O Suicídio
Vimos que a demência
senil e a insanidade atuam como esconderijos contra os sofrimentos causados
pela alternância de luta, frustração e tédio de que se constitui a vida. Porém,
existem circunstâncias em que nem esses refúgios são suficientes e só resta ao
indivíduo buscar o esconderijo derradeiro: a morte autoinfringida.
O suicídio é execrado
em praticamente todo o Ocidente, tanto pelo aspecto religioso, quanto pelo
ético. Nalgumas religiões*, como no Judaísmo, por exemplo, não se hesita em
tratar o falecido como um desertor execrável, um pária, cujo espírito será
destinado às amarguras do Inferno (Seol) e o corpo físico aos mais remotos
cantos dos cemitérios.
No aspecto ético, a
pecha de covarde é automaticamente colocada no suicida e o seu gesto extremo,
além da perplexidade e da dor natural aos casos fatais, causa uma série
adicional de sofrimentos às suas relações familiares, profissionais, comerciais
e de amizade pela culpa que pode ocasionar, seja ela indevida ou não.
Mas, segundo
Schopenhauer, essa rejeição, na verdade, é apenas um reflexo invertido da “Vontade de Viver”, expressa pelas suas
formas individuais, isto é, os homens e suas instituições. Afinal, o Instinto
de Sobrevivência é tão imperativo que lhes soa como uma terrível blasfêmia
qualquer ato contrário a ele.
Contudo, a aversão
expressa pelos humanos não é avalizada, sequer sentida, pela “Vontade Geral”, já que para a “Essência de Tudo” a morte deliberada de
uma de suas expressões é larga e prontamente compensada por vários nascimentos
não desejados, o que torna o balanço final ainda mais positivo para si.
Assim, se for certo
vermos no suicida um indivíduo que derrotou o Instinto de Viver, é preciso, também,
que vejamos que a sua vitória foi um mero triunfo individual, pois a “Vontade”
continua na espécie, como, aliás, comprova-se pela reação da mesma ao indivíduo
que se matou.
Nas palavras de
Schopenhauer:
“O
suicídio, a voluntariosa destruição da existência fenomenal isolada, é um ato
fútil e tolo, porque “a coisa em si mesma”
– a espécie, a vida e a vontade em geral – continua inalterada por ele, assim
como o arco-íris dura, por maior que seja a velocidade com que os pingos que o
sustentam venham a cair”.
A constante
necessidade, a quase eterna frustração e o tédio ameaçador continuam depois da
morte do indivíduo; e continuarão enquanto a Vontade dominar o homem. Não
poderá haver paz nem felicidade enquanto essa mesma Essência não for subordinada
ao Conhecimento e à Inteligência. Não haverá vitória efetiva sobre os males da
vida enquanto o homem não souber “Viver com Sabedoria”.
A seguir detalharemos o
pensamento de Schopenhauer sobre este tema.
Nota
do Autor – sobre as
censuras religiosas e éticas* que são feitas ao suicida será preciso
registrar que é um comportamento associado às religiões que predominam no
Ocidente, o Judaísmo e o Cristianismo, e o oriental Islã. Outras culturas
orientais não o veem de forma tão negativa, sendo que algumas religiões da
Índia, como o Jainismo, por exemplo, adotam-no como caminho para ascensão
espiritual, principalmente através da inanição com o consequente esgotamento do
corpo físico e de seus desejos. Noutros lugares, como no Japão, por exemplo,
para muitos, o suicídio é uma alternativa válida ante o fracasso e a derrota.
Posturas que podem chocar as mentes ocidentais, mas que devem ser vistas dentro
do contexto em que acontecem.
Produção e divulgação de Pat Tavares, lettre, l´art et la culture, assessora de Imprensa e de RP., do Rio de Janeiro em Junho de 2014.
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