QUINE, Willard Van Orman
1908 – 2000
A Linguagem é uma Arte Social.
1
– A Linguagem só tem significado para nós (ie, só significa, representa
efetivamente uma coisa)
2
– porque estamos habituados com a maneira com que ela é usada pelos outros.
3
– E Não
porque exista uma ligação* entre os Signos (as palavras e outros sinais, como
a vírgula, o de adição etc.)
e as “Coisas” que eles significam, ou
representam.
4
– Por isso é que a Linguagem só é significativa quando usada socialmente.
NOTA
do AUTOR* – observe-se que essa concepção já fora cunhada
por Ferdinand Saussure. Veja o Ensaio dedicado ao mesmo.
Nascido
nos EUA, em 1908, QUINE estudou em Harvard com Alfred North Whitehead, o célebre Filósofo da Lógica e da
Matemática, e conheceu o inglês Bertrand
Russell que se tornou um referencial para seu Ideário.
Em
1932 completou seu Doutorado e viajou pela Europa onde aumentou seu rol de
conhecimentos com vários intelectuais importantes, dentre os quais os que
compunham o renomado “Círculo de Viena”.
Ao
retornar, iniciou sua carreira de Professor na mesma Harvard, mas sua
trajetória foi interrompida pela deflagração da 2ª Guerra Mundial, da qual ele
participou na retaguarda, decifrando códigos e mensagens dos inimigos para a
Marinha estadunidense.
Apaixonado
pelas viagens orgulhava-se mais por ter conhecido 118 países do que pelos
inúmeros Prêmios, Comendas, Menções honrosas e Láureas que lhes foram
concedidas em razão da excelência de seu trabalho. Como justas homenagens à sua
importante contribuição ao Pensamento atual.
Após
a beligerância, em 1956, QUINE voltou a ser Professor em Harvard e lá lecionou
até falecer em 2000, aos 92 anos. Deixou um apreciável legado intelectual e
inúmeros textos, dos quais pinçamos as obras abaixo, que são consideradas obras chaves de sua Filosofia:
- Métodos de Lógica, de 1952.
- De um Ponto de Vista Lógico, de
1953.
- Palavra e Objeto, de 1960.
- A Busca pela Verdade, de 1990.
A
dissociação entre a Palavra e a respectiva Coisa, como já se viu, foi proposta por
Saussure e encontrou em QUINE um ardoroso
defensor. Coube-lhe, inclusive, a tarefa de aprofundar tal dissociação acrescentando
peremptoriamente que nenhuma Palavra tem
um significado fixo, tampouco exclusivo ou único.
NOTA
do AUTOR – principalmente em um idioma como o Português que
é essencialmente polissêmico.
Para
ilustrar essa afirmativa citou o caso da palavra “Coelho” que, conforme a situação pode significar:
- Alimento
- Praga para a Lavoura
- Cobaia para experiências
científicas
- Bicho de estimação
- Etc.
Algumas
Correntes Filosóficas, principalmente as mais Antigas e as que na Atualidade
prendem-se excessivamente às tradições, afirmam existir uma Ligação Direta entre a Palavra e a Coisa
que ela representa, ou que significa.
Como
outros Pensadores, QUINE discordou vigorosamente dessa tese, pois a seu ver “A Linguagem Não trata da relação
entre Objetos e Significados Verbais”, mas, ao contrário, cuida sim da
correção de se saber “o que dizer” e “quando dizer”. Ou seja, a Ciência da Linguagem estuda “o que deve ser dito e quando isso deve
acontecer”. Estuda, pois, o acerto (ou o erro), a propriedade, daquilo que
se fala em determinado momento.
Voltando
ao exemplo do “Coelho”, observamos
que a Linguagem é a investigação sobre o acerto de se dizer que o “animal significa um alimento” quando o
momento for adequado; e não no
instante em que o bicho está sendo acariciado pela criança que o considera seu
amigo, seu animal de estimação.
Embora esse cuidado pareça óbvio, pois é razoavelmente
observado no dia a dia, a questão se
torna mais complicada quando são aumentadas as dimensões dos discursos. Não são
raros os casos em que uma palavra dita no momento errado levou a conflitos, ou
que fomentou erros de julgamentos que, no mínimo, impediram um Conhecimento
mais verdadeiro e útil. São esses os casos que QUINE tinha em mente quando
advogou sua tese, haja vista que compete a essa maravilhosa habilidade humana
evitar ou corrigir os erros que a ignorância, vinda do silêncio, pode induzir.
Em
seu Ensaio “A Relatividade Ontológica”,
de 1968, ele afirma que a Linguagem é uma “Arte
Social” não só por permitir que
os Significados sejam conhecidos, mas, também e talvez principalmente, por ter
essa capacidade de conciliar o Discurso com a Situação, evitando adversidades e
preservando a harmonia entre o Grupo Social.
Sobre
essa questão, QUINE sugere uma experiência simples, mas que ilustra com rigor
seu pensamento:
Imagine
que nos sentamos junto de algumas pessoas nativas doutro país e que falam um
idioma que nos é desconhecido. De repente, uma Coelho surge e um dos nativos
grita “gaigai”. Primeiramente
imaginamos que pode haver alguma conexão entre o acontecimento – o surgimento
do animal e o grito do nativo – mas com o tempo notamos que toda vez que um
Coelho aparece, o mesmo grito é emitido e então concluímos que o termo “gaigai” é a tradução para o nosso
“Coelho”.
Porém,
segundo QUINE, essa nossa conclusão é equivocada, pois “gaigai” pode significar outra coisa, como, por exemplo, “o jantar chegou”. Ou “oh, que bicho bonito” etc.
Assim,
para se descobrir o real significado do termo “gaigai” será preciso tentar outro método. Pode-se, por exemplo,
apontar para outros belos animais e perguntar aos nativos se eles também são
chamados de “gaigai”. Idem para
outros jantares etc. Verificar com os mesmos se aquele termo é a tradução para “coelho”, ou “belo animal”, ou “suculento jantar” etc.
Porém,
ainda restariam dúvidas sobre essa tradução. Afinal, o termo “gaigai” poderia significar “o conjunto de partes que formam um coelho”,
por exemplo. Ou poderia até ser um grito ritual a ser exclamado todas as vezes
que um coelho é avistado. Ou, uma oração ao “Deus
Coelho”.
O
número de alternativas é vasto e dá a medida da complexidade existente entre a
Palavra e o Objeto. Desse fato, resulta a impossibilidade de se fazer a Ligação Direta entre os dois elementos
como pregavam as antigas Correntes Filosóficas.
A Indeterminação da Tradução
Considerando-se
então toda essa complexidade e para tentar decifrar definitivamente o
significado do hipotético termo “gaigai”
restaria a alternativa de se estudar denodadamente todo o Idioma daqueles
nativos. Porém, isso só multiplicaria o problema, já que não podemos ter
certeza de que as outras palavras que usamos para chegar a tal significado
sejam elas próprias, traduções corretas.
Foi a esse impasse que QUINE deu o nome de Indeterminação
da Tradução. E avançou seus estudos ao apontar as incômodas consequências
que dela provém. Dentre essas, a mais importante, segundo ele, é a
reconfirmação de que “As Palavras não tem
Significado”. Ou, no mínimo, que Não
tem significado autônomo, independente do contexto em que é utilizada.
O
sentido de uma pessoa dizer “gaigai”,
ou dizer “coelho” e o fato dessa
Palavra ter algum significado Não
advém de uma Ligação Natural (ainda
que misteriosa) entre o Objeto e o Termo que o representa. Entre a Coisa e o
seu Nome*. Essa Significância e esse
Sentido só existem porque aprendemos a participar da Linguagem e a vê-la como
uma Arte
(embora não nos demos conta disso, classificando-a como se fosse uma atividade corriqueira) que propicia o Convívio Social.
NOTA
do AUTOR – citamos no parágrafo anterior a relação entre a Coisa
e o seu *Nome. No principio da Idade
Média existiu uma Corrente Filosófica que arrebanhou grande importância por
suas reflexões sobre a questão do NOMINALISMO.
Ou seja, se o Nome teria uma
existência independente, ou se a de um mero símbolo. Aqui não nos alongaremos
nesse tópico, também chamado de “Querela
dos Universais”, mas recomendamos aos interessados que consultem a obra de
nossa autoria “Filosofia Sem Mistérios”,
publicada pela Editora Seven System e disponível para venda em nossos Blogs ou
Site.
Até
aqui nos referimos à Linguagem como se ela fosse uma exclusividade da espécie
Humana, mas as Ciências atuais já reconhecem essa habilidade noutras espécies
também. É claro que por desconhecer suas características, sua abrangência, sua
utilização etc. não se pode traçar um paralelo com a dos Humanos, porém o
simples fato de existir entre outros Seres, que também formam suas sociedades,
indica que a sua importância transcende ao Mundo dos Homens e a faz ser o
cimento que une os ajuntamentos de indivíduos.
Observando-se,
pois, que a Linguagem desempenha papel de tamanha relevância para todas as Sociedades
– humanas ou não – nunca será demasiado exaltar a contribuição do Filósofo
QUINE ao Pensamento Ocidental. E, particularmente, por ter rompido os grilhões
que davam a cada termo um único e pobre significado. Ao expandir esses significados
e vinculá-los às circunstâncias, o Pensador reconheceu paralelamente as
mutações que o próprio Homem sofre em sua escalada rumo ao aperfeiçoamento de
sua face social.
A linguagem é uma convenção, seguramente,
ResponderExcluirMas é um dos maiores sortilégios da racionalidade
Sempre interessantes tuas partilhas
Abraço