MARX, Karl Heinrich.
1818 – 1883
A história de todas as
Sociedades até hoje existentes é a história da luta de Classes. A “Luta de
Classes”, “A Dialética Materialista ou o Materialismo Dialético”, “A Mais
Valia”, “O Exército de Reserva”, “a Práxis”, “o Manifesto Comunista”, “O
Capital (Das Kapital)”.
Antes de tudo, pede-se que o leitor não confunda os
conceitos de “meritocracia” com o de “injustiça”, pois se é plenamente
aceitável que cada qual ganhe de acordo com seu talento e com seu esforço, é
profundamente questionável que alguns vivam nababescamente após terem
conseguido a sua fortuna através de meios ilícitos; ou, então, por terem nascido em lares ricos e por isso disputem
com injustas vantagens e trunfos indevidos os empregos, as vagas universitárias,
as posições sociais etc. com aqueles que por infortúnio foram gerados e criados
em lares carentes, perpetuando um trágico “Circulo Vicioso” de exploração,
violência e terror.
Note-se, pois, que o conceito de “Injustiça Social”
não implica em fazer com que todos sejam nivelados por baixo, mas justamente o
contrário. “Justiça Social” é dar oportunidades efetivas para que todos
possam buscar a própria realização.
Mas o que vem a ser exatamente essa chamada “Injustiça
Social” e qual a sua causa e origem? O que leva o homem a se comportar como um
simples animal, cujo interesse é apenas a sua própria satisfação? Provavelmente
seja, exatamente, a sua condição de “animal”, já que milênios de civilização não
foram suficientes para apagar em nossa psique alguns instintos animalescos. Ainda
continuamos a preservar com ferocidade o “nosso espaço”, a “nossa comida” e a
satisfação de nossas outras necessidades mais básicas, físicas, materiais.
É certo que tais instintos, por força da repressão
social, foram atenuados e que alguns sentimentos mais nobres afloram em algumas
ocasiões. Mas no intimo ainda somos escravizados por nossas ambições, por nossa
ganância e, principalmente, por nosso medo de sermos rejeitados socialmente se
nada possuirmos. Somos, ao cabo, escravizados pelo pavor de nos sabermos
frágeis e de que só existimos quando estamos refletidos em posses e
propriedades.
A partir, então, dessa constatação é possível ver que
a “Justiça Social” nunca poderia ocorrer de forma voluntária, espontânea,
pacifica, pois quantos homens se disporiam a abrir mãos de seus bens em favor
da coletividade?
Logo, a “Luta
de Classes” será perene, pois aqueles que possuem os “Bens Materiais” tudo
farão para mantê-los e aumentá-los; enquanto aqueles que não os possuem,
tudo farão para conquistá-los.
É como uma sina da humanidade, permeada por violências
de toda sorte. Humanidade, que certamente ainda terá um longo caminho a
percorrer até que consiga se libertar da bestialidade de seu comportamento
atávico.
Alguns otimistas veem, ou querem ver, um abrandamento
dessa natureza selvagem. Alguns pessimistas, ou realistas, julgam-na em aumento
constante devido ao endeusamento ao “Poder Material” que a cada dia mais se
consolida em nossa sociedade. São pontos de vista que derivam e se deixam à
escolha, mas o certo é que os motivos de antes ainda estão presentes e atuantes
e com isso se vê a atualidade da obra marxista. Aliás, tanto quanto a
necessidade de estudá-la sem pré-julgamentos, ou pré-conceitos, pois talvez a
apreensão da nossa verdade seja o único caminho que poderá nos oferecer alguma
perspectiva positiva.
Por fim, pede-se que quando existirem censuras,
explícita ou implícita associadas às citações sobre “Burguesia”, “Elite” ou “Classe
Dominante”, tenha-se em mente que a mesma é dirigida àquelas pessoas descritas
no inicio e que gozam de luxo e riqueza sem que nada tenham feito para
merecê-los.
O autor conta com o discernimento e a compreensão do (a) amável leitor (a).
Já se disse que tudo que se escreveu sobre Filosofia não passaria de simples “notas de rodapé” para os textos que PLATÃO redigiu ao expor o seu ideário. Tirante algum exagero nessa afirmativa, resta a constatação quase unânime acerca da efetiva importância que o sábio grego teve e tem para a cultura do Ocidente.
E ressalvando-se as proporções e as circunstâncias,
não será de todo errado dizer o mesmo acerca de KARL MARX, pois se novamente subtrairmos qualquer exagero
indevido, vê-se que o seu pensamento embasou o ideário de praticamente todos os
pensadores modernos e contemporâneos. Seja como adeptos ou como adversários,
todos navegaram em suas águas, ao refletirem, investigarem e analisarem as
questões políticas, o Mundo e a própria humanidade.
É inegável, pois, que esse genial alemão, fez-se
eterno nos anais da história e, mais importante, nos corações de todos aqueles
que insistem em sonhar com um mundo e com uma sociedade mais justa e fraterna.
Afinal, aprendeu-se com ele que o exercício da “esperança” pode e deve ser
estudado com o rigor da ciência e que a mudança está sempre ao alcance daqueles
que conseguem libertar-se do egoísmo medíocre que a moral burguesa forjou como padrão a ser seguido.
Notas biográficas
KARL MARX foi o segundo a nascer em uma prole de nove filhos. Veio ao mundo no seio de uma família judaica, de classe média, na cidade Tréveris, na Prússia, então parte do Império Alemão.
HENRIETTE PRESSBURG, sua mãe, era judia holandesa e seu pai, HERSCHEL MARX,
descendia de uma linhagem de “Rabinos”,
mas teve que abandoná-la e se converter ao Cristianismo
em decorrência das restrições que se faziam ao ingresso de hebreus no serviço público, onde ele, advogado por ofício, exerceu o cargo
de Conselheiro de Justiça.
Graças a essa apostasia, o cargo permitiu-lhe oferecer
boas condições materiais à família e por isso MARX e seus irmãos e irmãs desfrutaram de uma infância
confortável e de acesso facilitado às boas escolas.
KARL MARX iniciou os seus estudos no Liceu de FRIEDRICH WILHELM, na cidade natal, no mesmo ano em que eclodiram
rebeliões em várias nações europeias. Para alguns, um prenuncio dos movimentos políticos que no Futuro
embasariam o cerne de seu pensamento.
Posteriormente,
ingressou na universidade de Bonn para estudar Direito, mas logo no ano seguinte
transferiu-se para a universidade de Berlim onde teve contato com a Filosofia
de HEGEL* que exerceu
influência decisiva em seu ideário.
NOTA
do AUTOR - Georg W.
Friedrich HEGEL, 1770 – 1831
Professor e Reitor da Instituição.
Na
sequência analisaremos os diversos temas que compõe o Marxismo, subdividindo-os
para facilitar a compreensão, mas enfatizando a complementariedade entre todos.
A troca do
Direito pela Filosofia
Posteriormente,
ainda na capital alemã, ingressou no “Clube dos Doutores”, liderado por
BRUNO BAUER e abandonou definitivamente o estudo das Leis para
abraçar o de Filosofia.
Também
nessa ocasião participou ativamente de movimentos políticos filosóficos como “Os Jovens Hegelianos” e começou a
exercitar de maneira sistemática seus dons literários.
Em
1841, obteve o titulo de “Doutor em Filosofia” após defender a tese
sobre “As diferenças da ‘Filosofia da Natureza’ em Demócrito e
em Epicuro”.
Porém,
tendo sido impedido de seguir a carreira acadêmica devido ao seu ativismo
político, tornou-se em 1842 o Redator-Chefe da “Gazeta Renana”, um pequeno jornal da província de Colônia, Alemanha.
A amizade e
a parceria com ENGELS
Também
em 1842 conheceu FRIEDRICH ENGELS (Prússia, 1820-1895) com quem manteve fraterna amizade e produtiva
parceria política e literária por mais de quatro décadas. Relacionamento,
aliás, que chegou a lhe sobreviver, pois foi ENGELS quem se incumbiu de editar postumamente as suas
obras.
Ainda
sobre a amizade de ENGELS é oportuno que se diga que em várias ocasiões ele
atuou como um verdadeiro mecenas ao socorrer MARX que vivia em constantes apuros financeiros. Foi
graças à sua generosidade que o brilho maior de MARX não terminou sufocado pelas preocupações menores das exigências do cotidiano.
Também
se deve ventilar que não são poucos os eruditos que lhe creditam um papel
essencial no desenvolvimento do Pensamento
Marxista, já que além de sua importante colaboração financeira, ele
teve efetiva participação no campo teórico e literário, tendo sido inclusive o
coautor de vários textos.
Envolvimento Político e a
penúria familiar
Em
1843 a Gazeta Renana foi
fechada por ordem do Governo, em represália a uma série de artigos que
criticavam duramente a administração prussiana.
Desempregado,
MARX
e a família que ele iniciara em junho daquele ano ao se casar com JENNY VON WESTPHALEN (filha de um barão prussiano,
com quem ele mantivera um noivado secreto em virtude da desaprovação de ambas
as famílias), emigraram para
a França.
Em
Paris, MARX assumiu a direção da revista Anais Franco Alemães e manteve contato com diversas
organizações secretas de Socialistas.
A
vida pessoal e familiar, primeiro em França e depois em Londres, enfrentavam condições materiais
dificílimas e em virtude da penúria recorrente, o casal perdeu quatro, dos sete
filhos que gerou.
Outro
filho de MARX
(fruto de uma relação extraconjugal com uma empregada
da casa e militante socialista chamada HELENA DEMUTH) foi
assumido por ENGELS, que pagou pensão à criança e a entregou em adoção
para uma família proletária londrina.
No
terreno da Política, ainda em 1843, MARX fez
contato com a Liga dos Justos (depois rebatizada de Liga dos Comunistas);
e em 1844 iniciou efetivamente a parceria de trabalho com o amigo ENGELS.
A adesão ao
Socialismo
Também
nessa ocasião iniciou uma série de debates com o Filósofo francês PROUDHON (Pierre
Joseph, 18909 – 1865) e um proveitoso
relacionamento com o Anarquista russo,
BAKUNIN (Mikhail
Aleksandrovitch, 1814 – 187),
ativo militante Socialista
que vivia na França, refugiado do Czarismo russo.
Esses
encontros, debates e relacionamentos completavam os estudos que MARX realizava continuamente sobre a “Economia Política”, os “Socialistas Utópicos” franceses e a história da França.
E foi desse
conjunto de informações e reflexões que nasceu a sua primeira obra de
reconhecida importância: Manuscritos de Paris,
posteriormente chamados de Manuscritos
Econômico Filosóficos.
E,
segundo ENGELS,
foi também nessa época que MARX consolidou a sua adesão às Ideias
Socialistas.
As tribunas
na imprensa e as mudanças
Ainda
em Paris, MARX ajudou a editar um pequeno jornal – VORWARTS!
– cuja linha editorial primava pela critica constante ao Governo alemão. Postura
que teve como consequência o revide do Regime e MARX acabou
sendo expulso do país em 1845, a pedido da Prússia.
Da
França, ele emigrou para a Bélgica e em Bruxelas
encontrou-se com ENGELS que também se mudara para lá. Ali, a dupla redigiu o
célebre Manifesto Comunista, que traz a essência do ideário Marxista.
Porém,
em 1848 o Governo belga também o expulsou juntamente com ENGELS.
Por
isso, ele e o amigo mudaram para a cidade de Colônia, Alemanha, onde
fundaram um novo jornal – Nova Gazeta Renana – que tinha como
linha editorial as mesmas críticas dos jornais anteriores, não poupando de
censuras as autoridades locais que em resposta, novamente, os expulsou no ano seguinte,
1949.
A melhora passageira
nas finanças pessoais
Na
vida pessoal, apesar das mudanças e condenações nos últimos tempos, a maré
havia mudado e MARX vinha conseguindo oferecer boas condições materiais
para a família graças aos rendimentos que auferia com suas publicações e com as
doações que recebia de amigos e aliados, além da herança que recebeu com a
morte do pai.
Mas
ao deixar Colônia, a penúria voltou a
lhe assombrar e só a muito custo a família conseguiu retornar a Paris, onde
novamente foi impedida de ficar por ordem do Governo francês.
Foi
necessária, inclusive, uma campanha de arrecadação de fundos, promovida por FERDINAND LASSALLE* na Alemanha, para que com os recursos obtidos a
família pudesse chegar a Londres onde, enfim, se eles se fixaram em definitivo.
NOTA
do AUTOR - FERDINAND LASSALLE*, 1825–1864, considerado o precursor da Social Democracia alemã.
Ali viveram em relativa tranquilidade até que a partir
de 1881, já deprimido pela morte da esposa, MARX viu se
agravarem os seus problemas de saúde, até que veio a falecer em 1883.
Foi enterrado no cemitério londrino de High Gate,
na condição de apátrida.
NOTA do AUTOR - Ironicamente, porém, o fato de lhe terem negado uma nacionalidade
fez justiça à universalidade de seu gênio. Com efeito, uma inteligência como a
sua não poderia ficar restrita a um só País. Pertence, de fato, a todos os povos.
O Pensamento de MARX e a sua influência
Para não fugir à regra das ideias brilhantes que só
fulguram após a morte de quem as teve, às de MARX tiveram
pouca repercussão enquanto ele viveu.
O interesse mais significativo ocorreu na Rússia que já vinha experimentando uma
série de contestações ao regime monárquico
dos Czares, mas
sem que houvesse uma ideologia capaz de catalisar todas as insatisfações. E foi
em Moscou, em 1872, que se publicou a primeira tradução de O Capital – Tomo I.
Na Alemanha, só em 1879 é que a sua obra começou a ser
conhecida graças ao estudioso de Economia Política ADOLPH WAGNER, que comentou o “ideário marxista” ao longo de sua obra, Allgemeine Oder
Theoretische Volkswirthschafts Lehre.
Graças a esse impulso inicial, o pensamento marxista ganhou fôlego e pouco após a morte do Filósofo
as suas teorias já obtinham crescente influência intelectual e política entre
os movimentos operários que ao
final do século XIX tinham no “Partido
Social Democrático Alemão” o seu principal, e talvez único, canal de
expressão.
Influência que também crescia, embora com menos
ímpeto, entre os círculos acadêmicos ligados aos estudos das “Ciências Humanas*”, principalmente
nas universidades de Viena e de Roma, que foram as pioneiras em ofertar cursos
sobre o Marxismo.
NOTA do AUTOR – Ciências Humanas*: Filosofia, Antropologia, Sociologia,
Política, História etc.
Hoje, é um consenso que MARX foi um legitimo continuador da grande Filosofia
alemã, ombreando com KANT e
HEGEL e
aproximando-se de pensadores do porte de ARISTÓTELES.
Porém, embora
tenha sido um sincero admirador de HEGEL, MARX discordava severamente de
sua “Filosofia Idealista”,
através da qual se afirmava que “da
realidade se faz filosofia”, ou seja, que a Filosofia é apenas uma reflexão passiva sobre uma conjuntura colocada.
Para ele, o correto é justamente o inverso, isto é, “a
Filosofia deve incidir sobre a
Realidade”; não basta divagar, ou que se especule, ou que
se pense sobre a Realidade.
Para MARX, cabe à filosofia alterar
a realidade.
A Práxis como o cerne do Marxismo
E segundo ele, para “mudar o Mundo” é imperioso vincular o Pensamento e a Prática, (o ato de fazer); a Teoria e
a Ação Revolucionária (no sentido de mudar drasticamente os valores, os costumes, etc.).
Vinculação que MARX chamou, ou
conceituou de Práxis.
Pode-se dizer que a Práxis confunde-se com o cerne de
seu sistema filosófico, haja vista que para combater com êxito as injustiças
oriundas do Sistema Capitalista
será necessária a junção do corpo e da alma, da força e da inteligência.
A partir da definição sobre o quê e quem deverá ser
combatido, MARX estabeleceu como condição imprescindível para o
sucesso, que se abandonasse qualquer separação entre a Teoria e a Prática, entre o Pensamento
e a Realidade, pois essa divisão é uma mera abstração, já que o corpo e a
mente estão indissoluvelmente ligados e perfazem uma totalidade complexa.
Para ele, a Revolução
pensada, sonhada e desejada deve ser realizada concretamente, sob a pena de não ter passado
de uma tola e infantil bravata.
O historicismo e a rejeição ao Determinismo
Por conta desse apego aos fatores físicos, concretos é
que o Marxismo baseia-se na
ideia de que a história humana é determinada
pelas circunstâncias materiais, físicas, concretas. E não pelo “progresso do espírito”,
pela “evolução da mente”, pelo “desenvolvimento do pensamento”,
como afirmavam HEGEL e outros pensadores.
Porém, apesar de conceder essa supremacia à matéria, ao físico, em detrimento das
ideias, do abstrato, a doutrina
Marxista rejeita qualquer noção de Determinismo, que como se sabe
é a tendência filosófica que afirma serem os fatos e as circunstâncias prévia e
inelutavelmente definidas por “deuses”, “destino”, “Deus” etc. e que acontecem
de modo totalmente independente da vontade do homem.
Dessa sorte, para bem se entender os conceitos Marxistas*, deve-se aceitar que o processo histórico é feito pela ação
humana, pelo movimento dos fatos e pelas circunstâncias concretas, materiais. Afinal, segundo a
sua ótica, as ideias, as divagações ou os conceitos abstratos são apenas
o reflexo da realidade física, ou seja, uma “Abstração do Real”.
NOTA do AUTOR – exemplos de conceitos
marxistas*: “Força Produtiva”, “Mais-Valia” etc.
O Trabalho
Para MARX, o Trabalho é o centro da atividade humana, independentemente
de ser intelectual, braçal, primário,
complexo etc.
É a base, a fundação sobre a qual se assenta a própria
humanidade, já que é das “Relações de
Trabalho”, ou “Relações de
Produção”, que surgem todas as outras relações entre os indivíduos, isto
é, as “Relações Sociais”, que,
por sua vez, embasam todo o processo de formação da humanidade.
A História,
portanto e ao cabo, é a narrativa das Relações
de Produção, ou de Trabalho, pois é dela que se originam as demais.
A Alienação
E foi a partir da importância dada ao “Trabalho”, que MARX
desenvolveu sua tese que identifica a Alienação*
no trabalho, como a “alienação básica” que acontece em todas as outras áreas.
Mas o quem vem a ser exatamente a “alienação”?
Alienação
é o nome dado ao processo cujo objetivo é ocultar ou falsificar a relação ou ligação
entre “ação e consciência” e com isso fazer parecer que o produto, ou a mercadoria
produzida, seja superior, independente, indiferente ao homem que a produziu.
É uma situação
característica do Capitalismo,
onde o trabalho do homem é tratado de tal modo, que as coisas que ele produz
são imediatamente separadas de seus interesses e colocadas além de seu alcance (o operário que produz um
carro de luxo é um exemplo clássico dessa situação).
A partir dessa base filosófica, MARX estendeu as suas reflexões para as outras Ciências,
cujo estudo, aliás, foi profundamente influenciado pela sua opinião acerca da Realidade
ser essencialmente física, concreta, material e determinante das Relações
Sociais.
As Influências
Para formatar seu ideário, MARX sorveu partes dos pensamentos de alguns eruditos.
Dentre outros, citaremos a seguir aqueles de maior importância:
- A Filosofia alemã de KANT, HEGEL
e a dos chamados Neo-Hegelianos,
com ênfase em FEUERBACH.
- o Socialismo utópico de SAINT-SIMON, ROBERT OWEN, LOUIS BLANC e PROUDHON.
- a Economia Clássica dos britânicos, ADAM SMITH, DAVID RICARDO e mais alguns.
NOTA do AUTOR – sobre PROUDHON paira a dúvida sobre o acerto de incluí-lo na malta dos “Utópicos”, haja vista sua posição favorável à radicalização política.
Adiante abordaremos estas influências separadamente,
embora devam ser compreendidas como complementares na formação de seu sistema.
A Formação das Classes Sociais
Como se disse, a luta entre as Classes Sociais é o
pensamento básico da doutrina marxista. Por isso, será oportuna uma breve
reflexão sobre a gênese e a natureza das mesmas.
No berço da civilização os indivíduos eram os responsáveis
diretos por produzir tudo de que necessitassem para si mesmos e para os seus
próximos (comida, roupas, armas, utensílios etc.).
Quando as primeiras sociedades começaram a se
organizar, as pessoas passaram a contar com o labor das outras e cada qual
passou a fazer aquilo que melhor se lhe adaptava.
Essa estruturação levou ao surgimento do “escambo” e/ou das “barganhas” no qual fulano
trocava o que produzira, por aquilo de que necessitava e que fora produzido por
sicrano.
Uma forma rudimentar de “Relações Comerciais” que foi
magistralmente descrita pelo Economista ADAM SMITH (Escócia,
1723 – 1790).
MARX concordava com a afirmativa do escocês de que foi
justamente nesse momento que se iniciou a “Especialização
no Trabalho”, mas ressaltava que essa mesma especialização também passou a servir como rótulo, ou
classificação. Como escala de importância, credibilidade e atratividade.
Passou a definir as posições dentro do contexto
social.
A especialização, ou ocupação, ou profissão do
individuo passou a servir como indicativo de como seria a sua vida física,
material. Passou a servir para ditar “onde
e como” esse indivíduo moraria, o quê comeria, o quê vestiria etc.
NOTA do AUTOR - e para justificar conceitos e pré-conceitos negativos.
Ademais, impunha com quem o sujeito poderia e deveria
se relacionar e compartilhar seus interesses. E contra quem esses seus
interesses colidiriam. Passou, ao cabo, a determinar quem seriam os seus
aliados e os seus adversários.
Estava, portanto, arquitetado o “Sistema de
Classes Socioeconômicas” que é a base de todo Regime Capitalista, onde o que diferencia um indivíduo do outro
é a quantidade de Capital que
cada qual possui.
NOTA do AUTOR – Capital que nem sempre tem origem
ética, ainda que seja amparada por uma Legislação viciada.
De acordo com MARX, houve
quatro estágios na história humana que se vinculam diretamente com as quatro
formas diferentes do “Regime de Propriedade”.
A saber:
1. Sistema Tribal (a propriedade era comum, da
coletividade).
2. Sistema de Propriedade Comunal e Estatal
(onde teve
inicio a Propriedade Privada e a Escravidão).
3. Sistema Feudal de Propriedade (onde a titularidade da
propriedade era de um único Senhor).
4. Sistema Capitalista Moderno (em que a propriedade está
concentrada nas mãos de quem detém o Capital).
Cada um desses estágios representou uma forma
diferente de “Sistema Econômico”, ou
de “Modo de Produção” e as
transições entre os mesmos foram marcadas por acontecimentos políticos turbulentos
como guerras, revoluções etc. que substituíam as “Classes Dominantes”
a partir do evento.
A Luta de Classes
Desde a época em que o Brasil era dado como “oficialmente descoberto”, que a questão da “Luta de Classes” já era debatida, como se pode observar nos
textos do genial Nicólo Maquiavel (1469 – 1527), que narra o quanto o problema permeava as antigas
sociedades e, especialmente, a romana, conforme se lê em sua obra “Discursos sobre a primeira década de
Tito Lívio”.
E vários outros exemplos a pena de Maquiavel
poderia relatar com facilidade, pois o embate sempre esteve presente em todos
os agrupamentos sociais. De
um lado a “Classe Dominante” e
do outro, a “Classe Explorada”.
Porém, se antes os antagonistas eram variados*, a
partir da Revolução Industrial ** os
adversários passaram a ser englobados em apenas duas categorias:
- Burguesia
- Proletariado
NOTAS do AUTOR* – nobres x servos; aristocratas x servos; latifundiários x camponeses etc. ** Iniciada no “Reino Unido” em meados
do século XVIII e difundida mundialmente desde o inicio do século XIX.
Hodiernamente várias subcategorias foram estipuladas e
outras nomenclaturas foram criadas, mas o fato é que o litígio continua a ser
basicamente o mesmo, pois o que o motiva permanece intocado: a “injustiça social”.
Valores da Burguesia
Segundo MARX, além das implicações econômicas oriundas da alteração
no regime de propriedade, outro fato
marcante ocorreu quando a “burguesia”
consolidou-se como vitoriosa na “luta de classes” e estabeleceu que não
houvesse mais qualquer ligação entre as pessoas que não fosse ditada pelo “interesse próprio, egoísta e praticado de
modo escancarado”.
Instituiu de modo imperativo o egocentrismo absoluto,
onde só importa o interesse individual, com o consequente fim de qualquer tipo
de vida comunitária, fraternal e quejandos. Estipulou, enfim, a substituição da
antiga solidariedade, pela acirrada competição.
Impôs que doravante só existiria o “desumano pagamento em dinheiro”, com
o conseguinte fim do escambo,
ou da simples troca de favores.
Se, anteriormente as pessoas eram valorizadas e
estimadas pelo que eram e pelo
que faziam, passaram a ser “queridas” apenas pelo que possuíam.
Se antes o trabalho artesanal era uma das principais
fontes de reconhecimento acerca do valor de um individuo, já que a sua
habilidade e a serventia de seu oficio garantiam a sobrevivência e a prosperidade
do grupo, a partir do aburguesamento da sociedade, tal labor passou a ser
execrado sob o argumento de que não produzia riqueza suficiente.
Assim sendo, pelos motivos descritos, com a ascensão
burguesa o valor da pessoa reduziu-se a um mero “valor de troca”.
Valores morais, éticos, religiosos e até os sentimentais
foram eliminados ou abafados, enquanto ocorria o processo que transformava a
todos em simples e anônimos “trabalhadores
assalariados” (de Cientistas a Poetas, de Engenheiros a Padres).
Nas palavras de MARX, onde
havia “sentimentos religiosos, místicos ou de outras naturezas”, a Burguesia
os substituiu com exclusividade pela “exploração
descarada, direta, brutal de um homem por outro homem”.
Decretos e Leis que antes protegiam as “Liberdades Individuais” foram
sumariamente atropelados por uma falsa e irracional “Liberdade de Mercado”, pela
noção de “Livre Comércio”.
O resgate dos
antigos valores
Segundo MARX, para que os antigos valores
fossem resgatados e com eles a dignidade humana, a única alternativa seria
derrotar a mentalidade burguesa tornando os “Meios de Produção*” propriedade coletiva.
NOTA do AUTOR - Meios de Produção - a terra, as fábricas, as
máquinas, as ferramentas, o Capital etc.
Cada indivíduo poderia, então, trabalhar conforme a
sua capacidade e habilidade e teria o sagrado direito de consumir conforme a
sua real necessidade, sem os
penduricalhos fúteis que o Capitalismo torna “necessários” através da “lavagem cerebral” que faz por
intermédio de sua sórdida publicidade.
Publicidade, aliás, que não se limita em apenas
alardear as supostas vantagens de certo produto. A propaganda ganhou terreno
inusitado e atualmente dita modas e normas de comportamento sem qualquer lastro
cientifico ou pudor ético, fazendo de cada homem um reles consumidor, cujo bem
estar físico e espiritual depende das aquisições que consegue fazer.
Não há dúvidas de que nesse procedimento existe também
uma maquiavélica intenção de se fixar nas mentes mais humildes a ideologia
burguesa, pois ao criar paradigmas ela convence aos menos letrados da
importância de seguirem o “rebanho” sem fazerem questionamentos indesejáveis.
Instituições Culturais
Segundo MARX, a análise
da “base econômica” de uma sociedade
permite observar que quando o “Sistema
de Propriedade” da mesma se altera, modifica-se também a Superestrutura*
daquele grupo social.
NOTAS do AUTOR - *Superestrutura –
a política, as leis, a Filosofia, a arte, a religião etc. O conjunto de
elementos e valores abstratos pertencentes e diretivos de uma Sociedade.
Observando-se a
substituição dos Nobres pelos Burgueses enquanto “Classe Dominante”, vê-se com clareza esse tipo de
alteração, particularmente no campo das Artes.
Nota-se, por exemplo, que
enquanto a música da Nobreza caracterizava-se por certo requinte, densidade,
elegância e outros atributos considerados superiores, a da Burguesia representada
por “modas populares ou sertanejas” “funks” e coisas do gênero, a
indigência intelectual e artística que a falta de educação e de cultura
ocasiona no gosto e na sensibilidade das pessoas.
NOTA do AUTOR – ressalva-se, porém, o direito individual de cada
qual gostar daquilo que lhe parecer agradável. Aqui não se trata de julgar
estilos, mas é indubitável que um compositor como Chopin será sempre mais importante que um mero oportunista que se
vale da oferta dos meios de comunicação para atingir o “sucesso”. Conta-se com
o discernimento do (a) leitor (a) para entender que não se trata de um mero
elitismo pernóstico.
Ainda que tenha se tornado
a detentora do poder econômico, a Burguesia não escapa das censuras e das
críticas ao seu “mau gosto” e ao sarcasmo habitual daqueles que zombam
dos supostos hábitos extravagantes dos considerados “novos ricos”,
ou “sem berço” e outras considerações elitistas.
O Espírito da
Época
Como se sabe, a Superestrutura
se desenvolve para servir aos interesses da Classe Dominante, promovendo as “suas verdades” e “legitimando” as suas aspirações e os seus atos, enquanto
desvia a atenção do Proletariado
das efetivas questões socioeconômicas.
Todavia, nem mesmo a Classe Dominante é quem de fato determina os acontecimentos ou
as próprias instituições de seu tempo. Sua capacidade de formar a
“Superestrutura” é, portanto, limitada.
O que efetivamente controla, organiza e determina os
acontecimentos de uma época é aquilo que HEGEL
chamava de Zeit, ou “Espírito da Época”, o qual, ao cabo, seria o resultado da
soma, ou da média, das ideias individuais dos cidadãos daquele lugar e momento.
MARX concordava parcialmente com a ideia hegeliana, mas
onde HEGEL via o Zeitgeist como um “Espírito Absoluto”, ou seja, o predomínio hegemônico das
ideias, da mente, da abstração, MARX o enxergava como
a resultante das relações socioeconômicas
existentes entre os indivíduos daquele momento e local.
Para ele, tais relações
é que formam efetivamente o ideário daquele momento, ou a consciência (ou conscientização)
de indivíduos e sociedades.
Segundo MARX, as
pessoas não
deixam uma marca pessoal em seu tempo, moldando-o segundo sua vontade. Ao
contrário, é o momento, ou a época, que moldam os indivíduos e os grupos sociais.
A influência de FEUERBACH e os mitos
divinos
A releitura que MARX fez da Filosofia
Hegeliana foi assaz influenciada pelas ideias de outro pensador alemão
chamado FEUERBACH (Ludwig,
1804 – 1872), para quem as
pessoas criam “Deuses”
ou “Deus” “à sua
imagem e semelhança*” e lhes atribuem as grandes virtudes humanas (generosidade, inteligência,
justiça etc.).
NOTA do AUTOR - *a ironia do mesmo não era
aleatória
A partir dessa criação, apegam-se a estas Entidades Divinas que
inventaram e optam em viver “sonhos,
utopias, delírios” ao invés do mundo real, ou físico, concreto,
material.
NOTA do AUTOR – a tese central FEUERBACH consistia na crença de que
a “Religião” é
uma sórdida farsa, que não pode ser amparada por nenhum Pensamento Lógico Racional, e que contribui decisivamente para
manter a miséria humana.
NOTA do
AUTOR
- outro Filósofo, Nietzsche, sobre essas invenções de deuses, ou de
Deus, ou de “Valores Sublimes” disse que eles “são humanos, demasiados
humanos”; ou seja, sua gênese nada tem de divina, pois não passam de meras
criações da mente humana, cujas origens, com o tempo são esquecidas e, então,
atribuídas ao divino. As pessoas se alienam de si mesma por meio de uma
comparação sempre desfavorável entre seu próprio “eu” e o “Deus” que elas
criaram.
A Influência do Idealismo (ou hegelismo)
Dois pontos na Filosofia hegeliana influenciaram bastante
o jovem MARX: a Filosofia da História e a Dialética.
HEGEL, como se sabe,
adotava o conceito de Devir, criado pelo filósofo pré-socrático HERÁCLITO, para argumentar em favor de sua
tese de que nada no Mundo seria estático, fixo, imóvel. Ao contrário, tudo está
em constante movimento, em perpétuo processo de vir-a-ser.
Logo, tudo é “histórico”.
Para HEGEL, o sujeito desse mundo em constante
movimento é o Espírito do Mundo (ou a Superalma, ou a Consciência Absoluta), ou seja, a soma ou a média dos pensamentos e
sentimentos dos homens.
Ademais, segundo ele, a Consciência Humana Geral,
chamada de “Deus” por alguns, é pertencente a todos os indivíduos, pois
inobstante as diferenças pontuais, todos os homens possuem uma essência
em comum.
Por isso, a história é entendida como o desenvolvimento,
ou o progresso das ideias, do espírito, da mente, já que a coisas físicas, concretas são meras projeções do
que existe em nível mental.
Na verdade, conforme HEGEL, o
desenvolvimento da mente é, ao cabo, o desenvolvimento da Consciência da
Liberdade*, já que após percorrer uma trajetória, ou uma história – a “Consciência
Individual” liberta-se
do jugo da matéria e da servidão ocasionada pela ignorância.
NOTA do AUTOR - Consciência
da Liberdade*: a formatação da sociedade em seus aspectos concretos, físicos, materiais,
obedece às normas ditadas pelas ideias; ou seja, a Realidade é formada
pelas ideias. São as concepções humanas que definem como deve ser a vida em sociedade,
numa tentativa de eliminar, ou pelo menos suavizar, o conflito
existente entre as ideias de “Liberdade Individual” versus “Coerção Social”.
Com isso, o Ser humano liberta-se progressivamente dos baixos instintos
animalescos que ainda habitam o seu espírito, graças a um processo de
espiritualização, ou de evolução mental. Processo este que se constitui
de um conjunto de reflexões filosóficas que leva o individuo a perceber que
ele, homem, é o sujeito efetivo da história (ou da realidade, da sua
própria existência) e que, portanto, caberá a ele decidir
o seu destino.
O rompimento com as ideias de HEGEL
Durante algum tempo, MARX seguiu essa
linha de pensamentos e participou do grupo intitulado de “hegelianos de esquerda”, mas acabou por romper com o mesmo e
efetuou uma severa revisão em seus conceitos baseados nessa teoria. Foi então
que se aproximou das teses de FEUERBACH que gozava de muita popularidade entre os intelectuais contemporâneos.
Em 1841, FEUERBACH publicou o livro “Essência
do Cristianismo” e com ele aumentou consideravelmente a influência
sobre MARX, ENGELS e outros “jovens hegelianos”.
Nessa obra, suas criticas
contundentes ao ideário de HEGEL e sua afirmativa de que a religião
não passaria de uma projeção dos desejos humanos e de uma forma de alienação,
foram de encontro ao que MARX já intuía e lhe deu o amparo teórico para
prosseguir suas lucubrações com esse viés.
A dialética
hegeliana “de cabeça para baixo”
Assim sendo, logo MARX concluiu que a “Dialética
Hegeliana” estaria de “cabeça para baixo” porque mostrava o “homem
como um atributo, ou um produto do pensamento, das ideias”, quando o correto,
na verdade, seria inverso, ou seja, ver “o pensamento como um atributo, ou um
produto do homem”.
A partir daí, MARX passou a
rejeitar peremptoriamente a ideia de que o “Espírito” ou “Mente do Mundo” seja a sua essência,
ou o sujeito do mesmo. Contudo, conservou de HEGEL a concepção
de que a “história é uma marcha”, uma “caminhada dialética”, já que o Mundo está em movimento contínuo graças aos contínuos
atritos entre os opostos (tese x antítese = síntese).
Prosseguindo em sua rejeição, ele passou a afirmar que
a origem da Realidade Social*
não
estaria nas ideias, na consciência que os homens têm dessa realidade. Estaria,
na verdade, na ação concreta, física, da humanidade, ou no “trabalho (ação)” do homem.
Afinal, segundo ele, a existência material vem antes
de qualquer pensamento e não há a menor possibilidade de se pensar em algo que
não existe concretamente.
NOTA do AUTOR – note-se nesse último
parágrafo uma das sementes do futuro Existencialismo.
NOTA do AUTOR – alguns discordam dessa
afirmativa de que é impossível pensar em algo que não existe concretamente,
pois alegam ser viável pensar sobre um sentimento como, por exemplo, a
“saudade”. Outros rebatem, dizendo que não se pensa sobre a “saudade em si”,
mas apenas sobre quem ou o quê a causou; reflete-se, portanto, sobre um
Ser, um Lugar etc. que são físicos, concretos, materiais.
A dialética materialista. O materialismo dialético.
Como se disse anteriormente, MARX disse jocosamente que a Dialética de Hegel estaria de “cabeça para baixo” e que era
necessário inverter-lhe o eixo, colocando na materialidade e não nas ideias
a gênese do “movimento histórico”
que é a essência do Mundo.
A partir dessa inversão é que se criou um dos conceitos
chaves de seu Pensamento: “A
Dialética Materialista”, ou “Materialismo Dialético”, que seguia parcialmente o figurino
hegeliano, mas com a diferença de que no seu caso as teses e antíteses são
fatos concretos, materiais e objetivos como, por exemplo, na situação abaixo:
Tese
= monarquia X antítese = burguesia
Síntese
= socialismo.
A Influência do Socialismo Utópico.
Na época de MARX,
costumava-se chamar de Socialismo Utópico o conjunto de doutrinas
(algumas
antagônicas entre si) que tinham em
comum as seguintes premissas:
1 – A base do comportamento humano é determinada pela moral
e pela ideologia.
2 – O desenvolvimento da civilização Ocidental já permitiria o aparecimento
de uma “nova era”,
na qual imperariam a harmonia e a justiça
social.
MARX foi severo em suas censuras aos Socialistas Utópicos em geral e, particularmente em relação aos franceses como o Conde de SAINT-SIMON com quem, aliás, manteve
uma acirrada polêmica.
Acusava-os de serem excessivamente ingênuos e
românticos. E de serem inertes e omissos, pois pouco ou nada faziam para se ter
um estudo sério e profundo sobre a conjuntura social que permitisse, numa
segunda etapa, a consequente alteração que fosse necessária.
Segundo ele, os Utópicos
eram pródigos em falar sobre como deveria ser a “Sociedade Ideal”, porém, eram mesquinhos em apontar as maneiras
efetivas que levassem àquela sociedade harmônica e justa.
Contudo, não obstante as suas criticas, MARX adotou, implícita ou explicitamente, algumas de suas
concepções, das quais se pode citar, a ideia de que o aumento na oferta de
produtos por obra da “Revolução
Industrial” permitiria maior conforto ao homem; ou, a noção de
que as “crenças ideológicas do indivíduo” influem em seu comportamento.
A Utopia Marxista
O termo Utopia
foi criado por THOMAS
MORUS OU MORE (Inglaterra, 1478 – 1535) e aqui será usado com um significado diferente do
pretendido original, mas consagrado pelo uso popular.
Originalmente o termo significava “lugar nenhum”, mas o estilo coloquial transformou-o em
sinônimo de “quimera”, “ideal”, algo extremamente
positivo, desejável, embora inatingível.
E para alguns, MARX mostrou-se
“utópico” ou ingênuo, ao supor que o homem poderia evoluir de seu egoísmo
animal para uma solidariedade angelical, ou pelo menos humanitária, que
permitiria o bem-estar geral.
Todavia, essa ingenuidade, para outros, não deve ser
vista apenas como algo negativo, pois foi esse “sonho idílico” que embalou – e ainda embala – as aspirações
de um vasto número de admiradores e de adeptos ao “Ideal Socialista”, permitindo com isso que continue a
existir uma alternativa à rudeza do Capitalismo.
E também, apesar de sua insuficiência, por ensejar o
avanço em algumas práticas e costumes que tiveram o mérito de suavizar em
alguma medida os horrores da miséria em vive o Proletariado sob o jugo da Burguesia.
Um dos exemplos mais
recentes dessa suavização pode ser visto no Brasil com a regulamentação da “Profissão
de Empregados Domésticos”, a qual, inobstante seus defeitos, busca tirar
desses (as) profissionais o antigo estigma da escravidão.
A Influência da Economia Clássica
Devido à importância que dava ao aspecto material como
formador e condicionante das relações entre os membros de um grupo de pessoas, MARX não titubeou em estudar com afinco as teorias econômicas ocidentais (desde as da
Grécia antiga até as que lhe eram
contemporâneas).
Acertadamente ele intuiu a necessidade de conhecer
sobejamente tais fundamentos para, num segundo momento, modifica-los em
consonância com o seu ideal de Justiça
Socioeconômica.
Dentre outros, mostrou-se admirador dos “Economistas
Políticos” britânicos, ADAM SMITH (Escócia, 1723–1790) e DAVID RICARDO (Inglaterra, 1772–1823), a quem, aliás, coube a sua predileção, pois segundo
suas palavras, ele seria “o maior dos Economistas clássicos”. Dele, MARX sorveu algumas ideias que posteriormente revisou e
reinterpretou.
Dessa reelaboração é que provieram, por exemplo,
conceitos como o da “Mais Valia”,
do “Fetiche” (ambas oriundas da “Teoria do Valor”, elaborada pelo inglês), da “Divisão
Social do Trabalho”, da “Acumulação
Primitiva” etc.
Contudo, o grau de influência que ambos, especialmente
Ricardo, exerceram sobre o Ideário Marxista nunca encontrou
consenso.
Eruditos “neo-Ricardianos”
consideram que há uma enorme semelhança entre o pensamento de seu guru e o de MARX, porém, os estudiosos do Marxismo minimizam essa similitude e apontam diferenças
cruciais entre os dois sistemas.
Metodologia
Uma critica recorrente que se faz à obra de MARX refere-se ao fato de que ele não criou e tampouco
seguiu, é óbvio, um método para
expor as suas reflexões sobre seus objetos
de estudo; ou seja, sobre as matérias que estudou:
Filosofia, Política, História, Sociologia etc.
Com efeito, MARX nunca se
preocupou em seguir um roteiro, preferindo consignar suas dispersas reflexões
em obras variadas.
Com isso, criou o seu próprio método, tão heterodoxo e
singular quanto suas ideias, e foi através do mesmo que
elaborou as suas criticas ao “Idealismo
especulativo de Hegel”, à “Economia
política clássica” e, principalmente, à injusta situação do proletariado.
Método que lhe permitiu sustentar a sua censura a HEGEL e seus
seguidores que ao criaram uma “dialética
mistificada” cuja intenção era explicar especulativamente* a história
mundial, como um exclusivo autodesenvolvimento da “Ideia** Absoluta”, abandonaram o estudo de outros fatores que também
seriam significativos para tal explicação.
NOTAS do AUTOR* – “tentaram explicar especulativamente”, ou seja, apenas
por meio de ilações, deduções, divagações, reflexões sem quaisquer dados
concretos que apoiassem essas “operações mentais”.
NOTAS do AUTOR** – autodesenvolvimento da
“ideia absoluta”, ou do exclusivo desenvolvimento mental, espiritual da humanidade.
Método que lhe ensejou a oportunidade de censurar os “Economistas clássicos”, que a seu ver
faziam parecer natural e desapegado do curso da história o “Modo de Produção Capitalista”, enxergando-o como se ele fosse
uma imposição inquestionável da
natureza; assim como a exploração que a burguesia praticava contra o proletariado. Pensadores que se apoiavam em um conceito abstrato
e absurdo, denominado de “Homo Economicus”,
eivado de sérios questionamentos acerca de sua correção. Pensadores da Economia clássica que, ademais,
recorriam amiúde às famigeradas “Robsonadas*”
para ilustrarem um suposto primarismo econômico do proletariado, o quê, ao cabo, justificaria a sua exploração** (sic) pelas outras classes sociais.
NOTA do AUTOR* – Robsonadas - neologismo derivado do nome próprio Robson Crusoé e alusiva às suas
narrativas sobre o escambo primitivo entre caçadores e pescadores
NOTA do AUTOR** – essa visão de que seria
justificável a dominação e a exploração de um homem por outro homem é filha do
antigo conceito do “Direito Divino”; ou seja, por razões desconhecidas
um suposto “Ser Supremo” escolhe a seu critério um indivíduo, ou um grupo
deles, para dominar e explorar os outros Seres, mesmo que os “exploradores escolhidos”
não tenham a menor qualificação para tanto. Assim, segundo essa “Lei”, o
felizardo não precisaria ser hábil, nem probo, nem
inteligente, nem generoso etc. Bastar-lhe-ia ter tido a sorte de nascer na “Classe
Social Correta” (sic).
Todavia, inobstante a discordância que mantinha de
suas teses, MARX não considerava os “Economistas Clássicos” como pessoas mal intencionadas. Afirmava
que a mistificação que faziam era oriunda do “Fetichismo à Mercadoria”,
ou seja, da “adoração
mística a um produto”. Um comportamento irracional, mas tão atrelado ao
espírito humano que acabou sendo considerado normal pela maioria.
E era em oposição a essa irracionalidade que MARX se colocava, enquanto propunha um estudo aprofundado,
sério e objetivo sobre a história, ou sobre a trajetória do
desenvolvimento das “Formas de
Produção” como organizadora das “Relações
Sociais”.
Apenas através desse conhecimento sólido e isento de
preconceitos, ele acreditava que seria possível alterar o que houvesse de
errado e se pudesse atingir a justiça e a harmonia desejada.
A Crítica da Religião
Ao contrário do que se pensa habitualmente, MARX não dedicou grande esforço na censura à Religião.
Pode-se até observar que ele a via com mais condescendência que intolerância.
Basicamente ele seguiu de modo mais atenuado, a
concepção do Filósofo FEUERBACH para quem a religião não expressaria a vontade,
ou a palavra, de nenhum “Deus”,
ou de qualquer outro Ser metafísico.
Não passaria, portanto, de uma mera criação humana. De uma fábula inventada
pelos homens, que, cônscios de sua fragilidade, buscariam no “Sagrado” algum consolo para as
suas fraquezas e fracassos, bem como “bodes expiatórios” que os isentasse da
responsabilidade por seus atos negativos. Afinal, é sempre mais fácil culpar a “Vontade de Deus” que assumir a
própria negligência, ou inércia, ou inabilidade pelos erros cometidos.
Portanto, a ideia difundida de que MARX e os seus
seguidores seriam inimigos ferozes dos religiosos
deve ser debitada mais à contundência de suas criticas de que à extensão
e insistência das mesmas.
Além, é claro, da falaciosa propaganda que a burguesia
fez sobre o tema, usando esse “falso perigo” como um instrumento a mais para
aterrorizar o inculto populacho que via na religião a sua única “válvula de
escape” para as frustrações do cotidiano
e que por isso temia perdê-la.
Em relação à contundência referida, é possível ver
alguns exemplos da mesma no texto denominado Crítica da Filosofia do Direito de Hegel. É nele que MARX consignou expressões que se tornaram célebres como,
por exemplo:
“a Religião é o ópio do
povo”; “é o suspiro da criatura
oprimida”; “o coração de um Mundo sem coração”; “é o Espírito de uma situação carente
de Espírito”.
MARX acreditava que as pessoas também se apegam à religião
porque desejam um lugar em que o “eu”
não seja desprezado, ou alienado. E
nada melhor que um “Deus bondoso” para aceitar esse “eu”, que noutros campos
enfrenta continuas restrições por acharem-no “pobre”, “feio”, “medíocre” etc.
Porém, ele alertava que essa fuga é tão inútil, quanto
a encontrada na embriaguez, ou com o uso de entorpecentes e similares, haja
vista que as restrições que a “Classe Dominante” impõe aos excluídos permanecem
inalteradas e a quimera religiosa, ao cabo, acaba servindo apenas para que o proletariado
afogue-se cada vez mais em sua ignorância e na resignada miséria que isso lhe
acarreta.
Acaba servindo apenas como pretexto para que o
indivíduo deixe de lutar para sanar as injustiças, resignando-se a uma
falaciosa esperança de felicidade e recompensa no além-túmulo.
Todavia, para ele, o fim puro e simples da religião não seria uma prioridade e nem a
resposta efetiva para os problemas sociais. Apenas a mudança total nas questões
de ordem social e política é que poderiam elevar as condições de vida e a
conscientização do indivíduo, o qual, numa fase posterior e de modo natural
passaria a ver a inutilidade daquela crença dogmática e alienante e o quanto
ela foi utilizada para conservá-lo cativo da injusta distribuição dos recursos
da sociedade.
NOTA do AUTOR – o (a) leitor (a) comprova
por essas últimas definições, a sua citada condescendência. Embora ele visse a religião
como uma reles e tola fantasia, podia compreender a necessidade humana que a
faz existir.
A Revolução
Apesar de ter recebido o epíteto de “Teórico da
Revolução”, MARX não consignou em suas obras
qualquer definição, ou conceito, especifico sobre o tema.
Ofereceu apenas descrições e considerações acerca das Revoluções Francesa, Inglesa e Estadunidense,
bem como projeções e prognósticos para as eventuais revoluções futuras.
E um claro exemplo desses “Prognósticos Históricos” pode ser
encontrado em sua obra intitulada “Contribuição para a Crítica da
Economia Política”, onde ele afirma que: “numa certa etapa do
seu desenvolvimento, as “Forças Produtivas” da sociedade entram em contradição
com as “Relações de Produção” existentes (ou, o que é apenas uma expressão jurídica delas) e com as “Relações de Propriedade”, pois,
estas relações transformam-se em grilhões das primeiras ensejando,
então, uma época de revolução social”.
A Revolução e a violência
MARX considerava que o grau e a intensidade da violência
ocorrida durante a Revolução, estão sempre em conformidade com a maior ou menor
truculência com que o Estado reage contra quem lhe ameaça.
Por isso, segundo sua ótica, a existência da violência
decorre mais da reação do Estado do que da natureza em si da revolta. Afinal, o
“Estado” é feito e composto por homens,
e como já se disse, o instinto animal que nos habita é o que nos força a reagir
contra tudo aquilo que nos parece ser uma ameaça. Logo, é totalmente
previsível que o Governo use a coerção e a repressão ao máximo possível, para
salvaguardar os seus interesses e
para manter a organização em que se assenta o seu “Poder Político”.
Dessa sorte, não resta alternativa à insurreição que não seja responder
violentamente.
NOTA do AUTOR – e é justamente por conta
disso que ocorrem os excessos de ambos os lados.
O “Contrato Social” inexistente e a violência
Para MARX, ao contrário do que
imaginavam os “Contratualistas”, o “poder político do Estado” não provém de um “Contrato
Social”. Não emana de um acordo voluntário, ou de um consenso entre os
indivíduos de determinado agrupamento.
Na verdade, é uma determinada Classe que o conquista e o mantém através de ardilosidades,
de falcatruas e da violência explicita,
através da Policia, do Judiciário, das Forças Armadas, milícias semioficiais
etc. e da violência camuflada, como regulações
absurdas, burocracia sufocante, impostos escorchantes etc. Violências que não hesita em usar contra as “Classes
Exploradas”, as quais, por sua vez, quando se rebelam devolvem-na inevitavelmente.
Todavia, para MARX, embora a
violência seja indissociável da Revolução,
a mesma não deve se transformar em um instrumento de aniquilação total. Não
deve ser sinônimo de “reconstrução
a partir do zero”, pois como ele argumenta em sua obra “Crítica
ao Programa de Gotha”, a instauração de um novo regime só será possível se ele for sustentado pelas instituições
pré-existentes, obviamente que com as devidas correções.
Por isso, a Revolução
Proletária ao instaurar um novo “Regime
Sem Classes” só poderá lograr êxito se concluir satisfatoriamente um
período de transição que ele chamou de Socialismo.
A Crítica ao Anarquismo
Como se sabe, o Anarquismo
é um sistema filosófico que prega o fim do Estado e doutras instituições que normatizam a vida do homem,
tais como a família, a Igreja, o
Partido Político etc. Argumentam seus adeptos, que todas as formas de
governo interferem negativamente na liberdade individual e que por isso devem
ser substituídas pela cooperação entre os cidadãos.
Para MARX, essa visão ingênua de se
acabar com o Estado “por decreto” não se sustenta por
sua própria ingenuidade. Por se imaginar utopicamente que o homem deixe de ser
comandado pelo seu egoísmo animal, para se tornar um Ser orientado apenas pelo sentimento fraternal.
Por isso, para ele não se deveria propor o fim do Estado, mas, sim, o fim das iníquas
condições socioeconômicas que o fazem ser necessário enquanto instrumento de
opressão que a “Classe Dominante”
utiliza a seu bel prazer, como ferramenta de pressão e sempre com o intuito
final de preservar o poder e as
benesses do mesmo.
Para MARX, acabando-se com a injustiça
social, o Estado deixará de existir naturalmente.
MARX, PROUDHON e o Anarquismo.
O Filósofo PROUDHON,
em defesa do Anarquismo, escreveu uma importante obra intitulada “A Filosofia da Miséria”.
Porém, pelas razões expostas, MARX discordou dessa tese e
compôs uma antítese que jocosamente chamou de “Miséria de Filosofia” em
alusão ao suposto “primarismo intelectual” que norteariam as propostas anarquistas.
Nessa obra, MARX, além de censurar o pensamento Anarquista de PROUDHON, também crítica
o “Blanquismo*” por sua
visão elitista sobre o Partido
e, também, por sua tendência autoritária e superada.
NOTA do AUTOR – *Blanquismo, neologismo derivado do nome próprio de LOUIS BLANC, socialista e anarquista
francês.
E ainda nessa linha de contraponto, MARX se posiciona a favor do “liberalismo político e econômico”, mas tomando o cuidado de
esclarecer que tal regime não seria a solução definitiva para o proletariado, servindo apenas como sustentação
para o processo de maturação das Forças
Produtivas (ie, os Trabalhadores) e de homogeneização da condição do proletariado em
todo o Mundo. Homogeneização, ou uniformização que seria gerada colateralmente
pela internacionalização do Capital.
E de fato o seu prognóstico vai se concretizando com a
“Globalização da Economia”
e com as empresas “Multinacionais”
que geram a uniformidade no comportamento de seus empregados e de seus
clientes nas mais diversas regiões do Globo.
Não é raro, por exemplo, que um trabalhador hindu
tenha os mesmos desejos que um brasileiro, ou um estadunidense. E não será raro
que num Futuro próximo as demandas dos mesmos sejam tão iguais que não se
poderá mais diferenciá-los pela nacionalidade.
Por linhas que talvez não tenham sido previstas pelos “Capitalistas”,
vê-se que paulatinamente forma-se uma Consciência
de Classe no proletariado internacional.
Como se fosse por ironia da história, observa-se que é
o próprio Capital que está promovendo e materializando o slogan marxista: “Trabalhadores
do Mundo, uni-vos!”.
A Práxis
Termo oriundo do idioma grego cuja significação
original remete à ideia de ação, de fazer, de atividade
prática.
No Marxismo, significa o conjunto de
ações humanas que tendem a criar as condições indispensáveis para a plena
vigência da sociedade, principalmente no que se refere à produção física,
material. À atividade concreta.
Destarte, a palavra Práxis se torna o
título de um dos fundamentos mais importantes da doutrina de MARX, haja vista que a mesma afirma categoricamente que é
a ação humana que cria, ou que
produz a história e a base do Marxismo é justamente o argumento de
que a historia é materialista e que a realidade não se altera por moto*
próprio, ou seja, sem que haja a intervenção do homem para que as mudanças
ocorram.
NOTA do AUTOR – “Materialista” porque é feita de fatos concretos,
materiais, físicos e não de ideias abstratas.
NOTA do AUTOR - A esse propósito*, ele diz em sua obra “O 18 Brumário de Luís Bonaparte” que: “não é a Realidade que move a si mesma, mas
comove os atores (ie. sensibiliza os homens, levando-os à ação). Trata-se sempre de um
drama histórico...”.
Mas esse materialismo
não deve ser visto como um determinismo* histórico que resulte num materialismo mecânico, ou positivista.
NOTA do AUTOR – “Determinismo” no sentido de que algo ou alguém determine que a história
aconteça de tal modo
Tal hipótese, em verdade, estaria em completa oposição
à concepção Marxista do “materialismo Dialético”,
no qual, os atritos entre os fatos materiais, concretos, físicos é que geram as
situações políticas (tese x antítese = síntese).
Materialismo dialético ou histórico
que também poderia ser entendido como uma “Dialética da Realidade – Idealidade Evolutiva” onde as relações
entre a realidade (concreta) e as ideias, ou concepções
acontecem e se juntam precisamente na Práxis.
Afinal, sendo a história um produto das ações humanas
e sendo as ideias um produto
das circunstâncias materiais, a meta a ser atingida é fazer com que a história seja “Lógica e Racional”.
Que as ações humanas sejam coerentes e justas e que
por isso criem condições materiais favoráveis, as quais, por sua vez, proporcionarão o surgimento de ideias também “Lógicas, Racionais e Favoráveis”.
Assim, com essas reflexões, MARX encerra suas teses
sobre FEUERBACH reafirmando que a sua filosofia não se esgota em interpretar o Mundo, buscando
transformá-lo efetivamente.
Afinal, a interpretação ocupa-se “apenas” de estudar, de pensar,
de refletir sobre o Mundo que já existe, enquanto que a pretendida Ação Revolucionária será capaz de produzir a transcendência,
ou ultrapassagem desse modelo de Mundo.
A Mais Valia e o Exército de Reserva
O conceito da Mais Valia foi empregado
por MARX
para explicar a obtenção de lucros espúrios no sistema “Capitalista”.
Vale lembrar que “Mais Valia” é o valor extra da
mercadoria, ou seja, a diferença entre o que o empregado produz e o que
efetivamente recebe. É aquilo que o patrão deixa de lhe pagar e que ele não
cobra, não exige.
Mas por que o proletariado não cobra o que lhe seria
de direito?
A resposta a esta indagação vem na forma de um dos
outros pontos importantíssimos da doutrina Marxista. Para o filosofo tal
cobrança não se efetiva porque o proletário sabe que será prontamente demitido
e substituído por um dos desempregados que lotam constantemente as fileiras do
chamado “Exército
de Reserva”.
Exército de Reserva que nada mais é que um “estoque de não de obra” ie, um
grande contingente de pessoas desempregadas e desesperadas por qualquer emprego
e qualquer salário, que a burguesia
mantém para usar como instrumento de coação contra aqueles poucos que ousam
reclamar da exploração que sofrem.
Como não poderia deixar de acontecer, esse seu
argumento encontrou ácidas oposições, dentre as quais a de BENEDETTO CROCE (1866-1952,
Itália) que afirmou ser “O Capital”
um texto que não poderia ser considerado “científico”, mas apenas uma obra “moral” (ou moralista), cujo único objetivo seria caracterizar a “Sociedade
Capitalista” como perversa e injusta, ao contrário da “Sociedade Comunista”
que concretizaria o ideal de plena justiça social.
Alegava, ainda, que essa carência de “cientificidade”
poderia ser observada facilmente só pelo fato de o ideário Marxista não ter
qualquer apoio da “racionalidade lógica e
cientifica (sic)”.
GRAMSCI e vários outros
eruditos saíram em defesa da tese de MARX
afirmando que a opinião de CROCE não passaria de reles sofisma, posto que os conceitos
de “Mais Valia” e de “Valor” são idênticos.
Ou seja, ambos denunciam a diferença
entre o valor da mercadoria produzida e o valor pago à “mão de obra” que a produziu.
E para consubstanciar essa defesa, eles insistiram em
lembrar que a tese de MARX derivava diretamente de uma celebrada teoria do
economista DAVI
RICARDO (1772-1823, Inglaterra), que não enfrentou
qualquer censura ao publicá-la, porque à época ela não representava nenhum
perigo à burguesia, já que não
havia a menor conscientização entre o proletariado acerca da exploração que
sofria.
Aliás, naquela ocasião, a tese de Ricardo foi considerada
como uma “constatação puramente
objetiva e cientifica de uma realidade econômica”. Ou seja, amplamente
respaldada pelos rigorosos critérios racionais, lógicos, científicos e positivistas.
Dessa sorte, entre críticas e elogios, a tese passou
para a história e se firmou como uma das bases do pensamento
Socialista.
O Manifesto Comunista
Enquanto estudava filosofia acadêmica na universidade de Berlim, MARX conheceu FRIEDRICH ENGELS (Prússia,
1820-1895), que além de se tornar um
amigo fraterno por toda a vida foi, também, o mecenas e o coautor de vários
textos de MARX, dentre os quais, deste que marcou a estreia da dupla
junto ao grande público.
As ideias expostas nesse livreto, com cerca de quarenta
páginas, já viviam nas mentes dos filósofos desde as décadas de 1830 e 1840 e
eram transcritas aleatoriamente por MARX em
manuscritos privados. Posteriormente, ambos compilaram-nas e as usaram como a
base do texto final de O Manifesto.
Nele,
explicitaram os valores, as ideias, os ideais, os conceitos, os planos políticos
etc. do Comunismo, sempre com
o cuidado de usarem uma linguagem coloquial e pragmática, já que para ambos,
como se disse, a função da filosofia não era explicar o mundo, como alegavam os antigos, mas sim reformá-lo e por isso qualquer leitor
deveria compreender o que propunham.
NOTA do AUTOR - Comunismo que à época não passava de um sistema proposto e adotado por um
reduzido número de pessoas, geralmente oriundas de regimes socialistas radicais, que existiam na Alemanha.
Diz o Manifesto que a sociedade
reduzira-se a duas classes socioeconômicas:
a burguesia1
e o proletariado2
e que essa estrutura pôde existir com relativa tranquilidade, inobstante a tensão entre as classes e algumas
revoltas pontuais, até que os seguintes acontecimentos alterassem a estrutura vigente:
1. O
descobrimento das Américas.
2. A abertura
dos mercados indiano e chinês aos produtos fabricados em série com o advento da
“Revolução Industrial”
e o consequente êxodo rural que esvaziou o poder da “nobreza feudal” e ensejou o
surgimento de um proletariado
urbano, mais aglomerado e cônscio de sua miséria e de sua capacidade de luta.
3. O próprio
desenvolvimento da Indústria e do Comércio que decretou o fim do trabalho artesanal, já que este não
era mais capaz de suprir a demanda sempre crescente. Aliás, como por ironia, esse fim causou a primeira
das contradições do Capitalismo, pois ao eliminar a presença do artesão, também eliminou um “Capitalista”
(mesmo
que de pequenas dimensões), que, a partir de então, tornou-se um simples operário e um membro a
mais do proletariado.
Prossegue
o “Manifesto” analisando a conjuntura resultante desses fatores e propondo os
meios e os métodos para a efetiva vitória do ideal socialista.
Desse modo, graças à Linguagem acessível e à ênfase
dada aos assuntos Políticos e Econômicos que atingiam primeiramente os
estômagos e só depois os cérebros abstraídos, o Manifesto tornou-se popular em pouco tempo, mas por isso, passou
a ser mais valorizado como tratado de Filosofia
Política, que como obra de inegável valor literário. Porém, também
no aspecto de pura literatura nada fica a dever a seus similares, pois além das
teses já citadas, também aborda outros temas com clara e rara erudição.
E o fato de ter tornado acessível ao público em geral ideias
que antes ficavam restritas às elites intelectuais e/ou sociais, acrescenta-lhe
um brilho especial.
E, mais importante, alerta para a possibilidade de se
corrigirem os equívocos e as injustiças, pois não existe nada predeterminado por um suposto Deus, ou por uma
suposta “Lei da Natureza”. Demonstra com clareza que a correção das iniquidades
depende apenas da ação humana.
Por tudo isso, o “O Manifesto” tornou-se um divisor de
águas na cena política do mundo.
Pela primeira vez um texto alardeou de forma clara e
direta que a burguesia tinha,
sim, que temer “o espectro que avança sobre a Europa”.
E que os antigos conceitos, as velhas noções e os
valores do Passado seriam irremediavelmente rompidos.
Popularizando a ideia de que seria possível modificar as
Sociedades, alertou que o Sistema Capitalista
não é apenas injusto e explorador, mas também inerentemente instável e sujeito
a ocorrência de frequentes crises comerciais e financeiras, as quais seriam cada vez mais
severas e deletérias para a “Classe Explorada”,
a qual, sem alternativa, reagiria com crescente radicalização no ideário
da revolução. Que o progressivo empobrecimento da “Força de Trabalho”, ou proletariado,
resultará no aumento da agressividade de suas respostas e o configurará como um
efetivo segmento social genuinamente revolucionário.
NOTA do AUTOR - aliás, as corriqueiras manchetes dos jornais atuais sobre o desemprego,
protestos populares, aumento na violência etc., confirmam novamente o acerto
das previsões de MARX. No Brasil atual essa
faceta revolucionária ainda não tem qualquer conformação estruturada e se expressa
apenas através do aumento crescente no banditismo; mas, já se observa alguns ensaios de organização, ainda que de
modo precário, através da criação de grupos como os chamados “Comando Vermelho”, no Rio de Janeiro, “PCC”, em São Paulo, dentre outros.
NOTA do AUTOR: Burguesia1 – palavra derivada do francês
“burgeois” e que significa etimologicamente “o habitante do Burgo, ou vila ou
cidade”. Em Política passou a significar o indivíduo que é proprietário dos “meios de produção”; ou seja,
das máquinas, das terras, das fábricas, do Capital etc. O homem que ascendeu
socialmente e passou a ocupar, graças à sua fortuna, o espaço que antes era
destinado aos nobres, ao alto clero, à elite militar etc. Proletário2
– etimologicamente significa o indivíduo que gera uma prole. Em Política essa
capacidade de gerar filhos passou a significar a capacidade de gerar mais mão de obra, que seria agregada
à sua força de trabalho. É o indivíduo que não possui “os meios de produção” que são indispensáveis para se produzir
algo e que dispõe apenas de sua “força de trabalho”, ou seja, de sua capacidade de
trabalhar, que vende em troca de um salário, ou ordenado.
A Classe Revolucionária
como maioria.
MARX também observa outro aspecto que talvez seja decisivo
para a vitória Comunista, pois pela primeira vez na história a “Classe Revolucionária” representará a
maioria da humanidade.
Se antes a grande “massa de explorados” não podia ter
qualquer “consciência revolucionária” em razão das enormes pressões físicas e
metafisicas que sofria, o proletariado atual começa a conquistá-la através das
brechas que surgem no edifício do Capitalismo.
Brechas que permitem que mais jovens proletários
estudem (ainda que em condições inadequadas) e se tornem conscientes; e que continuam, ao propiciar que outros mais vivam por mais tempo
graças à abundância propiciada pelo desenvolvimento da tecnologia; bem como, que mais pessoas se informem e se comuniquem graças à popularização
dos telefones e da Internet, uniformizando assim as demandas de quase todos os
povos da Terra.
Ademais, para o Filósofo, outra motivação para que “classe
oprimida” faça a insurreição vem do fato de que a crescente complexidade do processo de produção (à medida que a tecnologia avança) torna o desemprego mais agudo, pois a robótica substitui com vantagens,
os antigos trabalhadores que, então, serão forçados a lutarem para sobreviverem.
O Capital – “Das Kapital”
Das
Kapital é seguramente a
criação máxima de MARX, que para realizá-la contou com a inestimável ajuda
de Engels, o coautor dessa
obra-prima. Nela, os Filósofos fazem uma extensa, profunda e elaborada análise
da sociedade Capitalista.
É predominantemente um livro sobre “Economia Política”, mas a sua
abrangência estende-se por outras áreas, quando, então, MARX discorre também
sobre a Cultura, a Sociedade, e a Filosofia.
É um trabalho tanto analítico quanto sintético, pois
traz análises minuciosas sobre determinados temas, enquanto oferta inspirados
resumos sobre outros assuntos, apresentando vários estilos literários. É,
simultaneamente, uma obra crítica, descritiva, científica, filosófica e, de
certo modo, romântica por embutir entre tantos conceitos técnicos a esperança
de se construir um Mundo mais justo e harmônico.
Decerto que a sua leitura é difícil, pois é inegável
que a sua linguagem é insípida e complexa, mesmo que não seja tão especulativa
e abstrata quanto nas obras de HEGEL.
Não é um livro para ser apenas lido. Deve ser visto como um objeto de estudo,
cuja recompensa vale à pena, pois a sua compreensão traz um acréscimo de Saber cujo valor é inestimável.
“O Capital”
é a principal fonte de estudo para que o proletariado atinja a desejada “Conscientização de Classe”. Só
através da análise inovadora, profunda e correta que MARX e ENGELS nele fizeram acerca
da realidade da “Classe Subjugada”, é que a mesma
poderá enxergar além da ideologia dominante
que a Elite lhe impõe.
E só assim é que poderá obter uma base sólida para as
suas reivindicações. Para a sua Luta
Política.
NOTA do AUTOR - Alphonse de Waelhens (Filósofo belga, 1911 – 1981) afirmou sobre a abordagem que MARX faz acerca dos fatores
econômicos para a formação das Sociedades humanas que: “o Marxismo é um esforço para ler, por trás da pseudo-imediaticidade
do Mundo econômico reificado (ou coisificado, ie, tudo é tratado como se fosse uma
simples coisa, inclusive o Ser Humano), as relações inter-humanas que o edificaram e se
dissimularam por trás de sua obra”.
NOTA do AUTOR - apesar do sucesso que alcançou e do prestigio de que ainda goza, “O
Capital” é considerada, por alguns puristas, como uma obra incompleta
no que tange à autoria de MARX, já que apenas o primeiro
volume foi publicado enquanto ele vivia. Os outros Tomos só foram organizados e
publicados por ENGELS após a morte do companheiro.
Outras Obras de MARX
Além das obras-primas O Capital e O
Manifesto Comunista que vimos com mais acuidade, MARX escreveu outros trabalhos de enorme importância.
Na sequência falaremos brevemente sobre cada um deles.
A saber:
A Ideologia Alemã – nele, MARX apresenta
com minúcias os pressupostos de seu Sistema
Político e Filosófico.
Questão Judaica – onde MARX expõe as suas críticas às religiões, afirmando que
não se devem apresentar questões
humanas como se fossem teológicas.
Deve-se, sim, fazer o contrário, ie, mostrar que as questões teológicas não passam de simples
questões humanas. Também
afirma que a ótica correta a ser empregada seria ver as religiões como um mero
reflexo do pensamento humano sem que exista qualquer coisa de Sagrado,
ou de Divino nas mesmas, pois, afinal, elas são apenas e tão somente
fantasias que o homem faz de si mesmo, o que, de certo modo, representa a mísera
condição a que ele é submetido.
Crítica ao Programa de Gotha – aqui o Filósofo faz uma extensa e sistemática
apresentação da sociedade Socialista. Além da
excelência literária, é possível notar o esforço que MARX faz para se afastar de qualquer ranço de “Futurologia”, já que ele não a
considerava uma ciência crível.
A Guerra Civil na França – MARX ultrapassa nesse texto, as
suas tendências “jacobinas” e
defende com vigor a tese de que só com o fim do Estado é que o proletariado
ofertará a si próprio as condições necessárias para manter-se no “Poder”
recém-conquistado. Também afirma que o fim do poder estatal
levará à situação do “povo em armas”, onde a própria população
encarrega-se da manutenção da ordem e da segurança pública, pois o “monopólio da violência” que havia
sido delegado ao Estado sucumbirá com o mesmo.
O 18
Brumário de Luís Bonaparte – aqui MARX desenvolve
uma profunda análise sobre o “terror
da burocracia” e comenta a questão do campesinato como aliado do
operariado na revolução comunista (tese que posteriormente,
grosso modo, foi adotada por MAO TSÉ
TUNG, na Revolução Chinesa).
Além disso, faz uma profunda investigação acerca do papel dos Partidos Políticos no âmbito da sociedade e comenta com minúcias a
essência do “bonapartismo”.
Epílogo
Em 1954, o Partido
Comunista Britânico construiu uma lápide com o busto de MARX sobre sua tumba, que até então nada tinha como
ornamento. Na pedra, além de uma citação de FEUERBACH,
escreveram:
“Proletários de todos os países, uni-vos!”.
O jargão que se tornou a
marca icônica do pensamento de um dos maiores filósofos que o mundo produziu é
a síntese perfeita para os sonhos desse gênio alemão que ousou acreditar na
humanidade.
r
Produção e divulgação de TANIA ALBUQUERQUE, rien limitée, do Rio de Janeiro, no inverno de 2013
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