MULHERES e a FILOSOFIA – A
Feminilidade e o Feminismo – Julia
Kristeva, Marta Naussbaum e Hèléne Cixoux, Ain Rand.
Há uma censura recorrente feita às
Antologias sobre Filosofia acerca da ausência das mulheres filósofas. De fato,
é uma ausência marcante, mas, como no caso presente, o motivo não vem de uma
eventual misoginia dos autores, mas de uma ausência do sexo feminino nessa
área.
Claro que não por lhes faltar inteligência
para desenvolver o tema, mas talvez um distanciamento pela aridez da matéria e
por imposição de um modelo machista de literatura que as distanciou das lides
filosóficas nos anos mais recentes, assim como na Antiguidade. Certamente que
os donos do Poder temiam que ao
avanço no estudo e no desenvolvimento do Pensamento Filosófico correspondesse à
indagação e o questionamento sobre o motivo de serem elas tratadas como Seres
secundários.
Felizmente esse obscuro hiato está
terminado e o que se vê é o desejável avanço de mulheres extremamente cultas e
inteligentes que não se furtam de militar nas hostes do Pensamento Superior e
de buscar a felicidade para O Homem,
independente do seu gênero.
Não cometeremos injustiça ao citarmos
Simone de Beauvoir como a iniciadora dessa escalada filosófica feminina. Autora
do importantíssimo “O Segundo Sexo”, de 1941, coube à Existencialista francesa
resgatar às mulheres a condição de agente do pensamento, que mentes obscuras
lhes surrupiaram desde os princípios dos tempos. A ela dedicamos um capítulo
especial em nosso trabalho e, aqui, renovamos nossa homenagem por sua inteligência,
cultura e arrojo.
No presente Ensaio destacaremos os
Pensamentos de quatro Pensadoras, cuja temática pode parecer repetitiva à
primeira vista, mas que quando olhada com mais cuidado revela toda uma gama de
pensamentos que extravasam em muito os assuntos que originariamente os
misóginos de todos os tempos poderiam esperar. Vale a pena conhecê-las.
AYN RAND – o OBJETIVISMO
1905 – 1982
Russa por nascimento e estadunidense por
opção desde 1926, a filosofa e escritora Ayn
Rand através de seu Romance “A Nascente”, de 1943, tornou célebre as
suas indagações filosóficas.
Pode-se, inclusive, dizer que foi de sua
autoria o “Sistema Filosófico”
chamado de “Objetivismo” onde ela contesta
a ideia de “dever moral”, (ou seja, de que o
Homem vive para promover o bem-estar do próximo; que sua existência só é
considerada moralmente correta se ele dedicar seu tempo e seus melhores
esforços para promover o progresso e a felicidade do outro) como a liga que permite a convivência em Sociedade e o
objetivo superior, ou filosófico, que todos devem buscar. Embora seja uma ideia
cara aos Cristãos (ama o próximo como a
ti mesmo) e a alguns Socialistas utópicos, a realidade demonstra
a distância que há entre esta utopia e a crua realidade do cotidiano. E é,
justamente esse realismo, que AIN utiliza para desenvolver o seu Sistema. Desse
modo, podemos resumir o OBJETIVISMO conforme as suas seguintes
afirmativas:
1º - o Objetivo Moral de cada um é atingir
a sua própria felicidade; e só não
se avança sobre Direitos alheios por temor às Leis, já que as punições interfeririam
na felicidade buscada.
2º - A Realidade, o Mundo Físico, existe
independente da Consciência do Homem;
e este tem contato direto com essa realidade através de seus Sentidos (tato, visão, audição,
paladar e olfato) e da Formação de Conceitos
oriundos da Lógica Dedutiva e Indutiva.
3º - Um Sistema Social que sempre deverá
ser buscado será o que premie a Propriedade, a Liberdade, o Respeito às Leis etc.,
o seja o Capitalismo (laissez-faire) com respeito aos Direitos do Homem.
4º - a função da Arte, no capitulo da
Estética, é transformar as Ideias Metafísicas e Abstratas em formas que sejam
reconhecíveis e inelegíveis.
Através de resumo, o leitor (a) viu que
grande parte de seu Pensamento encontra parentesco com afirmativas do Materialismo, do Pragmatismo, do Utilitarismo
e de outras formas que o Pensamento estadunidense geralmente assume. Alguns
eruditos, inclusive, negam-lhe qualquer originalidade por conta dessas semelhanças,
mas o fato é que ele os colocou em um Sistema fechado e próprio e tornou-se,
por isso, a justa autora do mesmo.
MARTA NAUSSBAUM
1947
Nova-iorquina, Marta ostenta o honroso
titulo de ERNST
FREUND DISTINGUISHED SERVICE PROFESSOR OF LAW AND ETHICS na Universidade de Chicago. Um justo reconhecimento pelo
seu apaixonado liberalismo e pelo alto rigor ético com que conduz suas
pesquisas sobre a Moral e a Ética na Grécia Clássica e o Ativismo Político.
Em 1986, Marta publicou sua obra mais
importante até o momento, a “Fragilidade
da Bondade”, a qual lhe deu celebridade nacional e internacional. Suas
outras pesquisas sobre a Filosofia Política e sobre a Ética renderam outras
inúmeras publicações que acrescentaram vigor ao reconhecimento que lhe é
prestado.
Suas atuações nas questões Feministas,
onde atua com grande viés liberal, também são aclamadas pela Critica e pelo
Público, particularmente por sua defesa serena, mas firme, da necessidade de
alterações radicais nas relações familiares, mormente nas existentes entre
homens e mulheres.
Todavia, a par das aclamações a que faz
jus, a filósofa encontra alguma resistência em setores sérios do Pensamento que
criticam a posição que lhe deram (ou que
ela se deu), de ser a “pioneira”
na união entre a Filosofia Clássica e o Ativismo e Engajamento Político, com o
qual se propôs a criar um novo padrão do que é “certo ou errado” em termos de comportamento, pensamento e ação. Um
“novo politicamente correto”. Talvez
mais erudito que o outro, mas tão tolo quanto.
Seus críticos atacam justamente essa
pretensão de estipular normas como se pudesse ter em si o completo
discernimento do que é virtuoso, ou não. E de buscar mudar o Mundo a todo
custo, fazendo desse desejo a desculpa para sua “arrogância” em determinar os caminhos a serem seguidos.
Nada, contudo, que apague o brilho de quem
produziu a quantidade e a qualidade das obras com que brindou a Cultura do
Mundo.
JULIA KRISTEVA
1941
Quem representa Deus no Feminismo de Hoje?
No século XVIII, mais precisamente em
1792, Mary Wollstonecraft, iniciou um sério debate sobre os papéis
que as mulheres estavam (e ainda estão) condicionadas a prestar na Sociedade.
Na ocasião o tema não teve grande apelo
popular e quase que houve um acomodamento na questão, por conta daqueles que
associaram as funções consideradas “femininas”
com supostas características físicas e emocionais da “mulher padrão”. Assim, não faltaram, por exemplo, as “enfermeiras” que o eram por conta da “natural inclinação feminina para cuidar do
próximo”. Ou “donas-de-casa” que,
assim realizavam o “atávico desejo
feminino de cuidar da toca, da caverna”. Várias outras sandices poderiam ser
citadas aqui, mas seria um desperdício de tempo. O fato é que, aparentemente e
por certo tempo, pensou-se resolvida a questão.
Porém, com o advento da 1ª Guerra e,
principalmente, com o da 2ª Guerra, essa falácia de “papéis naturais” soçobrou e voltaram a serem colocados em
evidência os legítimos anseios das mulheres de se realizarem profissionalmente
e pessoalmente, da maneira que melhor lhes aprouvesse. E essa nova bandeira foi
erguida pelo novo Feminismo que emergiu com vigor e aparentemente de forma
definitiva, ainda que surjam focos de dissidências e de resistências em algumas
Sociedades.
Contudo, mesmo naquelas onde a opressão à
mulher é mais incisiva e escandalosa, já se assiste algum progresso e certa
liberalização de costumes que seriam impensáveis há poucos anos atrás. As cenas
de mulheres vestindo véus e/ou burkas obrigatórias e disputando uma partida de
futebol, ou dirigindo um táxi ilustram bem esse momento. E talvez a perenidade
do Movimento.
Em 1949, Simone de Beauvoir
publicou “O Segundo Sexo” e a
erudição do texto, aliada à popularidade da Filósofa Existencialista, tornou-o
o livro basilar do Movimento Feminista que veio eclodir com maior magnitude nas
décadas de 1960 e 1970.
Nele, e talvez o mais importante, foi a
denúncia que fez a autora sobre o erro brutal de ter-se eleito um gênero, o
Masculino, como o padrão a ser seguido. Como o paradigma perfeito. E desse
equivoco ter-se avançado diretamente para o erro naturalmente sucessivo de se “conceder liberdade” apenas às mulheres
que adotassem o comportamento masculino.
Seguindo uma Linha de Pensamento que
apresenta algumas semelhanças com Beauvoir, na atualidade encontramos Julia Kristeva, cujo temor explícito é
que o Feminismo adote algum, ou todos os erros do Machismo, que Simone apontou.
Filósofa e Psicanalista, nascida na Bulgária,
Kristeva é frequentemente considerada uma das principais vozes do atual
Feminismo francês e, por extensão, Mundial. Contudo, e paradoxalmente, não são
poucos os que questionam se ela é, de fato, uma Pensadora Feminista. Ou qual é
o formato do seu feminismo.
Tal questionamento, em verdade, não deixa
de ser alimentado pela própria Julia, haja vista suas próprias dúvidas sobre a noção
de Feminismo. A seu ver, o que é esse Movimento que repete as péssimas práticas
do seu oposto, o Machismo?
O Feminismo, como se sabe, surgiu do
conflito que as mulheres tiveram com as estruturas associadas ao domínio
masculino. Por causa dessas raízes, segundo a filósofa, adotou algumas
pressuposições de antes, só que agora invertidas para dar às Mulheres o predomínio
que antes era dos Homens. Mas ao fazer isso, o Movimento não faz revolução
alguma, limitando-se apenas a mudar os atores para representarem os mesmos
papéis surrados de Dominantes e Subalternos.
Nota do Autor – não deixa de ser
verdade que o Feminismo contribuiu efetivamente para dar voz e novas
oportunidades às mulheres. Mas, historicamente isso é pouco se olharmos a
existência de antigas colônias matriarcais ao longo da História que já
cumpriram tarefas similares. O que talvez desperte a ira de Kristeva seja a ineficácia
nos meios de luta e até a falta de visão estratégica que dê ao Movimento
Feminista a busca por objetivos mais amplos e generosos, como o de promover a
libertação efetiva de todas as mulheres e não apenas das “brancas europeias
ou estadunidenses bem nascidas”. Que lutasse e vencesse práticas e crendices
caducas e cruéis como, por exemplo, a extirpação forçada e a sangue-frio dos
clitóris das meninas africanas, ou a obrigatoriedade do uso de véus e burkas no
mundo islâmico, ou a prostituição de meninas no Brasil etc.
Kristeva, em sua militância, acredita que
o Feminismo deveria submeter-se a uma severa e honesta autocrítica para
justificar a legitimidade do seu anseio de ser o porta-voz do gênero feminino.
É parte presente de seu discurso o temor, de que ao lutar contra o chamado “Principio do Poder Masculino” o
Movimento cesse sua luta e se contente em promover apenas outra forma de
Principio. Para ela, o Feminismo para alcançar a verdadeira emancipação
feminina deve questionar constantemente a sua relação com o Poder masculino já
instituído, e com o feminino, que deseja o mesmo, e se necessário for renunciar
a crença na sua própria identidade;
ou seja, deixar de se propor como o “libertador
das mulheres”.
A opção por essa falta de autocrítica e de
ajuste de rumo levará, segundo teme Julia, o Movimento a se transformar apenas
noutra tendência, ou Corrente, no atual jogo de Poder, sem que nada o eleve do
rés do chão onde rasteja a política miúda de Partidos, Sindicatos, Associações
e similares.
HELENE CIXOUS
1937
Os Pensamentos em Oposição.
Em 1967 o controverso filósofo francês Jacques
Derrida publicou sua obra principal, Gramatologia, onde expôs suas teses sobre o Movimento de Desconstrução que, segundo ele, poderia
clarear os Conceitos e os seus inversos que formam o Pensamento e a Sociedade
Humana. Alguns anos antes, o antropólogo francês Claude Lévi Strauss já
apontava a existência das Oposições
Binárias que permeiam as Culturas de todos os povos. Desde os intelectualizados
nórdicos aos indígenas bororos brasileiros.
Em 1975 a poeta, romancista, filósofa e
dramaturga francesa Hélène Cioux
escreveu “Sorties” (Saídas) em que se
valeu das Teorias de Lévi Strauss e de Derrida para compor sua influente versão
sobre as Oposições que frequentemente
são usadas para se pensar o Mundo. Para ela, uma linha que atravessa os séculos
é a nossa tendência de agruparmos elementos do Mundo em pares opostos
(dia/noite; razão/emoção; claro/escuro etc.) que são classificados
hierarquicamente, sendo que um dos elementos é dado como Dominante, Ativo, Superior (e associado com a Masculinidade), enquanto o outro é tido como Passivo, Subalterno, Inferior (e relacionado
à Feminilidade).
São modos de pensar tão inseridos no
Cotidiano que acabaram ganhando status de “Verdadeiros”,
“Naturais” etc. Mas essa falsa
condição começou a ser Desconstruída
com o surgimento do Movimento Feminista, nas décadas de 1960 e 1970, principalmente.
Nota do Autor – observe-se aqui um
dado importante. Apesar de seus equívocos e limitações, essa eclosão do
Feminismo teve, por si, o mérito de balançar estruturas que se imaginavam
petrificadas.
Cioux acredita que a autoridade, que a
validade desse padrão dicotômico “Superior
= masculino/Inferior = feminino”, começou a ser desacreditado
com o inicio do Movimento de Emancipação,
mas ao invés de traçar uma hipótese, uma tese sobre o desenvolvimento futuro e
o resultado final desse Processo ainda em andamento, ela apenas coloca dúvidas
sobre o desfecho final. Sobre quais serão as consequências para os Sistemas Filosóficos,
Culturais e Políticos desse embate. As resultantes dessa desconstrução de pseudo verdades.
Coerente com suas ideias ela se recusou a
persistir na dualidade e, por isso, não tornou a cometer a falácia de apontar
um conjunto de “Vencidos e Vencedores”.
Ao contrário, ela criou a genial figura metafórica de “bilhões de marmotas, ou toupeiras, até agora desconhecidas, roendo os
alicerces de vetustos edifícios”.
Desnecessário dizer que as criticas e
censuras que lhe são dirigidas concentram-se nesse ponto. Afinal, de todos os
hábitos que o Pensamento Humano conserva, um dos mais arraigados é o de esperar
por respostas prontas.
Todavia, espera-se que, como os outros,
esse costume acabe em certo momento e quando as soluções forem personalizadas
e, portanto, saudavelmente relativas, o esquema de “Pensamento por Oposição” e as tantas crendices, injustiças e opressões
que sempre embasou, terminem em conjunto, permitindo que os Seres Humanos
busquem juntos a felicidade. Independente de terem nascidos homens ou mulheres.
Oi professor,eu sou a moça de Campo Grange que já escrevi para o senhor. Enãto eu fui naquele curso que o senhor fez mas que os bagunceiros nao deixaram ninguem entender nada. Eu quero que o senhor não pense que nós somos todos iguais e eu quero muito ir num outro curso do senhor. Eu gostei muito deste artigo que o senhor escreveu sobre nos as mulheres, e o feminismo que eu nao gosto, mas acho que devo de aprender.
ResponderExcluirUm grande beijo para o senhor. fique com o deus.
Cristiane
De tudo que eu aprendi a admirar,a amar em voce,doce poeta é essa capacidade de nos entender,nos respeitar e nos valorizar enquanto pessoas.
ResponderExcluirRegina