terça-feira, 10 de setembro de 2013

NIETZSCHE, Friedrich - Filósofos Modernos e Contemporâneos




NIETZSCHE, FRIEDRICH
1844 – 1900
Humano, demasiado humano.
Deus Morreu!
O Homem é algo a ser superado!
O Tele-evangelismo atual e NIETZSCHE.

Friedrich NIETZSCHE nasceu na Prússia, no seio de uma família religiosa que seguia os cânones da igreja Luterana, na qual o seu pai e os seus tios eram Ministros.

Órfão de pai ainda na primeira infância foi criado pela mãe, pela avó e pelas tias, mas nem essa presença feminina majoritária foi suficiente para suavizar a sua personalidade, cuja introspecção impediu que gozasse de amizades e de convívio social.

Aluno brilhante, aos 24 anos de idade se tornou Professor na universidade de Basel, onde conheceu o compositor Richard Wagner (1813 – 1883, considerado o maior compositor alemão) que influenciou decisivamente o seu ideário, até que o antissemitismo do maestro causasse o rompimento entre ambos.
Em meados de 1870, contraiu difteria e depois da enfermidade nunca mais recuperou a saúde completa. Por isso, teve que renunciar ao seu cargo de Professor em 1879 e peregrinar durante uma década, por toda a Europa, em busca de cura para seus males.

Porém suas tentativas foram baldadas e em 1889, quando tentava evitar que um cavalo fosse chicoteado, desmaiou em plena rua e sofreu um tipo de colapso mental que agravou seu estado e o levou à morte, aos 55 anos de idade.

Sistema revolucionário e os principais livros.

NIETZSCHE legou ao mundo um sistema filosófico revolucionário. Com ele, ideias que antes não eram sequer ventiladas (como a inexistência de Deus, por exemplo), ganharam um ordenamento de tal profundidade e coerência que seguramente abriram o caminho para que outros sistemas de pensamentos vingassem pouco tempo depois. O Existencialismo é o exemplo mais célebre dessa abertura.

Suas teses e seus argumentos foram expostos em vários livros e textos esparsos. Em relação aos primeiros, citaremos a seguir, aqueles que são considerados suas obras-chave. Em relação aos segundos, não adentraremos em minúcias por questão de espaço, mas sugerimos a pesquisa e o estudo de suas interpretações sobre as teorias dos “Filósofos Pré Socráticos”, pois nelas estão concentrados vários de seus princípios.

1.   O Nascimento da Tragédia, 1872.
2.   Assim falou Zaratustra, 1883 – 1885 (sobre o qual nos debruçaremos com mais ênfase).
3.   Para Além do Bem e do Mal, 1886.
4.   Crepúsculo dos Ídolos, 1888.

Na sequência analisaremos os diversos temas que compõe o mosaico de seus Pensamentos:

O ideário.

Na antiga Grécia PLATÃO afirmava que o mundo verdadeiro era o chamado “Mundo das Ideias”. Um “local” imaterial, metafísico, onde estariam os “modelos” de todas as “coisas” e “Seres” que existem materialmente, os quais, justamente por isso, não passariam de cópias grosseiras e imperfeitas daqueles modelos, ou moldes.

Para chegar a essa conclusão é certo que o mestre grego recorreu aos conhecimentos que sorveu no Hinduísmo, durante a sua temporada de estudos na Índia. Afinal, como é sabido, aquele sistema filosófico e religioso baseia-se na supremacia do campo espiritual sobre o material.
E a teoria ganhou tantos adeptos que, com o tempo, passou a ser considerada como uma Verdade Absoluta. 

Principalmente depois de ter sido encampada pelo Cristianismo, que a catapultou para todo o Ocidente e fez da mesma a base de toda cultura europeia e dos territórios colonizados.

Desse modo, por milênios acreditou-se que:

1.  O Cristianismo está correto quando diz que tudo que existe no mundo de agora, físico, concreto, material é menos importante que aquilo que está no Céu, ou no “Mundo após a morte”.

2.  E também está correto quando prega que devemos nos afastar daquilo que parece ser importante nesta vida, pois é um falso brilho. Que devemos tentar transcendê-la através da negação da mesma. Ou seja, através do ato de negar-se à satisfação dos desejos físicos (fome, sede, sexo, luxo, dinheiro, conforto etc.).

Essas exortações ainda são repetidas com frequência em nossa época, tanto por motivos Católicos (e assemelhados), quanto Budistas (e assemelhados) e/ou Filosóficos (no campo da ética, patriotismo e outros semelhantes).

Triunfar sobre as necessidades e vontades do próprio corpo é um desejo perseguido pelos homens das mais diversas tendências filosóficas e religiosas.

Dos monges budistas, hinduístas e cristãos trapistas (e assemelhados) que fazem do ascetismo um estilo de vida e buscam nos votos de pobreza a Salvação da Alma; até os Filósofos como Schopenhauer* que afirmaram categoricamente:

Querer leva ao Sofrimento!

NOTA do AUTOR – antes que o leitor mais atento teça suas críticas devo reconhecer-lhe a mais completa razão, haja vista que o pensamento de SCHOPENHAUER é todo calcado no Hinduísmo, principalmente nas UPANISHADS, o que teoricamente o invalidaria como exemplo. Contudo, citei-o pelo fato do mesmo representar o pensamento ocidental de forma absoluta e, também, pelo fato de que a sua teoria, com o sentido inverso, foi de fundamental importância para que NIETZSCHE obtivesse sucesso com as suas teses. Se para o primeiro, “Querer Viver” era a causa da “Dor”, para o segundo era o motivo de prazer.

O ideal acético e o interesse da Elite

Inobstante os vários formatos que a idealização ascética assumiu, o fato é que ela sempre recebeu importantíssimo apoio de todos aqueles* que não querem dividir suas posses e alardeiam até o convencimento, que a renúncia é uma virtude que deve ser buscada pelos puros**. É claro que buscam tal convencimento não por motivos nobres, mas apenas como um reforço sobrenatural de amedrontamento para evitar que os puros** avancem sobre suas posses e interesses.

NOTA do AUTOR - * as Elites econômicas, religiosas, políticas e militares. ** geralmente os indivíduos mais pobres e por isso mais ignorantes da população que são propensos a acreditarem em lendas religiosas e/ou místicas.

Além da habitual coerção física e financeira, utilizam esse método espúrio de lavagem cerebral para que os despossuídos creiam que a miséria em que vivem é, ao cabo, um privilégio (sic).

E os puros”  não hesitam em seguir tal publicidade, pois nela também está embutida uma promessa que lhes é de suma importância: a esperança de que as suas mazelas sejam recompensadas, as injustiças que sofreram sejam corrigidas e que, no futuro ou no pós-morte, sejam felizes.

Se no Presente o sufocamento dos desejos e das vontades os livra dos padecimentos das frustrações advindas pela não consecução dos objetivos, a esperança vindoura os inspira a suportar as injustiças, humilhações e penúrias que sofrem no dia a dia sem se rebelarem. Ajuda-os a se conformarem em viver, segundo NIETZSCHE, “a moral do escravo”.

Todavia, apesar dessa simbiose de interesses entre exploradores e explorados acerca da virtude da renúncia, a partir do inicio do Iluminismo essa concepção começou a ser questionada. E nos séculos seguintes, o avanço do Racionalismo tornou tal questionamento cada vez mais agudo e disseminado, pois já se duvidava com muito mais frequência de uma Moral e de uma Ética, cuja base era apenas uma lenda mitológica, ou seja, a Religião.

E esse movimento crítico, de crescimento regular e vigoroso, encontrou em NIETZSCHE a sua expressão mais erudita.

Deus morreu! O fim das “verdades absolutas”.

Juntamente com inúmeros outros pensadores, NIETZSCHE não permitiu que mitos e fábulas continuassem sendo consideradas comoverdades inquestionáveis.

E graças à crescente validação desse Pensamento Lógico e Racional, em contraponto ao obscurantismo das mitologias e religiões, pôde-se decretar com segurança: Deus morreu!

É claro que o filósofo referiu-se à morte das antigas normas, regras, leis e valores que se apoiavam nas fábulas e nos mitos divinos. Referiu-se, à morte do “Deus” inventado pelos homens, pelas religiões e que era como ainda é, um instrumento usado para controlar com ameaças de “castigo eterno” aos insatisfeitos e contestadores; e para dar esperanças de “recompensas além-túmulo” aos desvalidos, aos fracos, aos injustiçados e aos outros “escravos" conformados em obedecer aos ditames das elites. Morreu o “Deus” que fora construído pela carência humana em perpétua necessidade de ilusão como contrapartida à crueza da vida. Morreu o “Deus” que não resistiu à lúcida coragem dos que não hesitaram em pensar com a verdade da lógica racional.

O homem é uma corda estendida

O homem é uma corda estendida entre o animal e o super-homem. Uma corda sobre o abismo, em “Assim falou Zaratustra”.

A tese nietzschiana de que o homem é algo a ser superado foi apresentada pelo filósofo em sua obra mais afamada, Assim Falou Zaratustra, que foi escrito durante os anos de 1883 e 1884 em três partes distintas  e mais um apêndice redigido em 1885. 

Foi uma obra escrita rapidamente, sendo, por exemplo, que a conclusão da primeira parte não custou mais que alguns dias. Porém, mesmo com essa ligeireza, o filósofo obteve êxito e conseguiu expor com clareza e consistência a sua teoria desafiadora.

E além dessas qualidades literárias, contribuiu para esse sucesso o recurso de romancear o texto filosófico, pois ao se utilizar dessa prerrogativa, NIETZSCHE conseguiu dar um “rosto” ao que seria estritamente abstrato e, por isso, de difícil compreensão.

Desse modo, o seu objetivo de lançar uma censura vigorosa contra o modo de pensar tradicional foi plenamente atingido. Principalmente no tocante às seguintes concepções:

1.   A noção equivocada que temos do “homem”, ou da “natureza humana”.
2.   A ideia que fazemos de Deus.
3.   As ideias que concebemos acerca da Ética e da Moral.

Noutro livro, o pensador já havia afirmado que se deveria “Filosofar com um martelo” numa clara alusão à necessidade de estilhaçar as antigas ideias filosóficas, especialmente em relação àquelas citadas acima.

E, com efeito, em Assim Falou Zaratustra ele foi contundente em suas criticas, as quais se revestiram de seu estilo impetuoso e febril para ganhar maior ressonância. E tal foi o rigor empregado que para muitos as suas afirmativa aproximavam-se mais de “Profecias do que de Filosofia, como veremos na sequência.

Zaratustra inicia sua Pregação.

Zaratustra é um nome alternativo dado ao profeta Zoroastro, que teria nascido na Pérsia (atual Iraque, em c.628–551AEC) e teria fundado o Zoroastrismo, que ainda hoje se constitui como sólida religião, cuja tese central é a luta entre o BEM e o MAL.

Mas, o “Zaratustra de NIETZSCHE coloca-se para “além do Bem e do Mal”, já que busca estar acima dos antigos conceitos e das concepções puramente arbitrárias do que significariam os mesmos.

Aliás, a escolha do nome “Zaratustra” para a personagem não foi aleatória, ficando clara a ironia de NIETZSCHE, já que ele não concordava com qualquer crença em que se despreze a relatividade dos conceitos.

Isso colocado, vemos que o relato se inicia contando que o profeta, aos trinta anos, muda-se para o alto de uma montanha onde vive por uma década em completa solidão, até que em certa manhã acorda sentindo-se cansado pelo acúmulo de sabedoria que o retiro lhe proporcionou. Decide, então, voltar ao convívio humano para compartilhar o seu saber com a humanidade.

No sopé da montanha encontra um velho eremita e reconhece que ambos já estiveram juntos há dez anos, quando de sua subida.

O ermitão observa as mudanças que Zaratustra sofreu com o tempo e lhe diz que quando o viu subir ele só carregava Cinzas” numa clara alusão aos conceitos antigos e que agora o vê portando Fogo” que simbolizaria a luz, a energia das novas concepções.

Na sequência, o velho lhe pergunta por que ele se dará ao trabalho de compartilhar com os demais a sapiência que arduamente conquistou? E não satisfeito, aconselha-o a ficar nas montanhas, já que os homens não conseguirão e talvez nem desejem entender a sua mensagem.

Ao lhe responder, Zaratustra questiona a validade da vida que o eremita leva e ao saber que ele se limita a cantar, a rir, a chorar e a louvar a Deus põe-se a rir, pois seria inútil debater com o mesmo.

Assim, decide seguir seu caminho e enquanto avança, repete consigo mesmocomo é possível que esse eremita ainda não tenha sabido que “Deus morreu”?

A Morte de Deus e o descrédito do Público.

A afirmativa sobre a morte de Deus, como se pode imaginar, causou um enorme rebuliço entre a intelectualidade e, mais ainda, entre o populacho insuflado pelo clero. Afinal, à época, a simples dúvida acerca da existência divina era considerada não só uma blasfêmia, mais um verdadeiro crime. Até Racionalistas do quilate de DESCARTES, por exemplo, não ousavam pensar que Deus inexistisse.

NOTA do AUTOR - ainda hoje, em pleno século XXI, é uma afirmação polêmica. Principalmente porque, quase sempre, é citada fora de contexto, tanto por ignorância quanto por má fé, e sem a devida explicação de que “a morte” refere-se mais à figura mítica que foi criada pelo homem e menos a um eventual e verdadeiro “Ente Superior”. O mau uso dado a esta afirmativa visa manipular o populacho ignorante que aceita ser conduzido por maus religiosos e lideres corruptos.

É claro que NIETZSCHE não era o único que negava a existência daquele tipo de Ser Supremo que a religião e a velha filosofia afirmavam existir. Outros homens esclarecidos partilhavam dessa negação, mas foi NIETZSCHE quem assumiu o ônus de fazer tal declaração publicamente.

E a rejeição que ele enfrentou foi pesadíssima, sendo-lhe até associado o vocábulo latino “niilismo”, que originalmente significava “descrença em tudo” e passou a ser sinônimo de “falta de caráter”.

Mas não obstante tamanha rejeição, ou talvez pela mesma, o fato é que sua teoria ganhou adeptos e se tornou a mais popular.

A ela, claro, está visceralmente ligada a noção de que o homem é “algo a ser superado”, com as indefectíveis alterações que isso causaria nos códigos Morais da Sociedade. E são justamente essas alterações e superações que ocupam as reflexões de Zaratustra enquanto ele prossegue seu caminho.

Assim, ao chegar à próxima cidade ele vê que uma multidão prepara-se para assistir à exibição de um acrobata em uma corda bamba. Juntando-se ao povo e antes que o artista iniciasse o seu espetáculo, Zaratustra toma a palavra e lhes diz: “vejam, vou ensiná-los o que é o super-homem”!

Mas a sua tentativa de lhes explicar a ideia de que “o homem é capaz de ir além”, só obteve como resposta o escárnio do público que se limitava a rir de sua arenga, imaginando que ele fizesse parte do show. A advertência do eremita já começava a se concretizar.

E fazer parte de um show, ser um reles “showman” não era uma preocupação apenas da personagem, pois NIETZSCHE também aqui sinaliza a sua apreensão sobre como o seu livro será recebido, já que teme ser visto como alguém raso, sem erudição, sem conteúdo e capaz apenas de proporcionar um divertimento popularesco.

Subvertendo Antigos Valores

NIETZSCHE acreditava que algumas ideias tornaram-se visceralmente ligadas em outras, como, por exemplo, a junção entre as concepções de Deuse dehumanidade. Destarte, quando ele afirmou que Deus morreu!” ele não proclamou apenas o fim da superstição religiosa, mas também o término do conjunto de “valores” que se julgava serem os maissublimes, “perfeitos”, “divinos”, tais como a obediência, o temor a Deus, a humildade, a paciência, a resignação etc.

morte de Deus não seria, portanto, apenas o falecimento de uma divindade criada pela carência humana, mas o fim de todos os supostos valores superlativos que foram maquiavelicamente impostos pelas elites, como se fossem verdadeiros e bons.

Humano, demasiado humano

NIETZSCHE afirmava que o homem cria alguns valores e algumas afirmativas como, por exemplo, o de que “Somos todos irmãos”, “Deus é pai”, a Abnegação, a Bondade etc. e com o correr do tempo esquece-se que os criou. E uma vez que essa origem torna-se desconhecida, tais valores passam a ser creditados a Deus, como se Ele os tivesse estabelecido; porém, os mesmos são apenas criações “humanas, demasiadamente humanas”.

Com esse argumento, o NIETZSCHE estabeleceu um dos objetivos centrais de sua filosofia, ou seja, reavaliar os padrões e os valores, bem como a importância efetiva de cada um. E para que essa reavaliação se concretize de fato, propôs que se questionassem todas as concepções habituais que se tem sobre a ética, sobre a moral e sobre o sentido, ou o significado prático da própria vida.

A Filosofia da alegria

Ao propor que os padrões fossem novamente avaliados, o filósofo insistia que estava inaugurando uma “Filosofia da Alegria*”, pois ao desacreditar o ascetismo e o sofrimento como formas de redenção, ele estava propondo que se vivesse a “alegria” do presente, do corpo, dos desejos. Da vida que se vive aqui e agora.

Para ele, muitas das coisas que julgamos boas ou virtuosas”, ou “coisas de Deus, na verdade, são apenas maneiras de limitar o acesso das pessoas aos prazeres do mundo físico. Criar regras para disciplinar à vida sexual é um claro exemplo disso. Evitar extravasar-se em público porque não seria de bom-tom é outro, ou, então, sujeitar-se a empregos tediosos apenas porque se julga que é um dever, são imposições que causam apenas tristeza.

E a sua proposta é justamente a de se confrontar essas filosofias que negam a vida e que em contrapartida ofertam apenas a vaga e incerta esperança de sermos reconhecidos como “um mártir abnegado neste mundo, ou um candidato à santidade no outro”.

NOTA do AUTOR – “Filosofia da Alegria” e não “Filosofia da Felicidade” haja vista que os preceitos da mesma visavam liberar o exercício dos prazeres físicos, concretos, hedonistas que são capazes de proporcionar algum bem estar físico, ou alguma alegria material, concreta. NIETZSCHE não se propunha ofertar a “felicidade sublime” de uma “alma imaculada”, isenta das vicissitudes da vida mundana.

Blasfemando contra a Vida

NIETZSCHE recorreu ao vocabulário religioso para dele pinçar o termo blasfêmia que normalmente é usado contra aqueles que rejeitam os cânones litúrgicos.

Porém, é claro que com ele, o vocábulo ganhou um novo significado e “blasfemo” passou a ser adjetivo de todos que negam a Vida, ie, que negam os desejos, as vontades que o homem naturalmente possui e que sufoca por pressão das normas e regras ditadas por terceiros.

Por isso, depois de proclamar a vinda do “super-homem”, Zaratustra passa a condenar a religião, especialmente o Cristianismo que, segundo ele, mentiu ao convencer o homem de a maior blasfêmia era contra Deus, quando, na verdade, era cometida a vida. 

Zaratustra reconhece, aliás, que este foi o seu maior erro. Não deveria ter-se isolado na montanha para oferecer intermináveis preces a um Deus inexistente. Ali, ele pecou contra a vida.

NOTA do AUTOR – o decantado super-homem seria alguém dotado de enorme poder e independência mental e corporal. Capaz de se libertar das amarras criadas pelas fábulas divinas, celestes e de ter a coragem de celebrar a vida, fazendo-a conforme os seus desejos. NIETZSCHE sempre negou peremptoriamente que tenha se inspirado em uma personagem histórica real, mas sempre citava os nomes de Sócrates, Napoleão Bonaparte, Shakespeare como modelos do Ser idealizado.

O Mundo Real

No Ensaio “Como o mundo verdadeiro se tornou finalmente fábula, publicado no livro “O Crepúsculo dos Deuses”, NIETZSCHE faz nova alusão à morte de Deus.

Na sequência do subtítulo, “A história de um Erro”, ele faz um resumo da história da filosofia ocidental e aponta a fábula celeste e divina, originada por uma leitura errada de PLATÃO, como a causa de termos perdido a noção da grandeza do mundo real, ou seja, físico, concreto, material.

Como se sabe, PLATÃO dividia o mundo, ou o Universo, em “Aparente” e “Real”. O primeiro seria o mundo físico, concreto, que nós captamos através dos sentidos (tato, visão, audição, paladar e olfato). O segundo,Mundo Real, seria um “lugar” abstrato, imaterial, metafísico, ao qual só teríamos acesso parcial através do intelecto, das reflexões, do pensamento.

Conforme, portanto, essa concepção, o mundo das “Aparências” não seria real, verdadeiro. Apenas uma ilusão que estaria sujeita a constantes transformações e a ter um final. O Mundo Real, ao contrário, seria eterno, infindável, imutável. Perpetuamente inalterável, independentemente de suas cópias serem feitas deste ou daquele tamanho, ou deste ou daquele material, ou, de serem bidimensionais (desenhado) ou tridimensionais (esculpido), de terem essa ou aquela utilidade, tal cor etc.

Essa conclusão, o sábio grego extraiu de suas observações sobre a Matemática. Mais precisamente de seus estudos sobre a Geometria, onde ele observou, por exemplo, que a forma, ou o formato de um Triângulo é sempre igual, não importando o seu tamanho, se foi feito de metal ou plástico, se é um pirâmide funerária, se é vermelho etc. Sabemos através do intelecto, que o modelo original daquele objeto com formato triangular é perpétuo, tendo sempre três lados, a soma de seus ângulos em 180º e suas outras características definitivas. A “Ideia Triângulo” existe imutável, independentemente de ser percebida ou não.

Como se disse algures, essa tese de PLATÃO tornou-se universalmente aceita e o conceito permeou a filosofia por milênios, ganhando inclusive outros nomes, como a coisa em si ou númeno de KANT,Essência ou a Substância de DESCARTES, SPINOZA e outros.

E mesmo a célebre divergência havida entre PLATÃO e o seu discípulo ARISTÓTELES não passou de querela acerca da localização desse Mundo das Ideias. Para o mestre, a Ideia estaria em um espaço imaterial, metafísico, enquanto que para o aluno estaria na própria Coisa, ou Ser a quem anima, dá vida. Seria a sua alma, ou espírito”.

O certo é que tanto para um, quanto para o outro, nós captamos apenas a cópia do modelo original como no caso, por exemplo, dascoisas* triangulares”, pois somos incapazes de captar a “Ideia Triângulo”.

NOTA do AUTOR – coisas triangulares*, ou seja, o objeto que tem naturalmente a forma triangular, ou que é fabricado com esse formato, como a pirâmide, a flâmula etc.

De todo modo, as “Coisas Triangulares” são fundamentais, pois além de suas utilidades práticas, através das mesmas teremos um vislumbre, ainda que pálido, da “Ideia Triângulo”, escapando das amarras do Materialismo puro. Servem como um ponto inicial, uma base, para entendermos qualquer coisa abstrata, imaterial.

Por isso, se quisermos conhecer, por exemplo, a “Bondade” nós precisaremos formar na mente um esboço dessa substância. Mas como não conseguimos formar qualquer ideia a partir do nada, recorremos aos atos, ou ações de bondade para termos uma noção – mesmo que desfocada – daquela essência.

É claro que tais visões não são perfeitas e tampouco nos mostram o “Mundo Verdadeiro” em sua totalidade. E justamente por reconhecer essa limitação é que o próprio PLATÃO já alertava para a mesma, esclarecendo que sua proposta original foi a de explicar o surgimento das Coisas, dos Seres e o porquê de haver entre os indivíduos da mesma classe, ou categoria, uma característica comum, malgrado as diferenças individuais, pessoais.

Portanto, debite-se a homens ignorantes ou mal intencionados a nefasta intenção de que a sua magistral concepção fosse aviltada e apequenada a ponto de servir de fundamento para uma crença religiosa e/ou mitológica.

Mas os homens assim o fizeram e a grandeza do Platonismo acabou servindo como base para a ideologia de uma seita que, lembremos, surgiu após dois milênios da vida do mestre helênico.

NOTA do AUTOR – para expor essa teoria, PLATÃO escreveu uma fábula chamada de “O Mito da Caverna” que é, seguramente, o melhor texto filosófico já produzido e uma das mais belas páginas da Literatura Universal. Aos interessados recomendo a sua leitura na obra de minha autoria “Filosofia Sem Mistérios – Dicionário Sintético”- Ed. Seven System – Biblioteca 24x7.

Contudo, a genialidade de PLATÃO não foi usada apenas em falcatruas. Ao contrário, pois foi a partir de seu ideário que se construiu todo o edifício em que se instalou o pensamento filosófico vigente, ainda que tuas teses sofram restrições pontuais.

Restrições, aliás, que nunca tiveram o aval de NIETZSCHE, pois a sua rejeição focava apenas o mau uso que dela foi feito. Por isso, a sua luta denodada contra o Cristianismo, em suas diversas correntes.
E sua batalha ganhou destaque graças ao furor de sua pena que expôs magistralmente seus argumentos apropriados, profundos e contundentes.

Ao contrário de muitos, ele não tentou se acomodar ao “status quo”, não se submeteu a uma aliança com o Cristianismo. Rejeitou-o com sincera e inédita transparência e isso lhe custou ácidas criticas em seu tempo e quase que um anátema entre o populacho dos tempos de hoje, que não hesita em lhe associar com as artes diabólicas.

Mas é claro que para indivíduos de seu quilate ético e intelectual, criticas desse teor sempre foram insignificantes. Como, aliás, ainda são.

Por isso, observa-se o quão atual é a sua afirmativa de que rebaixar o mundo físico, concreto a um tristevale de lágrimas é um desserviço que se presta ao homem, fazendo com que ele creia em valores errados, como o da resignação covarde, da submissão medrosa, do ascetismo sem sentido, da tola ilusão em miragens e quimeras nas quais são pródigas as diversas religiões e moralidades burguesas.

Valores Cristãos

NIETZSCHE, como se viu, não compactuou com a apropriação equivocada que o Cristianismo fizera do Platonismo e, em especial, com o fato de os cristãos terem criado “mundo real alternativo” (sic). Um paraíso, um céu, que se promete aos que praticam as ações consideradas arbitrariamente virtuosas, mas que na verdade só atendem aos interesses das elites. Restou ao mundo presente, físico, concreto o papel secundário de ser uma "escada"  que os "virtuosos" subiriam se obedecessem aos valores que a Classe Dominante estipulou como corretos.

E essa condição de "simples degrau, ou escada" corrobora o desprezo que os cristãos devem dedicar às coisas, aos Seres, aos fatos físicos, mundanos e reafirma o apelo para que se renegue a vida (ie, os desejos, as inclinações naturais do homem) em favor de “promessas” que se “realizariam no além-túmulo.

Outra faceta que mereceu as suas críticas, refere-se ao fato de que ao invés da total inacessibilidade ao mundo real como PLATÃO alertara, o “Paraíso celeste seria alcançável, após a morte, se indivíduo seguisse as “regras cristãs”.

Mas, como defender o acerto e a correção dessas regras e desses valores? O quê dizer, por exemplo, da absolvição dada aos exploradores europeus pelos genocídios e pela escravidão a que sujeitavam os nativos colonizados, desde que os mesmos fossem executados e/ou escravizados em sincronia com a pregação do “Sagrado Evangelho”? Ou, então, como comprovar a validade do chamado “Direito Divino” que “legitimava” a presunção de alguns indivíduos serem Governantes de povos e de nações por “Vontade Divina”. Ou, ainda, como confirmar que as “Regras Cristãs” seriam mesmo de autoria do próprio Deus que as teria repassado como as “Tábuas de Lei” que MOISÉS recebera, ou que teriam vindo por intermédio de outras revelações que variados “Profetas” ou “Santos” teriam recebidos? Tais regras seriam, de fato, divinas, ou uma reles manipulação de quem alegou tê-las recebido e transmitido?
É claro que tal justificativa só é aceitável pelos humildes de inteligência ou indolentes de alma, pois qualquer raciocínio mediano a classifica de imediato como absolutamente ridícula. Contudo, esse comportamento ridículo foi generalizado e ainda hoje permeia grande parte da ideologia social; e apesar de pensadores como NIETZSCHE insistirem no bom combate para exterminá-lo, sabe-se que é uma ideia tão introjetada que os resultados dificilmente serão plenamente exitosos.

O resultado, enfim, desse modo de pensar é a consideração de que devemos renegar e/ou desdenhar as nossas próprias ideias, vontades, habilidades, capacidades etc. E que devemos nos afastar e transcender, ultrapassar, a vida que vivemos como se num milagre verdadeiro, de um momento para o outro fôssemos despidos da carne e vestidos com os mantos angelicais.

E a repetição milenar dessa ladainha leva os indivíduos a desistiram de lutar pela própria felicidade, a qual, certamente, os faria mais generosos, vez que as suas necessidades estariam satisfeitas. Inclusive aquelas que demandaram esforço ético e válido para acontecerem e que por isso deveriam ser apropriadamente valorizadas.

Porém, quando se despreza tudo que existe no Presente, no físico, passa-se a viver apenas em função de uma simples quimera, de uma mera ilusão. Em função do mito que criou um falso “mundo real”.

Por isso, aliás, NIETZSCHE chamou os Padres, Pastores, Ministros e outros religiosos de “Pregadores da Morte” em razão de seus ensinamentos fazerem “publicidade das recompensas no além-túmulo, enquanto induziam ao abandono da vida (não necessariamente cometendo suicídio, mas abandonando as Coisas da vida que, ao cabo, são as nossas características mais básicas).

O Eterno Retorno

Assim, ao invés de saborearmos os prazeres que o mundo pode nos oferecer em repetidas ocasiões; em um Eterno Retorno, já que segundo o filósofo “o que acontece uma vez, acontece mil vezes”, como num lauto banquete em que os acepipes se sucedem, nós deixamos de fazer o que seria necessário para desfrutarmos dos mesmos e optamos pela inércia e pela preguiçosa espera dos prazeres celestes que o futuro nos reservaria.

Ao invés de construirmos a felicidade, optamos por deixar a vida passar, na esperança de que essa mesma felicidade nos aguarde no futuro se formos passivos e obedientes.

A Vontade de Potência

Se negarmos a nossa Vontade de Potência, ou seja, a nossa vontade, o nosso desejo de exercer o poder, de executar as ações em busca da felicidade, segundo o nosso potencial.

Um Mundo Além do Alcance

Por tudo isso, não foram raras as ocasiões em que NIETZSCHE respondeu que insistia com sua tese provocativa de que “Deus morreu”, porque era realmente o seu desejo causar uma enorme celeuma, para com ela abalar a estrutura vetusta em que o pensamento estava acomodado, mesmo que isso lhe causasse sérios prejuízos pessoais.

Se não se deve falar que foi um gesto heroico, também não se pode deixar de reconhecer o quanto foi coerente com a solidez de suas convicções.

A influência de KANT

E para que possamos entender melhor essas convicções, será oportuno recuarmos no tempo e estudar brevemente a filosofia de KANT (Immanuel, 1724–1804), cujas ideias são fundamentais para se compreender a teoria nietzschiana.

Sabe-se que os estudos kantianos focavam a questão relativa aos limites possíveis para o conhecimento humano. Em sua obra mais célebre “A Critica da Razão Pura” ele argumenta que não conseguimos conhecer, captar, apreender o mundo como ele é em si. Conseguimos captar apenas o seu corpo físico, material, mas não a sua alma, sua essência.

Segundo ele, não podemos alcançá-la nem mesmo através do intelecto, da inteligência, do raciocínio, ao contrário do que PLATÃO acreditava. Tampouco podemos atingi-la através de ações virtuosas ou pela graça divina como os religiosos prometem. Para ele, o “Mundo Real” existe efetivamente, porém está totalmente além do nosso alcance.

NOTA do AUTOR – os argumentos de Kant para chegar a essas conclusões são complexos e não serão discutidos aqui. Aos interessados recomendo a obra de minha autoria “Filosofia Sem Mistérios – Dicionário Sintético”- Ed. Seven System – Biblioteca 24x7.

E NIETZSCHE utilizou-se da tese kantiana para concluir que se o mundo real é de fato absolutamente inatingível em vida e mesmo depois da morte, ele não passaria, em verdade, de uma concepção inútil por ser apenas uma “uma possibilidade teórica”. Uma noção que deveria ser descartada, haja vista a sua impraticabilidade.

Jocosamente alguns disseram, então, que se Deus está morto, NIETZSCHE apenas encontrou o cadáver. Que seriam as “impressões digitais” de KANT, que estariam no “no cadáver divino”, pois ele foi o verdadeiro autor do deicídio. Afinal, tê-lo recoberto com a manta da completa inacessibilidade foi equivalente a suprimi-lo da vida do homem.

O Erro mais Duradouro

Assim sendo, para NIETZSCHE o equivoco mais persistente em todo pensamento humano, tanto o filosófico, quanto o religioso, é a separação que sempre se pretendeu fazer entre um supostomundo real e um eventual mundo aparente.

No texto Como o mundo verdadeiro se tornou finalmente fábula ele avançou na questão e propôs renunciarmos a ideia de que existe essa duplicidade de “mundos”. Com isso, enxergaríamos a desnecessidade de insistir na separação de essência” e “aparência e atingiríamos um patamar mais elevado no pensamento humano.

Esse é, portanto, um ponto-chave para NIETZSCHE, pois, segundo ele, quando compreendermos que existe apenas um Mundo, nós corrigiremos o erro de transferir os nossos melhores valores e atributos para um “Além” imaginário.

Após termos compreendido que só há um mundo, seremos forçados a rever os nossos valores e até o significado do que seja ser um homem, existir como um Ser humano. Veremos o quanto o homem pode se superar. O quanto é possível que exista, de fato, o super-homem.

E esse super-homem nem seria dotado de poderes sobrenaturais. Seria apenas um homem disposto a vivenciar um novo modo de ser, de existir, cuja característica fundamental seria a afirmação da vida, na qual  o indivíduo poderia utilizar seu poder pessoal, suas habilidades, capacidades e possibilidades para fazer a vida atender aos seus interesses e satisfazer os seus desejos e vontades. Ao cabo, dar um sentido à sua existência. Exercer o chamado “Sentido da Terra”.

NOTA do AUTOR – ao leitor (a) não passou despercebido que o Monismo pregado por NIETZSCHE não lhe é original. Desde os PRÉ-SOCRÁTICOS que se discute a Pluralidade versus a Unicidade, mas ele teve o mérito de beber com maestria nas fontes de KANT e HEGEL para compor a sua teoria. KANT, ao propor a inacessibilidade absoluta ao “Mundo das Essências” deu-lhe o aval necessário para que ele decretasse a inutilidade do mesmo para a vida humana. Enquanto que de HEGEL ele aproveitou o “Movimento Dialético (tese – antítese = síntese)” para explicar o processo de ascensão que pode levar o simples humano ao estágio de super-homem.

NOTA do AUTOR – quando se fala em “desejos”, “vontades” do homem nietzschiano não se quer dizer de “desejos ou vontades” vulgares, inferiores. Embora não se possam excluir totalmente as mesmas, deve-se pensar que, também, podem ser as de cunho superior, éticas, pois ambas fazem parte da vida. Ademais, classificar umas e outras como superiores ou inferiores não deixaria de ser um mero exercício de conceituação calcado em ideias oriundas da religião e das antigas concepções sociais. Um atentado contra o relativismo ocasionado pelas condições que presidem as vidas individuais e das próprias sociedades.

O Nazismo

NIETZSCHE não obteve em vida sucesso com o público. E mesmo entre a intelectualidade, o radicalismo de seu pensamento causou mais desconforto que aceitação. Essa rejeição o levou, inclusive, a ter que arcar com as despesas de publicação de seus livros, pois não encontrou editores que o bancassem.

Porém, após a sua morte a admiração foi acontecendo progressiva e continuamente até que na década de 1930 o seu conceito de “Super-homem” acabou sendo encampado maquiavelicamente pelos nazistas que passaram a lhe citar em sua retórica oficial por ordem do próprio HITLER que se lhe tornara um leitor fiel.

Seu ideário soava-lhes como se fosse uma legitimação do sistema nazifascista, particularmente no trecho em que NIETZSCHE censura a humildade subserviente contida na moral judaico-cristã que dominava a Europa.

No entanto, é claro que essa “legitimização” decorreu apenas da má compreensão – por falta de escrúpulos, ou de bom entendimento – das ideias nietzschianas, haja vista que a proposta original não previa qualquer tipo de extermínio físico, tampouco de tortura, exploração, dominação etc. Na verdade, segundo a maioria dos estudiosos, HITLER manipulou os textos de NIETZSCHE para que estes parecessem advogar o uso indiscriminado da violência, da discriminação e da eugenia.

É consenso, aliás, entre esses mesmos estudiosos que o próprio NIETZSCHE teria ficado horrorizado com essa distorção, pois a sua filosofia censurava vigorosamente os valores que os Totalitaristas defendiam: o patriotismoo nacionalismo exacerbadoa segregaçãoa religiosidade torta, a expansão colonial e outras tantas teses similares.

NIETZSCHE, na realidade, foi um dos poucos pensadores que desafiou tais conceitos e ideologias e, por ironia da história, foi um dos mais usados para dar credibilidade a tais absurdos.

Justo ele, que em um trecho de “Assim Falou Zaratustra” deixou de forma claríssima a sua opinião contrária ao nacionalismo, quando o taxou de uma “forma de alienação e fracasso”. Justo ele que havia alertado que “apenas onde o Estado termina, começa o Ser humano que não é supérfluo”.

Contudo, apesar de todas as evidências de sua rejeição a qualquer forma de Totalitarismo e de intolerância de cunho étnico ou social, ainda hoje essa nódoa persiste em sua memória e não é incomum que lhe sejam assacadas injúrias por conta dessa suposta associação; que, se houve, foi totalmente à sua revelia e sem o seu conhecimento, pois, a aproximação de seu pensamento com a manipulação nazista aconteceu após três décadas de sua morte e graças apenas à sua irmã, ELISABETH (ela sim uma antissemita convicta) que se aproveitou de sua posição de guardiã da obra nietzschiana para repassá-la ao Regime Nazista. Todavia, nem essa mancha foi capaz de ofuscar o brilho de sua filosofia.
E como se fosse uma resposta da verdade histórica a sua ideia sobre a ilimitada possibilidade do homem foi decisiva para a constituição de vários sistemas filosóficos que vicejaram depois da guerra e que trouxeram efetivas propostas de libertação frente aos esquemas religiosos e sócio-estatais.

Ademais, as suas ideias sobre a importância da autoavaliação foram deveras importantes para os pensares de vários “Filósofos Existencialistas”, como, por exemplo, SARTREque, aliás, parafraseou o “super-homem” ao afirmar que “cada um de nós deve definir o significado da própria existência”.

Tele-Evangelistas

Ainda sobre a história e a manipulação equivocada ou má intencionada das ideias nietzschianas é interessante observar o fenômeno atual que acontece no campo religioso. As Religiões Evangélicas, principalmente através dos Tele-Pastores, passaram a pregar que os seus devotos “exijam de Deus (sic)” benefícios e alegrias materiais para agora, para esta vida e não mais, como no antigo Catolicismo, para a “vida no além”. Há quase um consenso entre eles de que os fiéis devem buscar a realização material e a satisfação dos desejos no momento atual.

É claro que para tais desejos e vontades serem concedidos é imperioso que o fiel leve a vida segundo os cânones estipulados por tais “Pastores, Bispos, Missionários etc.”, os quais, nem sempre primam pela decência.

Na verdade, a exploração que sempre se fez da fé e da fragilidade humana não mudou. Alterou-se 
apenas a pressa em se cobrar de um suposto ente divino a recompensa pela sua completa submissão. Pelo seguimento lanoso de cânones estipulados arbitrariamente, sem qualquer base racional ou ética.
Cânones que NIETZSCHE combateu com vigor, denunciando-lhes a falsidade e a hipocrisia. Mas, é forçoso reconhecer que maquiavelicamente a religião se apoiou em um de seus mais ardorosos críticos para consolidar o seu crescimento.

Epílogo

Não só a filosofia se beneficiou das ideias nietzschianas, pois outros campos da Cultura também  herdaram as suas visões críticas e contrárias às tradições equivocadas do Ocidente. Com isso, vários outros eruditos e artistas puderam ousar novas Estéticas e novas Linguagens.

Assim, por tudo, NIETZSCHE se tornou uma estrela de primeira grandeza na constelação do saber humano e compreender as suas teses é vislumbrar um futuro mais livre, justo, criativo e, talvez, mais feliz.

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Produção e divulgação de TAIS ALBUQUERQUE, rien limitée, do Rio de Janeiro, na primavera de 2013.

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