domingo, 13 de abril de 2014

Jean PIAGET - Psicologia, a ciência da alma.




PIAGET, JEAN
1896 – 1980

“As crianças só entendem de verdade o que elas próprias inventam”.

No século XVII o filósofo inglês John Locke afirmou que a mente de uma criança era um quadro em branco (uma tábula rasa). Posteriormente, Imannuel Kant argumentou que a moralidade era construída a partir da convivência social, independente das figuras autoritárias. Séculos depois a educadora italiana Maria Montessori implantou seu método de ensino no qual se priorizava a independência e o respeito às fases naturais do desenvolvimento infantil.

A partir de então, juntaram-se às observações dos antigos Filósofos as assertivas da professora e o conceito de educação sofreu uma vigorosa transformação com a incorporação de métodos de ensino dirigidos prioritariamente para o desenvolvimento efetivo do aluno; e a criança começou a ser vista como um Ser inteiro, com especificidades inerentes ao seu desenvolvimento físico e intelectual e não mais como “um adulto em miniatura”.

E coube a Piaget o mérito de ter sido um dos estudiosos que mais brilharam na elucidação dessas novas questões e comportamentos.

Notas biográficas

Nascido em Neuchâtel (Neuenburg), Suíça, Jean Piaget demonstrou desde a primeira infância um enorme interesse pela natureza e já aos onze anos escreveu o seu primeiro artigo cientifico.

Estudante brilhante, com apenas vinte e dois anos já conquistava o Doutorado pela universidade da cidade natal. Logo depois, interessou-se pela Psicanálise e mudou-se para a França com o objetivo de se aprimorar na matéria. E foi na pátria de tantos sábios que desenvolveu suas teorias que ganharam o titulo de Epistemologia Genética, sobre a qual traçaremos algumas linhas adiante.

Em 1921, tornou-se diretor do Instituto Jean-Jacques Rosseau, em Genebra, Suíça e se casou com Valentine Châtenay que lhe deu três filhos, os quais foram, em várias ocasiões, objetos de suas pesquisas sobre o desenvolvimento cognitivo, sem que essa prática tenha diminuído seu sentimento paternal. Em 1955, fundou o Centro Internacional de Epistemologia Genética e o dirigiu até sua morte em 1980.

Ainda em vida recebeu diversas honrarias, prêmios e títulos honoríficos no mundo todo, num justo reconhecimento pelo seu trabalho em prol da melhoria no aprendizado e da valorização do homem.

Epistemologia Genética

Julgamos oportuno adentrarmos, ainda que brevemente, nesse quesito em razão de sua importância no ideário de Piaget.

Como se sabe, o termo “Epistemologia” designa os estudos que são feitos acerca do conhecimento científico, mas essa designação genérica não se compatibilizava com as ideias do erudito que, então, acrescentou-lhe o epíteto de “Genética”, postulando que o Sujeito não pode ser considerado existente por si só, já que é imperioso estar incluído em um processo de crescimento dos conhecimentos para que seja, de fato, reconhecido como existente.

Processo de aquisição de saberes que, conforme Piaget, não depende exclusivamente de fatores externos e condicionantes como pregavam os Behavioristas, mas, também, da carga genética herdada pelo indivíduo.

Ao contrário da Epistemologia tradicional que parte do questionamento “o que é o conhecimento”, a Epistemologia Genética busca averiguar como os conhecimentos aumentam, o que equivale a estudar as etapas pelas quais eles passam, investigando a maneira como acontece a sua construção real ou psicológica.

Dentro desse sistema, Piaget esmiuçou as nuances do aprendizado e paralelamente o funcionamento do cérebro infantil em um trabalho denodado e de suma importância para que a criança passasse a ser vista de maneira totalmente diferente do que era até então.
Seus estudos, pesquisas e conclusões foram divulgados em vários Ensaios, Seminários, Palestras e através de sua obra literária, da qual damos noticia a seguir apontando as que são consideradas como principais.

Obras Principais

  1. O juízo moral da criança, 1932.
  2. Psicologia da inteligência, 1951.
  3. O nascimento da inteligência na criança, 1952.
  4. A psicologia da criança, 1962.
Ideário Sintético

1 – Os processos cognitivos (de aprendizagem) da criança são totalmente diferentes dos processos dos adultos.

2 – Elas passam automaticamente por quatro fases de desenvolvimento.

3 – Por isso, os educadores precisam oferecer tarefas adequadas à fase de desenvolvimento e estimular constantemente a independência de pensamento e a criatividade da criança em consonância com o estágio em que estiver.

4 – E terem sempre em mente que o verdadeiro objetivo do ensino é criar adultos capazes de fazer coisas novas.

É difícil discordar do conteúdo dessas quatro sentenças que hoje até nos parecem obvias, mas, deve-se lembrar de que as mesmas só vieram à luz com Piaget e outros, pois antes a Educação visava apenas amestrar a criança fazendo com que ela fosse programada para repetir os comportamentos considerados adequados.

E são essas quatro sentenças que nos darão o roteiro a ser seguido para estudarmos o ideário de Piaget que é fruto da combinação de seus anteriores conhecimentos sobre Biologia com o posterior interesse pela Epistemologia.

O Sistema é um nicho de investigação cientifica voltada para a elucidação dos enigmas que envolvem as mudanças e o crescimento da inteligência e é de tal modo sólido e profundo que, como raras vezes acontece, tornou-se um consenso quase que absoluto.

Mudanças Quantitativas e Qualitativas

Piaget não se interessava em comparar os níveis de inteligência entre crianças de diferentes idades. Não lhe interessava medir as “mudanças cognitivas quantitativas”, já que o seu foco era o desenvolvimento natural das habilidades mentais no correr do tempo, as chamadas “mudanças cognitivas qualitativas”, pois, segundo sua ótica, estudos quantitativos produzem comparações numéricas, mas o que de fato lhe interessava eram as diferenças no tipo, na experiência e na qualidade da aprendizagem infantil.

Afastando-se da abordagem behaviorista que creditava o desenvolvimento infantil apenas a fatores ambientais, Piaget dedicou-se ao estudo das capacidades inatas e congênitas, as quais levariam a criança a atingir uma série de etapas de desenvolvimento definidos pela idade.

Nota do Autor – esse apelo a fatores genéticos poderia ser associado ao conceito “a priori” de Kant ou ao conceito “evolucionista” de Darwin? Para alguns estudiosos, sim. Teria sido uma aplicação prática que Piaget fez desses conceitos filosóficos

Acreditando que as crianças são aprendizes independentes e que usam os Sentidos (tato, visão, audição, paladar e olfato) para interagir com o mundo, conforme a sua etapa de crescimento, Piaget defendeu a tese de que era de fundamental importância estimular e orientar a criança em suas explorações, dando-lhe liberdade para vivenciar diretamente o universo que a rodeia. Assegurar-lhe o direito de explorar individualmente através de tentativas e acertos o meio ambiente.

E para que tal aconteça é necessário que o bom professor a apoie e incentive a usar constantemente a criatividade e a imaginação porquanto ambas são ferramentas indispensáveis para se conseguir atingir o objetivo de formar homens e mulheres capazes de fazer coisas novas, proposto para a Educação

Aprendizagem Ativa

Em toda a sua tese acerca do desenvolvimento intelectual, Piaget insistiu que a aprendizagem é um processo pessoal e ativo. Do nascimento à infância a criança é movida pelo desejo natural de explorar e dominar o mundo de modo absolutamente subjetivo, individual.

E justamente por isso ele discordava dos chamados “testes de inteligência*” padronizados que supostamente medem a inteligência do sujeito, mas sem considerar os aspectos individuais do mesmo.
No inicio da década de 1920 ele trabalhou com os testes produzidos por Alfred Binet, porém dirigiu a sua atenção apenas para as respostas em si, sem se preocupar se estariam “certas” ou “erradas”. Interessava-lhe, sobretudo as explicações que as crianças testadas davam em suas respostas, pois nelas ele pôde comprovar a sua afirmativa de que as suposições infantis são totalmente divergentes das dos adultos e que existem, com efeito, diferenças no modo de pensar entre crianças de diferentes idades.

Nota do Autor – o mais conhecido *teste de inteligência é o que mede o QI ou Quoeficiente Intelectual. Além de Piaget, vários outros eruditos discordam dos mesmos e há quem propõe existirem diversas formas de inteligência e não apenas uma. É um assunto polêmico que encontra defensores nas duas fronteiras.

A Mente em Evolução

Como se disse alhures, até o século XVII predominava a ideia de que a criança seria “um adulto em miniatura”.

Filósofos Empiristas afirmavam que o cérebro infantil funcionava da mesma forma que o dos adultos, porém com menos desenvoltura e fazendo menos associações.

Filósofos Aprioristas julgavam que algumas ideias “superiores” como a de Tempo, Espaço, Quantidade etc. seria inatas; ou seja, pré-instaladas no cérebro do bebê que, assim, já as possuiria ao nascer. Ademais, ele teria também a capacidade necessária para utilizar tais conceitos.
Quando Piaget expôs as suas concepções e afirmou que os processos mentais de crianças e adultos são completamente diferentes, houve um rompimento radical e polêmico entre a antiga corrente e os adeptos de suas teses.

Segundo o estudioso, a única maneira de se compreender na integra o conhecimento humano seria através da compreensão de como se forma e evolui a inteligência durante a infância e, para tanto, ele criou poderosas ferramentas para executar essas pesquisas. Constituíam o seu arsenal, questionários e entrevistas que levavam os pequenos a explicarem em suas respostas as suas noções sobre as coisas que a cercavam.

Em vez das vetustas listas de perguntas fixas e impessoais, ele propôs roteiros flexíveis e graças a isso o seu método propiciava a oportunidade da criança demonstrar claramente a sua linha de raciocínio, permitindo-lhe compreender aquele processo intelectual.

E essa sua insistência em recusar a ideia de uma inteligência que pudesse ser medida ou quantificada abriu caminho para várias outras teorias sobre o aprendizado infantil e, ao cabo, sobre a própria natureza da capacidade humana de adquirir, reter, aumentar e refinar o saber.

O Desenvolvimento do Intelecto

No principio de suas pesquisas Piaget imaginava que o desenvolvimento da criança era mais afetado por fatores sociais como a Linguagem e o convívio familiar e com colegas. Porém, logo percebeu que a Linguagem não era tão importante quanto supusera e que a causa de maior impacto era as atividades executadas pelas próprias crianças. Observou, por exemplo, que os bebês têm movimentos corporais limitados (praticamente bocejam, choram e sugam) e ainda assim não demoram a exercer novas ações como a de apanhar um brinquedo. Além dessa, outras observações e experimentos convenceram-no de que é a “ação” que provoca o raciocínio nessa fase da vida, sendo a interação social apenas um coadjuvante.
Esses resultados serviram-lhe também como confirmação de que todas as crianças passam por fases de desenvolvimento cognitivo (ie. de capacidade de aprendizagem), as quais têm diferenças qualitativas e são organizadas hierarquicamente, fazendo com que a criança só avance para a fase seguinte quando conclui a anterior. Confirmou-lhe, ainda, que embora todas as crianças passem por fases determinadas e correspondentes à idade cronológica, há uma notável diferença no ritmo de cada uma, sendo tão nocivo apressar esse ritmo, quanto impedir que a criança viva cada um dos estágios, pois como são interdependentes e completares qualquer ruptura nessa corrente pode ocasionar futuros déficits intelectuais.

Nota do Autor – Com efeito, pode-se observar que os indivíduos que não puderam vivenciar a sua infância de modo normal encontram barreiras maiores nos quesitos de intelectualidade, criatividade etc. Ressalvando os casos excepcionais, é comum em países subdesenvolvidos como o Brasil, onde as crianças começam a trabalhar muito cedo e a terem responsabilidades desde a tenra infância, encontrar um grande número de pessoas incapazes de exerceram funções artísticas, intelectuais, cientificas e outras que exigem maior sofisticação intelectual e de sensibilidade. O fato do país nunca ter sido premiado com um Prêmio Nobel, por exemplo, exemplifica bem esse problema.

As Quatro Fases

As quatro fases que Piaget definiu representam os níveis em que se encontra o desenvolvimento da inteligência naquele momento e desse modo fornecem um mapa dos esquemas mentais que as crianças utilizam em momentos específicos de seu crescimento. É como se fosse feita uma radiografia do que pensam e sabem naquela fase da vida.

Durante a primeira infância esses esquemas são rudimentares e só à medida que a criança cresce é que os esquemas ganham complexidade e passam a conter dados que lhe permitem compreender o que é, por exemplo, “uma sala”, um “melhor amigo” etc. O contínuo e progressivo acréscimo nesses esquemas é que faz o indivíduo passar a ter um “comportamento inteligente”.

A 1ª Fase – o primeiro estágio dura em média os dois primeiros anos de vida do indivíduo e é chamado de Sensório Motor. Nesse período a criança aprende basicamente através do que consegue captar pelos Sentidos (tato, visão, audição, paladar e olfato) e pelas ações que logra fazer (daí o “motor”).

É uma característica desse estágio o egocentrismo absoluto do bebê que só consegue enxergar o mundo conforme o seu ponto de vista. No inicio ele age apenas por reflexos sem que possa compreendê-los ou comandá-los. Depois, torna-se capaz de prolongá-los e organizá-los e com isso pode manipular os objetos. Na sequência inicia a organização dos seus Sentidos para antecipar os fatos que possam ocorrer. Logo após, passa a experimentar e a fazer planos envolvendo objetos e a refletir sobre uma circunstância antes de agir.

Nesse ponto começa a ter autoconsciência (saber-se, reconhecer-se como pessoa) o que indica que já possui as ferramentas do chamado “Pensamento Representativo”; ou seja, já é capaz de representar mentalmente as coisas, os Seres, os fatos etc. e pode desenvolver imagens, símbolos e, principalmente, a Linguagem.

A 2ª Fase – o segundo estágio é chamado de “Pré Operacional” e se caracteriza pela atenção que a criança dedica à aparência das coisas. É, então, que ela começa a demonstrar algumas habilidades, como a organização lógica de itens segundo alguns parâmetros (altura, cores etc.) ou fazer comparações entre dois objetos, focalizando sua atenção em detalhes perceptíveis como a cor, o tamanho etc.

Dos dois aos quatro anos de idade, o raciocínio infantil ainda é restrito aos termos absolutos, porém a partir do quarto e até o sétimo passa a dominar os termos relativos (“maior que”, “mais pesado que” etc.). Contudo, a sua capacidade de pensar em sentido rigorosamente lógico ainda é restrita e o egocentrismo continua sendo muito atuante, sendo-lhe impossível a menor empatia, ou seja, colocar-se no lugar do outro, ver o mundo de seu ponto de vista.

A 3ª Fase – é chamada de “Operacional Concreto” e nele a criança já se mostra capaz de fazer operações lógicas, embora dependa de coisas sólidas ou físicas para tanto. Também é capaz de compreender o conceito de conservação e que a quantidade de algo continuará sendo a mesma independentemente de eventuais mudanças em sua aparência e de alterações no recipiente que o contenha. Pode, ainda, compreender que os objetos podem ser agrupados levando-se em consideração várias características ao mesmo tempo (uma bola de gude pode ser verde, grande e transparente, por exemplo). Nessa fase, o seu egocentrismo começa a incorporar certa relatividade às suas observações e opiniões.

A 4ª Fase – denominada de “Operacional Formal” mostra que a criança já é capaz de manipular objetos e ideias. Também é capaz de raciocínios abstratos sem necessitar de coisas físicas para embasá-los e de refletir apenas com referencias verbais. É o inicio do “pensamento hipotético” e da habilidade em acompanhar a reflexão do outro. Essa interação com as demais pessoas através de questionamentos, debates e outros diálogos indica uma diminuição em seu egocentrismo, sem, contudo, eliminá-lo completamente.

O Equilíbrio

Juntamente com a definição dos quatro estágios, Piaget demonstrou que existem em cada um deles, três aspectos fundamentais:

1)      Assimilação
2)      Acomodação
3)      Equilíbrio

Por “assimilação” entende-se o processo de captação de novas informações e o armazenamento das mesmas nos esquemas* que a criança já formou.

A “acomodação” torna-se necessária quando se percebe que não houve um encaixe perfeito entre a captação e a guarda das informações nos esquemas. Torna-se necessário, então, corrigir ou modificar os conhecimentos ou a forma de reter-lhes. A “acomodação”, uma das formas mais básicas de aprendizagem.

Dessa sorte, diz-se que a criança que é capaz de assimilar (captar e reter) com sucesso as novas informações que lhe chegam está em “estado de equilíbrio”. Porém, quando os esquemas não forem adequados para processar com êxito as novas situações vividas, vemo-la em “estado de desequilíbrio cognitivo”, necessitada de que lhe corrijam os esquemas para que possa acomodar as experiências que lhe ocorrem.

Nota do Autor – Esquema: o conjunto de ideias, percepções e ações que nos equipam com a estrutura mental necessária para que organizemos as vivências passadas e nos preparemos para as futuras.

As Transformações na Educação

O trabalho desenvolvido por Piaget encontrou enorme receptividade na Europa e nos EUA e influenciou decisivamente as mudanças havidas nos sistemas educacionais destas regiões durante as décadas de 1970 e 1980.

Seus argumentos em favor de uma abordagem que focalizasse a criança com mais atenção, tanto na prática quanto na teoria, contribuiu enormemente para que cessasse o antigo modelo que consistia em ensinar a criança a agir e a pensar como os adultos.

A partir de então, e mesmo com alguma resistência interna e externa, os professores passaram a ser orientados a compreender o universo infantil e a entender que em sua nobre função devem mais privilegiar a concessão de estímulos e incentivos para que os alunos criem novos modelos de raciocínios individuais, que lhes oferecer os saberes já constituídos.

Piaget acreditava que a Educação deveria, antes de tudo, motivar as pessoas para que se tornassem criativas, inovadoras e insubmissas às regras pré-estabelecidas, genéricas e ineficientes.

Argumentava que se do nascimento até a pré Escola o processo de aprendizagem se caracterizava pela informalidade, pela inventividade, pela experimentação direta e afeita aos gostos e interesses pessoais, não haveria motivo para que fosse alterado de forma tão radical e brusca assim que a criança passasse a frequentar a Escola. Por isso, o processo de Educação Formal deveria continuar sendo exploratório, individualizado e ativo, pois só assim seria viável o efetivo progresso intelectual do aluno.

Outro ponto que mereceu a sua atenção localizava-se na questão do “estar pronto”; isto é, na adequação do conteúdo das informações ao estágio em que a criança estiver. Adequação ao nível em que ela “esteja pronta” para absorvê-lo. Aliás, uma de suas mais significativas e duradouras contribuições à Educação, consiste na recomendação de que os educadores tenham constante atenção ao ritmo de aprendizado de cada criança, adequando sempre os ensinamentos às capacidades individuais, pois como já se disse, cada indivíduo demanda certo tempo para assimilar as novas informações que recebe.

Outra bandeira que lhe era cara diz respeito à necessidade de tornar o binômio ensino/aprendizado um processo dinâmico, estimulante, pois a observação passiva e tediosa geralmente é infrutífera. Recomendava nesse particular que os professores promovessem constantes “trabalhos de grupos” e similes, já que ele acreditava ser de extrema importância à interação entre os colegas porquanto “um dos melhores modos para firmar (gravar na memória) um conhecimento é ensiná-lo a terceiros”.
Dizia que quando o educador permite a livre discussão de um tema entre os alunos, ao invés de falar monocordiamente sobre o mesmo, observa-se que as crianças terão maiores chances de apreendê-lo e consolidar o seu conhecimento. Sobre isso, aliás, tornou-se célebre o seu aforismo:
“As crianças só entendem de verdade o que elas próprias inventam”.

A Moralidade

De forma análoga ao que sucede com a inteligência, Piaget afirmou que a Moralidade na criança também se desenvolve por estágios definidos.

Para ele, o desenvolvimento moral acontece de modo independente das figuras que representam alguma forma de autoridade, como pais e mestres, não sendo, pois, proveniente de instruções, conselhos, elogios e punições aplicadas por adultos. Na verdade, a sua origem real está nas observações que os pequenos fazem e através de seu convívio social. A interação com amigos, colegas e até com animais de estimação é que promove as noções de empatia, solidariedade, reciprocidade, justiça e compaixão.

Da mesma forma que já havia defendido a interação dos alunos na sala de aula para efeitos intelectuais, também no quesito da Moralidade ele julgava de capital importância essa associação, pois, de acordo com a sua lógica, o exercício da civilidade elevaria continuamente os padrões morais de cada um. Talvez até compensando eventuais carências nos lares (opinião do autor).

Assim, novamente, caberia ao educador a missão de promover essas associações e a troca de conhecimentos, posto que o ato de ensinar ao colega certamente eleva a autoestima de quem oferta e consolida a sensação de apoio e de amizade de quem recebe, fortalecendo em ambos os valores éticos.
Ganha-se, portanto, de todas as formas, pois enquanto se fortalecem os laços e as atitudes morais, torna-se o aprendizado mais sólido. Motivo mais que suficiente para se criar um espaço colaborativo onde as crianças ensinam e aprendem umas com as outras, enquanto desfrutam da oportunidade de explorar, indagar, questionar, obtendo, assim, um saber genuíno, muito além daquele dirigido apenas à conquista de notas e títulos.

As Críticas Recebidas

Apesar da excelente acolhida dada ao trabalho de Piaget, não faltaram censuras às suas ideias sobre a aprendizagem e a educação moral, como, aliás, seria de se esperar em um tema tão sensível quanto este e devido à influência que o ideário do mestre obteve.

Discordâncias que surgiram tanto por sincera diferença de pensar, quanto por simples inveja e ressentimento. Em relação às estas últimas nada diremos por motivos óbvios, mas em relação as primeiras será oportuno observamos três delas, até porque está na antítese a síntese que aclara todos os conceitos.

A primeira ponderação foi feita pela Psicóloga estadunidense Susan Gelman que em 1977 questionou a questão do egocentrismo infantil. Argumentou a norte-americana que segundo as suas pesquisas as crianças podem ajustar as suas explicações sobre algo, apenas para auxiliar uma pessoa vendada (simulando alguma deficiência física). Também adaptam as suas palavras ao falarem com crianças mais novas e que poderiam ter dificuldades para entender o seu discurso. Essas duas observações, segundo ela, derrubaram a tese de Piaget, já que ao terem esse cuidado elas demonstraram zelo com as pessoas em situações delicadas. Demonstraram ter consciência das necessidades alheias.

Outro censor, Lev Vygotsky, opôs-se à afirmação de que as crianças são independentes no processo de construção do conhecimento e no entendimento do mundo. Para ele, essa tese ignorava a importantíssima contribuição que as pessoas prestam para o desenvolvimento cognitivo, pois, segundo o próprio Piaget, o desenvolvimento do conhecimento e o do raciocínio é naturalmente baseado no convívio social, o que derrubaria a alegada alienação da criança. Por isso, ele propõe que o desenvolvimento humano ocorre em três níveis:

1)      Cultural
2)      Interpessoal
3)      Individual

Os dois primeiros itens foram o alvo principal de sua atenção e o objeto de sua tese sobre a “Zona de Desenvolvimento Proximal” que discorre sobre o fato das crianças necessitarem da ajuda de adultos e de crianças mais velhas para realizar certas tarefas.

Outra ideia do mestre suíço que sofreu seguidas investidas foi a questão da universalidade (em todas as crianças) das fases de desenvolvimento. Aqui, porém, as críticas não se sustentaram, pois recentes investigações sobre diversas etnias e culturas confirmaram que as “fases” são de fato símilares em todas as crianças, embora o ritmo com que são atingidas e a rapidez com que terminam sejam variáveis em função do impacto que sofrem de circunstâncias ambientais e culturais.

Apesar de Piaget não ter tido meios para comprovar na prática a sua teoria, ela se revelou acertada e de fundamental importância para a compreensão do desenvolvimento da capacidade de aprendizagem. Sobre isso, aliás, o estudioso Pierre Dasen realizou um amplo e profundo estudo em 1994 e confirmou o acerto do mestre.

Epilogo

O trabalho de Piaget abriu caminho para várias áreas de pesquisas sobre o desenvolvimento infantil e cognitivo dos humanos.

Graças a ele ocorreu grande parte das transformações havidas no entendimento do universo infantil e nos métodos educacionais, que deixaram de ser um mero repasse de conhecimentos para se tornarem o estimulo para o surgimento de novos saberes.

A ele, em grande parte, a humanidade deve o auspicioso evento da libertação da inteligência dos vetustos dogmas e preconceitos.

Mariana, MG, em 13 de abril de 2014.

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