MERLEAU-PONTY, MAURICE
1980/1961
Para vermos o mundo, temos de romper com nossa
aceitação habitual a ele. É necessário readquirir o “espanto”, o
“deslumbramento”, o “assombro” ante as coisas da vida para poder vê-las em sua
plenitude.
Notas
biográficas
Nascido
em Rochefort-sur-mer, França, MERLEAU-PONTY cursou a célebre “École Normale Supérieure” junto com SARTRE, SIMONE DE BEAUVOIR e outros
filósofos de renome.
Graduou-se
em Filosofia em 1930 e lecionou em várias escolas até se alistar no exército
para lutar na Segunda Guerra Mundial. Em 1945, com o fim do conflito, publicou
sua obra mais importante “A Fenomenologia da Percepção” e
tornou-se professor na universidade de Lyon.
Após
trabalhar algum tempo na imprensa como colaborador da revista de filosofia “Les Temps Moderns”, assumiu em
1952 a cátedra dessa matéria no célebre “Collège
de France” e ali lecionou até falecer
em 1961, com apenas 53 anos de idade.
Produção Literária
Sua
produção literária foi de suma importância para o pensamento contemporâneo e
nela se destacam:
- A Estrutura do Comportamento, 1942.
- Fenomenologia de Percepção, 1945.
- Humanismo e Terror, 1947.
- Sentido e Não Sentido, 1948.
- As Aventuras da Dialética, 1955.
- Os Signos, 1960.
- O Visível e o Invisível, publicado postumamente, em 1964, Claude Lefort.
O ideário
A
frase em epígrafe: “a fim de ver o Mundo, temos de romper com
nossa aceitação habitual a ele” sintetiza a sua filosofia*, que
basicamente consiste em censurar o hábito ou o descaso que nos impede ver a
grandeza que existe em cada ato.
Com
efeito, a repetição monótona das coisas e dos fatos do cotidiano nos leva a
deixar de apreciar a totalidade da vida e do mundo e por isso é necessário
romper sistematicamente com essa visão rotineira e burocrática. É necessário
readquirir o “espanto”,
o “assombro”, o “deslumbramento”
ante as coisas, os Seres e os fatos
da vida para poder enxergá-los em sua plenitude.
É
preciso ultrapassar a tradição filosófica que estipulou noções*, ou categorias*
e fez das mesmas ferramentas obrigatórias para que o homem explicasse (sic) a sua história, a sua arte, a sua linguagem e o seu
próprio pensamento; pois, com o
tempo, o estudo filosófico se acomodou a essas categorias, habituando-se a
limitar a investigação às mesmas.
NOTA do AUTOR –
conceitos* ou categorias* como a de “sujeito”, “objeto”, “consciência”,
“representação”, “fato”, “conceito” etc.
NOTA do AUTOR – a essa
base, MERLEAU acrescentou como objetos de
estudos a “educação” e a “psicologia
infantil”.
Rompendo
com as antigas tradições
Dentre
os pensadores de sua geração, MERLEAU-PONTY foi um dos
primeiros a compreender a necessidade imperiosa de se romper com as cadeias das
antigas concepções para que o desejado conhecimento pudesse ser o mais completo
possível. Para que a filosofia pudesse retomar a sua função original de
indagar, de exigir respostas, de querer saber até onde seja possível.
Em
suas palavras: “a nossa
experiência (a aquisição de algum saber, d’algum conhecimento) é cheia de enigmas e de contradições... (mas) as nossas suposições (nossos olhares) diárias nos impedem de ver esses enigmas e
contradições... (por isso) devemos abandonar
essas suposições (esses olhares rotineiros)
cotidianas... e (re) aprender a
examinar a nossa experiência para podermos ver (a totalidade de tudo)...
Para vermos o Mundo (em sua integridade),
temos de romper com nossa aceitação habituação (com o modo rotineiro) a ele...”.
O espanto
A
noção de que a filosofia nasceu em razão da nossa capacidade de nos
“espantarmos” diante da complexidade do mundo (o qual,
não raramente chega até a nos parecer fantasmagórico), teve inicio com ARISTÓTELES, que no século IV AEC fez tal afirmativa, mesmo tendo sido ele um dos que
instituíram as categorias como forma de ordenar o pensamento.
Geralmente
não atentamos para a grandeza, para o valor que a nossa vida diária mostra.
Porém, se quisermos compreender mais profundamente o mundo, teremos de
renunciar a aceitação habitual, quase desdenhosa, que damos às Coisas (objetos,
seres, fatos etc.) do cotidiano. Teremos, consequentemente, que revalorizar
o que nos parecia ordinário, comum, sem importância.
E
isso deve acontecer no local mais difícil; ou seja, no campo da experiência,
no ato de captar algum saber, algum conhecimento.
Dar
a devida consideração aos fatos captados através da “percepção direta”, ou
seja, através da “Intuição” que nos leva a “sentir” os objetos, os Seres, os
fatos da vida,
sem tê-los passado pelo
julgamento da Razão, ou do raciocínio lógico.
Olharmos
com mais zelo e atenção para o quê os nossos sentidos (tato, visão, audição, paladar
e olfato) capturam e procurar
enxergar aquilo mais que completará o saber que se adquire no momento.
As
proposições de MERLEAU- PONTY
Após
fazer o diagnóstico do erro que cometemos ao adquirirmos conhecimento, MERLEAU-PONTY decidiu questionar com muita ênfase as
pressuposições, os preconceitos, os prejulgamentos e as próprias categorias,
enquanto instrumentos únicos e imprescindíveis para o estudo filosófico e
terminou por concluir que as mesmas atrapalham a nossa “experiência mais profunda do Mundo”.
Para
realizar estes questionamentos, o filósofo se valeu da Fenomenologia* como
ferramenta de pesquisa, mas com uma diferença importante: para ele, HUSSERL teria ignorado
um fato fundamental em relação à nossa experiência (enquanto aquisição de
algum saber), ao considerar
que a mesma seria apenas uma “experiência mental”; quando, na verdade, ela é, também, uma “experiência corporal”, já
que o saber pode ser adquirido através dos sentidos (tato, visão, audição,
paladar e olfato).
A
propósito, em sua obra “Fenomenologia
da Percepção” MERLEAU-PONTY, baseado nessa
conclusão, afirma categoricamente que a mente e o corpo não são Entes separados, conforme se estabelecera
desde a filosofia de RENÉ DESCARTES (França, 1596-1650).
Assim
sendo, para ele devemos entender (ou aceitar?) que o pensamento, enquanto
exercício mental, teórico, abstrato e a percepção, enquanto percebimento através dos sentidos (tato, visão, audição, paladar
e olfato) são completamente unidos,
ligados, incorporados. E que o mundo, a consciência (ou Mente), e o corpo (físico) são todos partes de um único sistema.
Claro
que essa sua conclusão não primou pela originalidade, pois vários pensadores e
até alguns sistemas religiosos já haviam afirmado essa espécie de Monismo. HEGEL e o Hinduísmo são exemplos dessa tendência unicista.
Todavia,
MERLEAU-PONTY foi original ao dar a essa junção de mente e corpo,
ou “corpo sujeito”, o papel de protagonista no processo de aprendizado.
E
também original por também ter esclarecido que o corpo físico não é um mero
fantoche comandado pela mente, pois é através do mesmo que experimentamos ou
captamos o mundo e o próprio fato de existirmos.
Ao
rejeitar a “dualidade”, ou seja, a
visão de que o mundo é composto por dois entes separados, MERLEAU-PONTY reservou ao físico a mesma importância que antes era
dada apenas à mente, ressalvando, porém, que tanto quanto naquela, nenhuma informação
adquirida pelo corpo físico é capaz de fornecer um saber completo sobre o que
foi experimentado ou estudado. Assim sendo, será sempre necessário o emprego de
ambos, físico e mente, para que a sabedoria adquirida seja a mais extensa possível.
Os
membros-fantasmas
Ao
se dedicar a ver o mundo doutra maneira, o filósofo interessou-se por
experiências incomuns.
Ele
acreditava, por exemplo, que o caso do “membro-fantasma*” confirmava a sua tese
de que o corpo físico não é apenas uma máquina, pois, se fosse, não “reconheceria” mais a parte que lhe foi subtraída.
Para
ele, o corpo é, na verdade, um “corpo vivido”,
ou seja, que carrega em si as experiências que já viveu como no caso do membro
amputado.
NOTA do AUTOR – membro-fantasma* processo mental que leva o individuo vitima de amputação a “sentir” o membro que lhe foi tirado.
Cientistas
Cognitivos
A
ênfase que MERLEUAU-PONTY deu ao corpo físico e ao papel desempenhado pelo
mesmo na aquisição de saber, bem como as suas outras intuições filosóficas
sobre a natureza da mente (ie, sobre o que é a Mente)
e sobre a sua ligação com o corpo físico, levaram-no a uma retomada de
interesse pelos chamados “cientistas cognitivos”, ie, os eruditos que estudam o
“processo de aprendizagem”.
E
de fato, muitos avanços nessa área confirmaram as validades de suas teses
acerca da necessidade de rompermos com a “aceitação habitual” do mundo, e sobre
o processo de experimentação ou de aquisição de conhecimentos.
Comprovações
que acrescentaram mais brilho ao seu já ilustre renome e contribuíram para que
seu trabalho permaneça como um dos mais visitados por todos aqueles que buscam
respostas para as grandes questões da vida.
© Registro na BNRJ/EDA sob nº 605.931 – Lv. 1.161 –
Fls. 121. Proibida qualquer forma de
cópia.
Produção de divulgação de TAIS ALBUQUERQUE, rien limitée, do Rio de Janeiro, no inverno de 2013.
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