quinta-feira, 12 de setembro de 2013

ORTEGA Y GASSET, José - Filósofos Modernos e Contemporâneos


ORTEGA y GASSET, JOSÉ
1883 – 1955
O Livre Arbítrio é possível?
“Eu sou eu e as minhas circunstâncias”.
“A vida é uma série de colisões com o Futuro”.

A Ontologia

Para muitos, ORTEGA y GASSET é o filósofo contemporâneo que mais se destaca no ramo da Ontologia e, com efeito, as suas reflexões e conclusões foram deveras importantes para a criação de conceitos que conseguiram responder a várias questões que há muito desafiam o homem.

A Ontologia, como se sabe, é o ramo da Filosofia que estuda a chamada existência pura, ou seja, a existência (o ato de existir) despida de características individuais, efêmeras e/ou de menor importância. Nela, o “Ser” ou o “ente” só é pensado como “alguém” possuidor de uma natureza comum, ou de características comuns, á espécie a que pertence.

Notas biográficas
JOSÉ ORTEGA y GASSET nasceu em Madri, Espanha. Cursou filosofia na universidade da cidade e complementou seus estudos em universidades alemãs, onde dedicou especial atenção ao pensamento de Kant (Immanuel, 1724–1804, Alemanha) de quem recebeu enorme influência. Posteriormente lecionou na sua pátria e paralelamente trabalhou como Jornalista e Ensaísta. Também militou ativamente na política durante as décadas de 1920 e 1930, mas a sua carreira nesse terreno findou em 1936 com a eclosão da guerra civil espanhola.
Em razão do conflito, exilou-se na Argentina e ali morou até 1945, quando retornou à Europa. Viveu por três anos em Portugal e finalmente voltou à Espanha em 1948, quando fundou em Madri o célebre “Instituto de Humanidades”, de onde continuou a escrever e a lecionar até o fim de sua proveitosa vida, da qual, restou uma valiosíssima herança de conhecimentos que ainda hoje é a base para diversos sistemas filosóficos.
Sumário de suas ideias
                          Para ele:
1 – Estamos sempre imersos, contidos, limitados por “Circunstâncias Particulares”. Sempre sob a pressão dos fatos que nos atingem direta ou indiretamente.
2 – Fatos e acontecimentos que vão dos corriqueiros e comuns até os “grandes acontecimentos políticos, sociais e financeiros que alteram a vida de populações inteiras. Ou, então, sob a pressão de “circunstâncias íntimas”, tais como os nossos pensamentos, os nossos pré-conceitos, as nossas crenças etc.
4 – Podemos, com efeito, aceitar ou rejeitar tais circunstâncias ou conjunturas, imaginando e até tentando encontrar novas possibilidades.
5 – Mas é certo que nesses casos as novas possibilidades serão diferentes e inevitavelmente colidirão com as circunstâncias do Presente. Por isso, pode-se pensar que a vida é uma série de choques e colisões com o Futuro.
A Filosofia voltada para a vida.
A filosofia desenvolvida por ORTEGA y GASSET focaliza diretamente a vida. Não lhe interessava analisar o mundo com a frieza e o distanciamento dos outros pensadores. Sua latinidade, sua paixão, levou-o a investigar as maneiras pelas quais a filosofia poderia ajudar a criatividade no ato de pensar; do que resultaria uma vivência mais rica no dia a dia.
Sou eu e as minhas circunstâncias.
Seguindo essa sua inclinação, ele buscou responder até que ponto as circunstâncias são realmente limitadoras e quais seriam as maneiras de neutralizá-las. Em sua obra “Meditações de Quixote, de 1914, ele lavrou a célebre frase “sou eu e as minhas circunstâncias”, que se tornou a marca registrada de sua maneira de pensar, e a partir daí seguiu sempre esse rumo. Na sequência adentraremos os meandros de suas lucubrações.
DESCARTES (Renné, 1596–1650, França) dissera ser impossível imaginarmo-nos como “Seres pensantes” e ainda assim duvidar de que existimos efetivamente, bem como o “Mundo exterior” que inclui o nosso próprio corpo físico.
ORTEGA y GASSET concordava com a tese do francês, porém discordava de seu Dualismo* já que não via sentido, ou justificativa, para nos acharmos separados do Mundo. Afinal, o Mundo Físico nos condiciona e limita em todos os momentos e se quisermos pensar seriamente sobre nós mesmos, temos que aceitar o fato de que estamos sempre imersos em determinadas conjunturas, ou circunstâncias, que geralmente são opressoras e negativas.
E aceitar que tais limitações não são apenas físicas, materiais, mas também de ordem intelectual e emocional, pois os nossos pensamentos e sentimentos são repletos de preconceitos, crendices, crenças e complexos que formatam os nossos hábitos e delimitam até onde conseguimos chegar.
A maior parte da população vive, segundo os filósofos existencialistas, uma “Vida Inautêntica; ou seja, preocupada apenas com as questões menores do cotidiano, sem refletir sobre as questões mais profundas da existência, dentre as quais, àquelas relativas às circunstancias que lhes cercam e constrangem. Pouco ou nada se pensa sobre “o que é, por que existe e como se formou?” determinada condição ou situação que limita as possibilidades.
E alguns desses “Inautênticos”, desprovidos de qualquer raciocínio, ou da simples vontade de usá-lo, chegam a debitar a figuras mitológicas ou místicas, como deuses, Deus, o azar, a sorte, o destino etc. a ocorrência dos fatos que interferem em seus cotidianos e ao invés de tentar solucionar racionalmente o problema, ou pelo menos minorar os seus efeitos, busca vencer a problemática através de rituais religiosos e/ou místicos, tais como cultos, missas, novenas feitiços, simpatias, despachos, ebós etc.
Dão a todas as circunstâncias um caráter sobrenatural, fantasmagórico, sem atentar para o fato de que a maioria das condições do Presente são apenas consequências de atitudes tomadas no Passado, com exceção, é claro, das resultantes de desastres naturais, de decisões inelutáveis do grupo, da força das multidões etc.
Por isso, ORTEGA y GASSET pregou que os filósofos* devem se empenhar para entender as suas próprias circunstâncias e mudá-las com a urgência possível.
NOTA do AUTORFilósofos* no sentido lato do termo: “amigo do Saber” e não no sentido de “Profissional de Filosofia”.
E conclamou a todos que possuam raciocínio, e a vontade efetiva de utilizá-lo, que se empenhem em buscar a verdade dos fatos. E, óbvio, os meios capazes de alterá-los. Que primeiro reexaminem as suas próprias crenças e descartem aquelas que forem irracionais, comprometendo-se a partir daí com as novas possibilidades, novas circunstâncias.
A Energia da Vida
Nesse ponto, seu ideário aproxima-se bastante ao de EDMUND HUSSERL (1859–1938 Morávia), o “pai” da Fenomenologia, que afirmava que nascemos num mundo que nos molda, mas que também pode ser moldado conforme os nossos interesses, à medida que mudamos a nossa forma de percebê-lo, como acontece, por exemplo, quando passamos a lhe ver não só como uma rinha de luta, onde o que importa é vencer, ser mais poderoso, rico, belo etc. que o outro. Quando enxergamos que o bem-estar e a própria felicidade podem estar além do dinheiro (sem prescindir dele, é claro) e que de tudo somos capazes, já que os nossos poderes aumentam na mesma proporção que a nossa vontade os faz crescer.
Contudo, ele reconhecia que independentemente da boa vontade e do quanto nos dispomos a imaginar novos cenários futuros, as circunstâncias do momento sempre interferem e limitam a extensão do que podemos realizar e, por consequência, projetar racionalmente. A realidade do mundo sempre se chocará com os nossos sonhos e anseios, mas mesmo assim devemos insistir em nos libertarmos. Afinal, é esse exercício que nos diferencia das outras criaturas que coabitam o Planeta conosco e é pelo desafio que as circunstâncias contrárias representam que nos sobrevém o fortalecimento das nossas capacidades físicas, emocionais e mentais.
Sua proposta, pois, era desafiar as conjunturas tanto no nível pessoal, quanto no nível político, mesmo que toda tentativa de mudança fosse execrada pelos “Conservadores” e por tantos outros que se amedrontam ante qualquer alteração em suas vidas, por mais miseráveis que elas sejam.
A democracia e a “Tirania da maioria
Segundo ele, cabe ao homem avançar sempre contra as limitações impostas pelas circunstâncias adversas, dentre as quais uma que se esconde no Regime Político adotado pela maioria do Ocidente.
Em sua obra “A Rebelião das Massas”, de 1930, ele adverte que a Democracia carrega em si uma grave ameaça: “A Tirania da Maioria”; ou seja, o risco de que o populacho inculto e por isso apegado à sua retrógada e medíocre tábua de valores religiosos e morais queira obrigar a todos os cidadãos a viverem conforme seus valores e hábitos tacanhos.
Alerta que viver segundo as toscas normas, regras e costumes ditados e seguidos pelo “Império da Maioria” é viver sem perspectiva própria, pessoal. É viver como “mais um do rebanho, sem qualquer expectativa de enriquecimento intelectual, cultural, ético, pessoal etc. Atento apenas em saciar suas necessidades materiais básicas.
Para ele, a menos que todos que se utilizam do raciocínio se engajem em uma cruzada contra essa “Tirania da Maioria Medíocre” não viveremos plenamente, pois estaremos sempre submetidos às circunstâncias consideradas imutáveis, vez que são de “origem divina (sic)”; e, com isso, perderemos a capacidade de usar a Razão e a Energia da Vida, que é a crença de que somos capazes de alterar e superar as nossas circunstâncias.
O livre-arbítrio e a Razão proativa
Nessa penúltima parte do Ensaio, abordaremos dois pontos que embora pareçam ser apenas acessórios ao corpo da Filosofia de ORTEGA Y GASSET, são de especial importância para a compreensão de suas concepções.
O primeiro ponto refere-se ao chamado “Livre Arbítrio”, o qual, geralmente, é aceito ou rejeitado na íntegra, quase inexistindo quem o aceite ou o rejeite parcialmente.
Contudo, é preciso reconhecer que se não podemos exercer o “Livre Arbítrio” em sua plenitude por estarmos sempre limitados pelas circunstâncias internas e/ou externas, também não podemos dizê-lo impossível, vez que sempre há uma possibilidade de se alterar ou eliminar alguma circunstância, por mais difícil que isso seja. Afinal, a maioria das situações e condições que nos limitam resultou de decisões tomadas pela própria humanidade e, portanto, podem, ao menos em tese, serem alteradas, bastando que exista “vontade política” para que a mudança ocorra. Desse modo, aliás, ORTEGA Y GASSET coloca em prática um singular tipo de Humanismo ao redirecionar os holofotes para o homem, fazendo-o o único responsável pelo aumento ou diminuição de sua própria liberdade.
A Razão proativa
O segundo ponto, refere-se à conclamação que o filósofo fez acerca de tornamos a Razão, ou raciocínio, mais do que um simples mecanismo distante e apático. Segundo ele, será preciso impregnar-lhe de proativismo para que as circunstâncias negativas do Presente sejam rápida e eficazmente reconhecidas e alteradas para que no Futuro não se repitam.
Epílogo
Por último, resta apenas prestar o merecido tributo à inteligência e coragem deste que é um dos mais respeitados pensadores da contemporaneidade. Sua valentia em questionar alguns valores, como fez, por exemplo, com a Democracia, demonstram a independência de seu caráter e a profundidade de sua sabedoria.

©Direitos autorais reservados. Registro na BNRJ/EDA sob nº 605.931, Livro 1.161, Fls. 121. Proibida qualquer forma de reprodução, parcial ou total, por qualquer meio existente, ou que venha existir.

Produção e divulgação de TAIS ALBUQUERQUE, rien limitée, do Rio de Janeiro, na Primavera de 2013.

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