tal sorte que ele desfrute da Primeira e seja respeitado na Segunda. Que sua dor seja leve e sua agonia seja breve. Mas ao comer a carne do irmão-bicho não se ache atroz. Nem superior se não o fizer; pois tu, eu e o irmão-bicho somos da mesma matéria e escravos de uma mãe comum. Nossas vidas se alimentam de nossas mortes. Até as das irmãs-plantas. É a Mandala da Natureza. Nós somos a Natureza! Aceite-a, você não está acima dela. Alimente-se sem hipocrisia, pois a Vida não tem hierarquia. Só nós é que temos essa mania. Também há morte em cada prato de Alface mandado para o Sumano...

— Humano?
—Não! Esquece.

—De morte se faz a comida. Quer vegetal, quer animal. Todos morreram para te alimentar. Não se furte da nobre missão de saber que leva no teu corpo o alimento para milhões de animais que só esperam a tua hora. E lembre-se que nem por isso eles te maltratarão, torturarão, escravizarão e usarão para compensar suas pequenas medidas...

—Quais medidas?
—Preciso dizer?

Não se furte de transportar a energia das vidas que acabaram para preservar a tua. Toda morte só se justifica no seu oposto. Repasse a Vida. Todas as vidas.

—Como assim?

CRÔNICA DISTINGUIDA COM "MENÇÃO HONROSA" COM XV CONCURSO INTERNACIONAL DE LITERATURA DA ALPAS XXI - PORTO ALEGRE RS. 30/04/2011



Em defesa do bem estar animal.


Nota Legal - Texto ficcional, qualquer semelhança com fatos ou com pessoas será mera coincidência.

Quente

Calor das monções,
das últimas sessões,
dos último serões
e dos eternos senões.

Nada brota da caneta,
como se vazia paleta
de inútil madrugada
pintasse a terra ressecada.

Não há verso nascido,
só um tiro e o estampido
da morte sem alarido.

Calíope está muda,
distante como o colibri
que às vezes pousava aqui.

quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Branca Lua

Uma Lua insistente,
dessas que comovem a gente,
branqueia ruas impensadas
que relutam ser águas passadas.

Mas são passados águas e tempo,
nessa mandala que percorro
em busca de divino socorro,
ou só o de algum Santo
a quem nunca pedi tanto.

Tudo em vão branca Lua
de noites não pensadas.
O verbo está no Passado,
o Santo é de mau-olhado
e o socorro divino
ficou no meu tempo de menino.

Hoje, o escuro que me espreita
é quem comigo se deita
nessa cama desfeita
e que só de não, se enfeita.

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Ana Poema

Os negros olhos de Ana
desvendam os enigmas
e acendem outras luzes
nesse Oceano de cruzes.

Ana Terena,
Ana Poema.

Versos de Ana,
rude e lirico verbo
que traça as cicatrizes
de todos os deslizes.

Paixão e drama,
desejo e chama,
nos ecos murmurados
dos orgamos sussurrados.

sábado, 22 de janeiro de 2011

Verão ao fim

Não floriram as quaresmeiras esse ano,
nem sorriram as velhas mulheres
em aviso de dano.
Vai se findando o Verão
como se passasse
sem que o sentissimos.
Talvez seja o "Aquecimento Global"
ou algum outro mal.
O Mundo ainda gira,
mas se antes era grande
e longe,
ficou perto
e breve,
como inusitada neve.
E já quase não se vê
o que foi feito da Vida
e da quaresmeira florida.

quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Quadros

No quadro de fotos,
o homem colou pedaços
de como a vida deveria ser:
ali, um casamento;
lá, um passeio;
acolá, um jardim de Paris...
É bom ver suas felicidades
taparem suas realidades.

Também queria quadro igual.
Bons momentos
sobre meus tormentos.
Doces leviandades
sobre minhas verdades.

Trocar esse vazio
pelas estrelas do meu Rio.
Riscar as megeras
e arriscar as quimeras...

Alguma fotografia
que outro Fabio consolaria...

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Recomeços

São eternos os recomeços
em teu sorriso que amanheço.
E porque em ti a luz se perpetua,
sabe-se que a claridade é tua.

Se mais nada prevejo,
em ti eu vejo
que a vida é mais que um lampejo.

Sei-te a mulher
que a vida mostra,
qual flor que se posta
em desusada serenata
que o dia não resgata,
mas que a noite retrata.

Sei-te a última
a vagar em minha vida.
A sempre pretendida
e só agora colhida.

sábado, 15 de janeiro de 2011

Nós

Tudo somos nós.
Desertamos da primeira pessoa,
pois o sino já ressoa
anunciando que todo conjugar
será plural em cada amar.

E, então, como somos dois,
deixemos o medo para depois.
Caminhemos o velho jardim,
entulhado de sim.

Tudo somos nós.
E secretos nós
prendamos a vida
com corda estendida.

Equilibremo-nos no arame
até que nova paixão nos chame,
ou a vida nos derrame.

                    Para a poetiza Susan. Com carinho.

terça-feira, 11 de janeiro de 2011

Cantar

Canta-se o que há de vir.
Canta-se o perpétuo Devir,
o mistico existir,
o contínuo fluir
e o eterno parir
da Gaia materna
em cada eco de caverna.

Talvez a Esperança de Pandora
preceda a Aurora
e não chegue em má hora,
pois entre o sonho encerrado
e o novo salto tentado
vive-se o momento
em que cessa o lamento.

Canta-se um Futuro,
canta-se o fim de um escuro
e a queda de outro muro.

Canta-se por ser humano,
porque haverá novo ano
e existirá outro plano.
Canta-se pelo fim sabido,
pois dele, novo ramo terá surgido
antes que o velho seja esquecido.

segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

Três Horas

Três horas e minuto e meio.
Perdi o sono, algum devaneio
e o Poema não veio.
Sei-me saudoso de alguém,
mas não sei de quem.

Seria bom, talvez,
um horoscopo chinês,
alguma sensatez
e alguém que ouvisse
meu rosário de tolice.

Fumo outro cigarro
nesse tempo bizarro.
A roda da noite parece emperrada,
pois a ausência de tudo e de nada
é só o que recheia essa madrugada.

O ponteiro inerte
apenas reflete
o verso sumido
e o Canto desaparecido.
E ainda são três, no relógio espremido.

O costumeiro Dienpax
não me trouxe a "romana pax".
Tento um escrito notório,
Mas só consigo a mesmice de Cartório.

Combate inglório
do pseudo poeta finório.
As três da matina,
nada se aproxima.
Quero subornar o sono,
mas outrem já se lhe diz o dono.

domingo, 9 de janeiro de 2011

Soldado Criança

Espectro diluído
de corpo dissolvido.
Morto insepulto,
desfila em Maputo*.

Jovem mal amado,
guri bem armado
matou sem vacilo
o que lhe foi empecilho.

Joana não lhe foi é a única Heroína.
Roubou-lhe a cena a nova Cocaína.
Mas essa é fina iguaria para poucos
e não para o seu rebanho de loucos.
Esses ficam com o Crack,
despojo do último saque.

Soldado criança perambula.
Um tiro o cessará,
mas a miséria ficará.

* Nome aleatório, sem correlação geográfica.

sábado, 8 de janeiro de 2011

O Cachê

Marshall Macluhan, sociólogo canadense, cunhou, entre outras, duas expressões que ganharam o Mundo e acabaram sendo tidas e havidas como verdades absolutas. O primeiro neologismo foi: “Aldeia Global” e o segundo: “os 15 minutos de fama que todos terão”. Quanto à primeira expressão, a chegada e a consolidação da Internet não deixa dúvida de seu acerto. Em relação ao segundo conceito, sente-se que cada vez mais rápido ele também se aproxima de ser uma verdade indiscutível. A própria Internet, aliás, proporciona essa “fama” como bem demonstram os “Website” de ex-anônimos que mesmo não tendo qualquer talento que os diferencie dos demais, conseguem uma imensa legião de seguidores que nem sabem o porquê lhe acompanham.

Puristas, ou só insolentes, dirão que tais figuras e seus seguidores são desqualificados por lhes faltar estudo e cultura. Porém, aqueles despidos de preconceitos já começam a notar que os “15 minutos de fama” vão se imiscuindo por todas as classes sócio-econômicas e é aqui que entra o objeto de nossas reflexões nesse texto. Enquanto tal “fama” fica entre os classificados como “inferiores”, o prejuízo que podem causar é pequeno, se pequeno for considerado o desserviço à Cultura. De todo modo, não se corre risco de morte pelo fato deles existirem. O problema cresce quando Classes Profissionais cujo erro ou acerto redundam em saúde, doença ou morte sujeitam-se a esse esquema. Têm-se, então, os seguintes fatos:

1º Fato – busca-se a “Fama” ao custo de qualquer preço. E se tal busca é questionada ou criticada, a resposta padrão é: não estou nem aí. Ganhei meu cachê. Saque rápido, como os dos antigos “cowboys”. E por ser rápido e de “cowboys” quase sempre é desprovido de qualquer valor intelectual, lógico ou ético. Pouco importa. Estou ganhando?

2º Fato – ganhando o quê? E a troco de quê? O que há de tão interessante em receber um reles cachê?

3º Fato – o que acontece com a auréola de respeitabilidade que certas profissões exigem? Onde ficou a dignidade cerimoniosa de “doutores”? Alguns dirão que tais “dignidades e cerimônias” são valores caducos. Outros, com mais discernimento, dirão que não, pois ao se procurar alguém para solucionar um problema que lhe aflige o doente não busca alguém como ele, mas sim alguém que lhe seja “superior” e o livre de seu mal. Ou não? Quando me doem os dentes, procurarei outro Fabio qualquer, ou buscarei um “Doutor” Dentista? Penso que é desnecessário responder.

4º Fato – novos cursos, forjando novos e muitos “Doutores”, acirraram a concorrência de tal maneira que desprezar valores passou a ser uma necessidade? Talvez. E um triste exemplo disso é o que se vê em anúncios publicitários, como o descrito na seqüência:

“... filmado de costas, enquanto um locutor canta as virtudes de um produto, um senhor de seus 30 anos, cujo nome e número de registro profissional aparecem na legenda, vira-se com a boca cheia e tenta expressar alguma coisa. Mas de sua feição e de toda cena, só se apreende que ele é péssimo ator; e que, talvez, também não seja um prócere em sua profissão, pois se fosse não se permitiria a esse papel. Mas ele, diga-se, não está só nessa enxurrada. Vários outros a isso também se prestam, modificando-se apenas cenários e produtos.

Porém como sou apenas um humilde escrevinhador, sem competência para longas, profundas e corretas apreciações sociológicas, antropológicas, econômicas etc. não devo alongar-me nesse terreno pantanoso. O diabo é que sinto medo, pois em momentos de maior fragilidade – quando adoeço – eu corro o risco de ser (mal) tratado por atores canastrões e profissionais de baixa qualidade. Outros sentirão? Quase certo que sim. Pagamos a conta dos efeitos colaterais do acerto de Macluhan. 



sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

Vazio

Na beira do edificio
o passarinho desdenha a queda.
Não lhe existe o vazio.

Reina no meu impossível,
reduzindo o quê me pensei
e fazendo o que eu só sonhei.

Desliza caminhos
em espaços só seus.
Passeia sua independência
e cala minha insolência.

Preso ao chão
rastejo multidão.
Longe do Rei,
que um dia me achei.

quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Rude

Dura verdade crua,
dura face nua
que sempre se mostra
como vontade oposta.

Desenha a caneta,
outra calva careta.
Fez-se a russa roleta
da morte na sargeta.

Choro por instinto.
Bacante suco tinto
que confunde o que sinto.
Vida que minto,
pois me sei extinto
em porre de absinto.

Chamaram-no as Parcas.
Em baús e arcas
guardaram o pouco que viveu.
Resta-nos esse breu.
                  

                                     Para Wesley, que hoje faria seis anos.

terça-feira, 4 de janeiro de 2011

Água

Na morna banheria
revejo uma vida inteira.
Desde o primeiro começo,
até o último tropeço.

A água morna
é bálsamo que adorna;
lava minha dor
e afasta o conhecido terror.

Mas lhe falta uma Serena Sereia,
cujo canto tudo incendeia
como se fosse paixão e meia.

Agora sei, é tempo doutro Mar,
de outro ir e vir
e de inútil prosseguir.

Tempo de olvidar o homem havido,
seu queixume indevido
e seu desejo indeferido.

Tempo de esquecer
a dura e fria verdade
do amor já não ser uma possibilidade

domingo, 2 de janeiro de 2011

Assim é...

Vejo a estranha forma
em que a fumaça se transforma.
Assopro cinza
na patrulha ranzinza.

-Isto haverá de te matar...
-Apenas isso? Todo resto não pode me findar?

Como seria a solidão sem ele?
Dizem-me que ela é, só por ele.
Que todo resto nem pensaria em me deixar.

Simplórios pensamentos
de simplório sargentos.
A vida lhes é rotina.
Previsível rotina,
até como termina.
Creem na televisão,
ou noutro charlatão.
São retilíneos obedientes
de planos dementes,
como vacas enfileiradas
prestes a serem assassinadas.
Comerão sua carne
no churrasco de sempre.
Também comerão outro corpo eunuco,
no Templo de um Guru maluco.

Assim vivem
os esteios da sociedade
e títeres da sobriedade.
Dormem às vezes, após o frio sexo.
E acordam novo dia sem nexo.

Assim vivem
os expoentes sociais,
os considerados normais...

Dormem, acordam.
Acordam, trabalham
e dormem sem sonhos.

É pouco o que tem do Mundo,
e que ocupam no Espaço.
Do Tempo nada tem,
pois vendem-no ao relógio
até que lhes chegue o necrológio.

Dizem bravatas por futebol,
masturbam-se por revistas
e enquanto sonham com carros,
planejam a troca do assoalho
e gargalham pelo baralho.

Assim vivem.
Talvez gostem...

sábado, 1 de janeiro de 2011

Vinho

Amores que retornam
são vinhos que entornam
na rotina das mesas postas.

Amores de antes,
já quase esquecidos,
são convivas atrevidos
em jantares repetidos.

Saudade de um bem,
memória de alguém.
Coloco mais um prato
para o rosto do retrato.

Lágrimas derramadas
em toalhas maculadas.
Sirvo-me de lembrança
e duma fatia de esperança.