BENJAMIM, Walter
1892 – 1940
Unicamente
conhece o Ser Humano aquele que o ama sem esperança.
Filiado ao grupo de Pensadores Neo Marxistas que integrava
a “Escola de Frankfurt”, BENJAMIN
compartilhava a Ideia de se explorar a importância da “Cultura de Massa” e da
Comunicação, bem como as técnicas do Cinema e da Literatura, no sentido de
usá-las como ferramenta de resgate dos Valores que foram tirados do Homem ao
longo da História. Suas ácidas criticas contra a Escrita podem sugerir certa
contradição com o seu desejo de explorar a Comunicação de Massa, mas o que o
Sábio propunha era utilizar “as armas
inimigas” para combater o mal que elas promovem. É nesse sentido que seu
Pensamento deve ser compreendido.
Usando, pois, tal ferramental em seu Ensaio “Rua de Mão Única” (escrito em 1926
com altas doses de um lirismo que reascendia ao antigo Romantismo) BENJAMIN ousou um experimento de construção
literária que se tornou célebre pela elegância no estilo e pela arguta
profundidade com que ele descreveu um conjunto de observações - intelectuais e
empíricas; ou seja, teóricas e práticas – que lhe ocorrem num imaginado passeio
por uma rua qualquer.
NOTA do AUTOR – Posteriormente, em 1955, o também
filósofo GUY DEBORD (1931 – 1994, França. Havido como o Ideólogo dos Movimentos
de Maio de 1968) retomou o argumento e criou a chamada “Psicogeografia” que
estuda os efeitos da Geografia sobre as emoções e sobre o comportamento do
indivíduo.
No Ensaio, BENJAMIN não se propôs a criar uma grande
Teoria. Quis apenas surpreender ao público com simples ideias. Tal qual podemos
ser surpreendidos por algo corriqueiro, ou extraordinário, que atrai nossa
atenção durante um despretensioso passeio. Por isso, no final do texto ele
afirma que “as citações em meu trabalho
são como salteadores no caminho que irrompem armados e roubam do passeador a
convicção”.
NOTA do AUTOR – Com efeito, não é raro acontecer
de Ideias que nos chegam fortuitamente fazerem-nos mudar o modo de ver
determinada questão. E se tal acontece, segundo o Filósofo, o motivo está no
fato de que “a construção da vida está muito mais (ligada ao) no poder dos
Fatos, do que no poder das convicções”;
ou seja, acontecimentos aleatórios são mais poderosos para formatarem as nossas
vidas que as convenções que possamos ter. Afinal, quantas e quantas vezes somos
obrigados a mudar o nosso sentimento e o nosso pensamento sobre alguma questão
em razão de um fato, de uma circunstância que o Mundo nos coloca.
Mesmo porque, as
convicções que temos, geralmente são fabricadas por Outros e nos são impostas
pelos mais diversos métodos. Essa sua origem, aliás, é o que as torna frágeis,
haja vista que não são criadas originalmente por nossas concepções e
sentimentos e sua superficialidade não consegue resistir aos impactos que venha
a sofrer das vicissitudes da Vida.
Iluminando o
Amor
Voltando ao Ensaio, vale destacar a Ideia que aparece
na metade do mesmo. Com o subtítulo “Lâmpada de Arco”, BENJAMIN conta a sua
reflexão acerca do fato de que “o único
meio de amar um Ser Humano é amá-lo sem esperança”. Saboreia-se a beleza
poética da sentença, mas fica-se com a dúvida sobre o que ele quis dizer
realmente? Como ele nada mais acrescenta somos forçados a imaginar o que o
Pensador quis falar com a frase. Será que o Conhecimento surge do amor (e por isso amar-lhe
não obstante sua limitação);
ou que é apenas quando deixamos de esperar algum resultado que podemos ver com
clareza o Ser amado?
É claro que a resposta é individual, subjetiva e
tudo que nos resta é prosseguir ao lado de BENJAMIN sentindo o brilho da luz
que existe nesses pensamentos aleatórios que nos assaltam enquanto divagamos.
O lirismo que reveste o Pensamento de Walter, como
se viu acima, talvez explique o fascínio que ele desperta. Principalmente,
óbvio, nas almas mais propensas e capazes de enxergar a vida sob outros prismas
que ultrapassam os estreitos limites do Materialismo Lógico.
Porém, também nos terrenos mais físicos, práticos,
concretos da Existência sua pena não deixa de brilhar e sua contribuição foi
assaz importante para o Pensamento Ocidental Contemporâneo, como veremos logo
após a breve biografia do mesmo, que exporemos na sequência.
Walter Benedix
Schonflies BENJAMIN nasceu em uma
rica família judia de comerciantes. Adolescente, integrou o agrupamento
socialista chamado de “Movimento da Juventude Alemã”, onde em 1915 conheceu o
Filósofo e Historiador Gerschom Gerhard
Scholem. Após estudar Filosofia na Universidade Freiburg Breisgau e ter se Doutorado na Universidade de Bern com a tese “O Conceito de Critica de Arte no Romantismo Alemão (que seria
publicada em vida)”, o Filósofo
lecionou e se casou.
Porém, com a ascensão do Nazismo e já abalado por
sérias dificuldades financeiras – que foram recorrentes em sua vida – exilou-se
na França a partir de 1935. Contudo, com a invasão alemã de Paris, em 1940,
teve que buscar asilo noutro País e juntou-se a um grupo que fugiria através
dos Montes Pirineus, donde seguiria para os EUA, onde seus admiradores lhe
conseguiram um visto de entrada. Porém, ao fim de uma penosa jornada, o grupo
foi detido pela Policia espanhola que lhe vedou a entrada na Espanha e ameaçou
entregar-lhes ao Governo colaboracionista francês, que automaticamente os remeteria
para a Gestapo. O Filósofo não resistiu à paúra e ao desespero e cometeu suicídio
ingerindo uma alta dose de morfina. No dia seguinte ao de sua morte, como por
ironia, a proibição de entrada na Espanha foi revogada e o grupo conseguiu
escapar das garras de Hitler.
Embora seja considerado um dos mais importantes
Pensadores da Contemporaneidade, BENJAMIN não obteve grande repercussão com
seus textos enquanto viveu, malgrado o prestigio de que já gozava entre a
Intelectualidade e ao estimulo sempre presente de Filósofos importantes como Ernest Bloch e T. W. Adorno, que, aliás, foi o responsável pela edição póstuma de
suas obras.
Seus escritos ficaram esparsos em Revistas e em
Periódicos e apenas três livros foram publicados em vida. Além daquele composto
por sua tese de Doutorado, foram levados ao público a tese em que ele tece
elogios ao “Estilo Barroco Alemão”,
chamada de “Origem da Tragédia Alemã”
e um livro de Ensaios e Reflexões, o célebre “Rua de Mão Única”. Os dois últimos em 1928. Dentre seus outros
Ensaios, destacaram-se as “As Afinidades
Eletivas de Goethe”; “Sobre alguns temas de Baudelaire”; “Teses
sobre a Filosofia da História”; “Paris, capital do século XIX” e “A obra de Arte na Era da Reprodutibilidade
técnica”.
Adorno o considerava um Filósofo singular por ter
tentado fugir de todo Pensamento classificatório e que filosofava contra a
própria Filosofia. De fato, o Filósofo abordou temas que se situam foram dos
caminhos habituais da Filosofia Clássica, escrevendo sobre Literatura, Arte,
Vida Social etc. sem lhes dar qualquer matiz filosófico aparente, mas recheando
seus textos com rigorosos conceitos tirados da ortodoxia do Pensamento Superior.
Essa soma de assuntos tornou-o um Critico (enquanto observador e comentador) de
Ideias e Fatos que até hoje lhe rende a reputação de ser um dos mais importantes
Escritores dessa área.
O Ideário de BENJAMIN sofreu forte influência de
Marx e a revalorização atual que ambos experimentam indica a importância dos
mesmos em face das questões contemporâneas. A seguir destacaremos algumas das
Ideias do Filósofo acerca do processo que os Seres Humanos realizam quando
tomam posse da própria história. Processo que BENJAMIN chamou de “Experiência”:
O Livro Impresso
Para o Filósofo, o que sustenta e propiciou as mudanças
no formato, na estrutura da “Experiência
(ie,
do processo de se apossar da própria história”) é a transformação que existiu na maneira com que a
Comunicação passou a ser feita e que ocasionou uma separação entre o Indivíduo
e a sua História, a sua riqueza enquanto pessoa. Para que essa separação acontecesse,
contribuíram diversos fatores, dentre os quais o Desaparecimento da Narrativa Oral.
Esse é um processo antigo e que acompanha a Evolução
dos Meios de Produção (ie, o aperfeiçoamento das Máquinas, das Instalações
industriais etc.). A invenção da
Imprensa (ou
mais precisamente da Prensa, por Gutenberg [c.1398 – 1468, Alemanha], em c.
1439), proporcionou a
difusão do Livro Escrito, mas em contrapartida ocasionou o declínio da Narrativa
Oral.
Posteriormente, após colaborar decisivamente para
consolidar a Burguesia (enquanto Classe Econômica e segmento do Pensamento
tradicionalista, conservador, retrógrado)
e instituir e solidificar essa nova forma de Comunicação (a palavra
Escrita em substituição à palavra Falada)
a Informação
(ou
o Conhecimento, o Saber efêmero, raso generalizado pelas demais Classes) provoca a crise do próprio Livro Impresso, que
sofre a concorrência cada dia mais feroz do Cinema, da Televisão e doutras
formas de comunicação que se valem da imagem como substituta da palavra.
Vê-se, assim, que a posse que o Homem fazia de sua
História através da Oralidade,
passou a ser feita de modo mais claudicante através da Escrita, a qual, ao cabo, termina por se autodestruir e, consequentemente,
por destruir, ou pelo menos diminuir, a possibilidade do Ser Humano tornar-se
dono e Senhor de sua própria História, naquilo que ela tem de diferente da do
Outro. A popularização da narrativa através da Escrita, e a banalização da
mesma através da Imagem,
tornou todas as Histórias iguais, subtraindo do Individuo o que lhe era próprio.
O que deveria ser apenas seu.
O Trabalho
Artesanal
Complementando o item anterior, BENJAMIN aponta o Declínio do Trabalho Artesanal como
o outro fator decisivo para que o indivíduo seja privado de “sua Experiência” (o processo em que ele toma posse da própria
história); ou seja, do Direito de construir a sua vida
conforme as suas inclinações e objetivos.
Para o Filósofo, a extinção desse tipo de ocupação
impede que o sujeito alargue seus horizontes psíquicos com a consequente
atrofia de sua inteligência e capacidade de conduzir o próprio Destino. Tal
como as “meras partes” que ele
fabrica, e que irão montar um “Todo”,
ou um “Produto inteiro”, o Homem
também se reduz a uma simples “parte”,
perdendo a sua condição de “Ser Humano
Completo”.
Segundo BENJAMIN, ninguém mais tece, fia, faz um
vaso, uma panela etc. enquanto ouve uma historia. O “Trabalho Industrial” exige a totalidade de sua atenção, pois
qualquer descuido e a máquina que opera decepará um de seus membros, ou lhe
matará. Impede-lhe, pois, a divagação, a imaginação, a reflexão sobre o que
escuta e, conseguintemente, cerceia o seu crescimento intelectual, o qual lhe
garantiria ser uma “Pessoa Inteira” e
não só uma “parte”.
Em troca, esse mesmo “Estado de Atenção” provocado pelo “Trabalho Industrial” só lhe oferta um quadro composto pela rapidez
e fria objetividade da noticia pronta. A fria “noticia pronta” que não lhe permite qualquer interação com o fato.
Interação essa, que redundaria no aumento contínuo e
progressivo de suas “faculdades, ou capacidades
mentais”, as quais, contudo, por serem subutilizadas, ou completamente
inutilizadas – já que não são requeridas, pois “noticias prontas” dispensam reflexões – definham até o limite
máximo de ficarem apenas no patamar do instinto animal que lhe provê a
subsistência física.
Marx e BENJAMIN
Como já se disse, o Pensamento de BENJAMIN foi
vigorosamente influenciado pelo Ideário de Karl
Marx, o que fica bem visível no caminho que Walter desenha para analisar o
divórcio entre o Homem e o seu Trabalho. Todavia, o Filósofo discordou de seu
Guru a respeito da tese que sugere que a Evolução e o Progresso Técnico
proporcionarão a Libertação do Homem.
Nesse ponto, aliás, a visão de BENJAMIN era exatamente
o oposto, já que para ele, esse “Progresso Técnico” está diretamente associado
ao aprisionamento do Ser Humano às cadeias do Sistema que privilegia as Elites.
Está diretamente ligado à diminuição da Criatividade,
da Imaginação e do Sentimento de Perpetuidade que o Homem atribui a alguns
Valores (como,
por exemplo, à Justiça, à Bondade etc.),
já que embutido na noção de “Progresso
Técnico” está a concepção de Temporalidade, ie, do efêmero, passageiro, descartável,
substituível, relativo etc. A concepção da existência de um Tempo pavoroso,
infernal em que nunca é permitida a conclusão de nada que tenha sido iniciado. A “Linha de Produção” é uma engrenagem sem
fim.
Referências Simbólicas
Para BENJAMIN o objetivo da Imprensa é difundir
informações sobre fatos acontecidos através de uma Linguagem coloquial,
acessível, de fácil comprovação e seguida de explicações pertinentes ao assunto.
Essa “Linguagem
Informativa, Narrativa” construída através do trabalho mecanizado, herda do
mesmo a sua fria objetividade e o anseio irracional e incessante pelo novo,
pela novidade, já que ela é eminentemente efêmera, sem conteúdo que lhe garanta
qualquer sobrevivência. Sua única chance de existir é, pois, descobrir novos
fatos para relatar. Mas a noticia se torna obsoleta poucas horas após ter
nascido. No inicio da noite, as manchetes da manhã já perderam a validade.
Tornaram-se sem sentido. Sem qualquer valor. E com isso a “boca de fome insaciável” exige novas noticias, tornando infindável
esse Circulo Vicioso.
Nesse ponto se vê a similaridade desse Processo com
aquele que impossibilita o “Trabalho
Artesanal” na Contemporaneidade;
pois é precisamente o vicio e o equivoco daquele que configura essa forma de
Comunicação e a maneira com que o Homem se relaciona com ela. Tudo é tão
superficial e efêmero quanto a vivência do Ser Humano despido de sua História,
de suas idiossincrasias.
A “Informação”, por isso, deixa de ter a
mesma amplitude que tinha um episodio narrado. Enquanto ela não guarda nada de
mais Profundo ou Significativo para ser descoberto, a Narrativa permitia que
fosse interpretada conforme cada ouvinte, e que lhe fossem acrescidos símbolos
e referências que a faziam ser efetivamente incorporada à vida, à Experiência
de quem lhe escutava.
Segundo BENJAMIN, para que o indivíduo se posasse da
própria História (ie, dos rumos que trilhará e das atitudes que
tomará) – ou tenha a sua
Experiência – seria preciso que existisse um tipo de vida mais solidária,
comunitária, porém, a maneira de viver da Sociedade Capitalista*, com seu
rápido desenvolvimento tecnológico, vem destruindo qualquer tentativa nesse
sentido.
*NOTA do AUTOR – Atente-se para o fato de que à
época do Filósofo ainda existiam as Sociedades Socialistas, das quais restam
apenas umas poucas, cuja inexpressividade permite dizer que o Capitalismo reina
hegemônico.
Desapareceu, pois, o laço entre a Vida e a Palavra, que
era próprio da atividade artesanal. Findou a narrativa em que o Orador
transmitia uma Sabedoria em prol do Ouvinte que a absorvia e dela se apossava.
Com o fim de um modo de vida em que se compartilhava tempo, trabalho, sentimentos, vivências
etc. A inquietação, a insegurança, a angústia, a melancolia etc. que nos
afligem, não podem mais ser partilhadas (e nem reduzidas, justamente por isso)
e adquirem um caráter estritamente privado.
Nossa memória é invadida pelo “Tempo da Morte da Singularidade”; ou seja, pelo fim das nossas características individuais,
pessoais. Pelo fim de nossa individualidade. E pela quase impossibilidade de
fazer parte de uma Comunidade Simbólica (ie, aquela dotada dos símbolos que
a caracterizam como tal).
O Homem perdeu sua individualidade e sua condição de
membro de um Grupo Social e se tornou apenas um mero componente de determinado processo.
São Paulo, 02 de
Junho de 2012.
Bibliografia
Complementar:
1 – Artigo de Celina Fernandes
Gonçalves Bruniera – Site UOL.
2 – Enciclopédia Mirador
Internacional
3 – Leituras de Walter Benjamin –
Márcio Seligmann Silva – Organizador. Ed. FAPESP e Anna Blume, 1999.
O único texto de Benjamin que li foi "O Narrador" onde ele diz que depois da Primeira Guerra Mundial os homens voltaram mudos ( Oralidade ) . Perdemos aqueles dois tipos de narradores, o homem que finca-se no campo e tem muitas coisas para contar e o viajante que nas voltas que dá pelo mundo, retorna para contá-las. Os homens estavam mudos, oprimidos e conscientes de uma nova realidade. Nasce uma nova era. Ótimo artigo o teu. Beijos
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