A Crítica da Razão Pura
Antes de tudo é importante
assinalar que o termo “Crítica” não tem o significado que vulgarmente lhe é
dado; ou seja, não se trata de um sinônimo de “censura”. Kant não ataca a Razão
Pura*, ao contrário, enaltece-a por julgar que se trata de uma forma de
conhecimento que está isento de qualquer contaminação proveniente das
imperfeitas captações feitas pelos Sentidos (tato, visão, audição, paladar e
olfato).
Assim sendo, deve-se
entender que este é o título dado ao estudo crítico, minucioso e detalhado
dos limites e capacidades desse tipo de saber.
Se existe alguma
censura por parte de Kant, esta acontece apenas no fim do trabalho quando ele
questiona as suas limitações.
Outro ponto importante
a ser esclarecido é a própria “Razão
Pura”. O que é exatamente esse elemento?
Razão é um termo que no
contexto filosófico equivale a raciocínio, juízo, análise etc. É a capacidade
ou a faculdade de se conhecer, analisar, conceituar, definir etc. qualquer
coisa, baseando-se nas evidências sensoriais (no que foi captado pelos Sentidos)
e no ordenado segundo as regras da lógica. Quanto ao adjetivo: “Pura”, o
sentido comum se mantém e ele indica a não contaminação por dados falsos, incorretos,
incompleto etc. que são próprios do saber adquirido empiricamente.
Unindo-se, portanto, os
dois nomes tem-se: “o Saber livre dos conhecimentos deformados pelas captações
sensoriais”. Conhecimento que nos pertence graças à inata estrutura e natureza
da mente. Saberes que já residem, pelo menos potencialmente, em nossa alma
desde o nascimento.
Segundo Will Durant:
“Porque
a Razão Pura deve indicar o conhecimento que não vem através dos nossos
sentidos, mas é independente de toda experiência sensorial”.
Feitas essas preleções
inicias, veremos que por acreditar na existência desses “saberes inatos”, Kant iniciou o livro opondo-se à concepção do filósofo
Locke e dos outros membros da
chamada “Escola Inglesa”, cuja tese
principal afirmava que todo conhecimento seria proveniente das experiências
sensoriais; ou seja, do que fora captado pelos cinco sentidos humanos. Hume, outro expoente dessa tendência,
afirmava ainda que não existia a Alma, já que a Mente seria apenas uma espécie
de marcha ou de procissão de nossas ideias e que as nossas certezas não
passavam de meras probabilidades, de simples expectativas de que um resultado
verificado fosse se repetir eternamente.
Em sua oposição, Kant
argumentou que essas conclusões dos ingleses não se sustentavam pelo simples
fato de que se originavam de falsas premissas, pois segundo ele:
“Se
você presume que todo conhecimento vem das sensações separadas e distintas;
naturalmente, estas não lhe podem dar a necessidade ou as invariáveis consequências
das quais você possa ter certeza sempre”.
Em seguida, ele propôs
a seguinte reflexão:
“Admitamos
que seja impossível qualquer certeza absoluta acerca do conhecimento
proveniente da experiência, do mundo externo; mas, e se possuirmos o
conhecimento que independe da experiência? O conhecimento cuja veracidade seja
certa a priori? Nesse caso, a verdade daquele saber fá-lo-á ser um ‘saber absoluto’. Mas existirá tal saber? Haverá esse conhecimento absoluto?”.
É, portanto, a resposta a esse
questionamento o motivo e o objetivo da Crítica
da Razão Pura. A investigação sobre o quê se pode obter com a Razão, ou
Racionalidade, se lhe forem tirados os elementos da experiência. Verificar qual será a sua real capacidade e
qual o seu limite.
E para responder a
essas dúvidas, a obra examina detalhadamente a origem e a evolução dos conceitos
ou definições que damos às coisas e faz uma análise profunda da estrutura que a
mente herda geneticamente. Para Kant, nesse conjunto de dados estará a solução,
ou no mínimo as suas chaves, dos problemas metafísicos.
Em suas palavras:
“Neste
livro visei, principalmente, a completude; e me arrisco a afirmar que não deve
existir um só problema metafísico que tenha sido resolvido aqui, ou para cuja
solução não se tenha fornecido, aqui, a chave”.
Na sequência ele
assume o discurso direto e afirma que:
Para ilustrar a sua
tese, Kant cita a Matemática como um exemplo dessas “Verdades a priori”, já que
se pode imaginar que em certo dia o Sol não nasça no Oriente ou que num mundo
de amianto o fogo não queime a madeira, mas não se pode sequer supor que em
algum dia 2+2 deixe de ser quatro. Essa certeza não depende de qualquer
experiência passada, presente ou futura. E certezas como esta são absolutas e
necessárias.
Mas como esse tipo de
Saber nos ocorre? Como sabemos que é absoluto e necessário?
Temos a certeza de que ele
não provém da experiência, pois essa só nos oferece Sensações e eventos separados
que poderão ser alterados no futuro.
Assim, por redução de
alternativas, conclui-se que a origem do mesmo está na própria estrutura da
mente humana (não confundir mente e cérebro físico)
porque ela não é uma espécie de “cera” onde a experiência e a sensação dela
resultante escrevem ao seu bel prazer. Tampouco é uma abstração para a série de
estados mentais que naturalmente residem na alma humana.
Na verdade, a mente é
um “órgão” atuante que molda e coordena as Sensações transformando-as em
Percepções ou ideias. Um órgão que transforma a confusa multiplicidade
proveniente das experiências em uma ordenada série de pensamentos.
Na sequência, Kant se propõe a explicar como tais transformações acontecem e para tanto investiga a “Estética”.
Continua...
Produção e divulgação de TANIA BITENCOURT, lettres, l ´art et la culture, assessoria de Imprensa e de Relações Públicas, Rio de Janeiro, Brasil.
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