CARL
JUNG
1875
- 1961
O inconsciente coletivo e os arquétipos.
CARL GUSTAV JUNG nasceu
no seio de uma família culta, em uma pequena vila na Suíça. Logo na primeira
infância ele se aproximou da mãe cujos episódios de depressão eram recorrentes.
Também os seus outros familiares eram considerados excêntricos.
Sua formação seguiu a
tradição, mas graças às peculiaridades da família ele não sofreu pressões para
seguir determinado rumo e por isso foi muito além da média de seus contemporâneos.
Linguista talentoso, poliglota, dominava vários idiomas europeus e até algumas
línguas antigas, como o sânscrito. Casou-se com EMMA RAUS CHENBACH, em 1903,
que lhe deu cinco filhos.
Seu interesse por psiquiatria
ocorreu após ter conhecido SIGMUND FREUD, em 1907, e encantado por suas teses
não demorou em se tornar Psicanalista, sendo considerado por muitos o legitimo
sucessor do mestre austríaco. Porém, a sua reverencia ao “Pai da Psicanálise”
sofreu alguns abalos em decorrência de suas divergências com o pensamento
freudiano tradicional e, por fim, a própria amizade foi rompida e ambos nunca
mais se encontraram.
Em 1935 tornou-se
professor na universidade de Zurique,
mas a sua carreira acadêmica foi curta, pois logo ele a abandonou para se
dedicar às suas experiências e estudos. Assim, logo após a Segunda Guerra
Mundial viajou pela África, Américas e Índia realizando pesquisas com os
nativos e participando de expedições antropológicas e arqueológicas.
As
divergências com Freud
Freud introduziu a concepção
de que não somos guiados por forças externas, como, por exemplo, “Deus”,
“Destino” e similares. Para ele, na verdade, somos motivados e controlados pelos
processos internos de nossa própria mente, especialmente pelas forças ocultas
no inconsciente. Também afirmou que as nossas experiências são afetadas por “pulsões
primais”, ou instintos primitivos, que habitam o subconsciente.
JUNG, a exemplo dos
outros pupilos, aceitava com entusiasmo essa tese, mas levou-a adiante e passou
a investigar profundamente o quê formava o inconsciente. Quais os elementos que
o constituíam e como eram os seus mecanismos, as suas maneiras de agir. Ao contrário
de FREUD ele passou a argumentar que o inconsciente era constituído pelas vivências
da coletividade e que os distúrbios psicológicos não derivavam da sexualidade,
como afirmava o mestre.
Os
símbolos e os arquétipos
O fato de os mitos e os
símbolos serem surpreendentemente similares em todas as culturas do Mundo, ao
longo do tempo, fascinava JUNG.
E isso a despeito das enormes diferenças climáticas, geológicas e culturais
entre os povos. E não tardou para que a sua inteligência superior concluísse
que os mesmos eram o resultado dos “conhecimentos e das experiências” que os
humanos compartilham enquanto espécie. E que a “memória” dessas experiências e
conhecimentos é preservada geração após geração sob a forma de arquétipos que
residem no “Inconsciente coletivo” que cada indivíduo traz em si e que atuam como
modelos de comportamento.
Cada qual, ao nascer adéqua
as suas tendências naturais ao arquétipo recebido e essa junção é que define
como será o seu comportamento, o seu modo de ser e o seu estilo de vida, bem como,
o entendimento ou a sua forma de compreender o Mundo.
A existência desses
mitos e o seu compartilhamento era a confirmação de que uma parte da psique, ou
alma humana contém ideias preservadas em uma estrutura imaterial e atemporal
que age como se fosse uma espécie de “Memória Coletiva”, ou de “Inconsciente
Coletivo” que talvez seja repassada geneticamente.
A partir dessa dedução,
JUNG propôs a sua
tese de que uma parte do “Inconsciente Coletivo” existe na mente de cada indivíduo
como se ele herdasse um “cesto de saberes” que foram adquiridos por outros e
não através de suas experimentações ou vivências pessoais. Uma parte que apresenta
apenas leves diferenças oriundas das idiossincrasias de cada povo.
NOTA
do AUTOR – arquétipo, termo oriundo do grego “archétypon”,
modelo de seres criados, ou padrão exemplar, ou modelo, ou protótipo.
As
memórias ancestrais
Para JUNG os arquétipos são como “camadas” da
memória herdada e formam a totalidade da vivência da espécie humana. Em latim,
o termo “archetypum” é traduzido como “primeiro modelo” e isto, para JUNG significava que os arquétipos são
as memórias dos antepassados mais remotos que atuando como moldes ou fôrmas no
interior da mente de cada homem, são usados inconscientemente para se organizar
e compreender as próprias atitudes.
Podemos preencher as
lacunas existentes na “Memória Coletiva” com os detalhes da vida pessoal, mas
segundo JUNG
é importante ter-se sempre a ciência de que as nossas memórias e vivências só
podem ser racionalmente entendidas graças aos modelos e parâmetros sobre as
quais repousam, ou seja, sobre a “Memória primeira, ou ancestral”.
Nada do que conseguimos
pensar, sentir e/ou executar foge desses parâmetros, ressalvando-se as diferenças
pontuais e superficiais oriundas da época e do lugar em que cada homem vive. Veja-se
que para as sensações mais básicas o padrão se mantém inalterado como se pode observar
com o fato de que a raiva que um Neandertal sentia em nada difere da sentida
pelo homem atual. Graças a essa similaridade é que se torna possível reconhecer
esse conjunto de sentimentos e ideias como algo dotado de sentido, ou de significado.
Assim, para JUNG, aquilo que nós
julgamos ser um “instinto puro”, na verdade é apenas o uso inconsciente que
fazemos dos arquétipos.
NOTA
do AUTOR – segundo o dicionário Aurélio, o instinto é
inerente ao homem e aos outros animais e atua de modo alheio à consciência, mas
com finalidades precisas, como, por exemplo, o “instinto sexual”. Já no caso
dos arquétipos o seu uso não é dirigido para uma função especifica. Servimo-nos
deles para elaborar respostas às mais diversas situações da vida.
JUNG
concordava com a divisão da mente em três partes, feita por FREUD. Porém, deu-lhes nomes
e funções diferentes, a saber:
- Ego
- como em FREUD,
o consciente, ou o “Self”.
- Inconsciente
pessoal – o “depósito” que guarda as
memórias e as vivências do indivíduo, inclusive aquelas que foram
reprimidas ou recalcadas e que conforme a teoria freudiana causam os
distúrbios mentais e/ou emocionais.
- Inconsciente
coletivo – a parte que abriga os
arquétipos, ou a Memória coletiva ou ancestral.
Os
arquétipos
Como já se disse, os
arquétipos representam situações vivenciadas por todos os homens e embora
possam ter variações de uma cultura para outra, são essencialmente iguais em
todo o Mundo. Dessa sorte, cada homem possui em seu intimo o modelo de cada um
dos arquétipos. Não é raro, aliás, que eles sejam representados artisticamente
em pinturas, esculturas etc. haja vista que protagonizam a maioria das lendas.
A forma de ser de um
arquétipo, ou seja, a sua natureza, é geralmente tão difundida que nós os
reconhecemos instantaneamente. Podemos, até mesmo, atribuir-lhes um significado
emocional, o que pode levar a que lhes sejam atreladas certas atitudes e padrões
de comportamento e de emoções.
Embora todos sejam
facilmente reconhecíveis, alguns são mais populares como, por exemplo, o “velho
sábio”, a “deusa”, a “madona”, a “grande mãe” e o “herói”. Além destes, JUNG considerava especialmente importante
o arquétipo “a persona”, pois, tomando a si mesmo como objeto de estudo, ele
percebeu que desde a mais tenra infância, tinha a tendência de mostrar apenas
uma parte de sua personalidade, assim como a quase totalidade dos Seres humanos, já que é característico
do homem dividir as suas personalidades em partes estanques que mostram apenas
as facetas que são julgadas mais apropriadas às situações. O “Self”, ou o Ego
racional que apresentamos ao Mundo, a nossa “imagem pública”, por exemplo, é o
arquétipo “persona”, o qual se divide em partes “masculinas” e “femininas” e é
moldado pela biologia e pela sociedade para assumir seus aspectos de gênero.
De acordo com essa
perspectiva, quando a modelagem biológica não segue o curso majoritário
acontecem os casos de homossexualidade, pois o corpo físico não corresponde ao
aspecto preponderante que o Self assumiu. Em relação à modelagem social tem-se
como certo que ela não tem qualquer influência nessa questão. Assim, quando nos
definimos como homem ou como mulher, desprezamos a metade de nosso potencial,
embora possamos acessá-lo através de determinado arquétipo.
Animus
e Anima
O Animus é o componente
masculino da personalidade feminina, enquanto o Anima é o oposto. São as
metades que nós abandonamos, ou que nos é suprimida quando definimos o nosso
gênero. São dois arquétipos que nos ajudam a compreender a maneira de ser do
sexo oposto e por possuírem tudo que já foi realizado por homens e mulheres,
refletem as ideias tradicionais masculinas e femininas.
O “Animus” é
representado na cultural ocidental como o protótipo masculino, ou seja, o
indivíduo musculoso, o enérgico comandante militar, movido apenas pela fria
lógica, embora seja um sedutor romântico. O arquétipo “Anima” aparece como uma
ninfa, uma virgem, uma mulher sedutora. Não é raro ser representada
artisticamente em quadro e na literatura como Helena de Tróia, Eva ou em
mulheres contemporâneas como Marilyn Monroe, cuja especialidade seria seduzir,
enfeitiçar e sugar os homens como se fosse uma versão atual das ex-mitológicas
sereias.
O
Sombra
Outro arquétipo que
temos em nosso Inconsciente representa a parte da nossa personalidade que
queremos ocultar. Chamado de “Sombra” é oposto da Persona ou Ego. Simboliza os
nossos pensamentos e as nossas emoções mais secretas e reprimidas por serem considerados
indecorosos ou inadequados de nosso caráter. Na teologia cristã é geralmente associado
com o Diabo, enquanto que na literatura leiga é comumente associado ao célebre
Mr. HYDE do Dr. JEKYLL, do famoso livro “O
médico e o monstro” de ROBERT LOUIS
STEVENSON (1886). Esse arquétipo seria o nosso lado mau,
que projetamos sobre os outros. Contudo, segundo JUNG, não se deve ver-lhe como
inteiramente negativo, haja vista que ele também pode representar aspectos
negativos de nossa personalidade que são nocivos apenas em determinadas
situações e por isso são reprimidos apenas quando elas acontecem.
O
Trapaceiro
JUNG
identificou também este outro arquétipo a quem chamou de “Trapaceiro” porque a
sua função básica é impedir que o Ego racional do indivíduo torne-se hegemônico.
É uma figura brincalhona, mas que expõe com seriedade o quão vulnerável é o indivíduo
que está sonhando com ele. É um lembrete constante sobre o risco de se levar
tudo muito a sério e de se valorizar excessivamente os desejos É um arquétipo
que também pode manifestar-se como o deus nórdico LOKI, ou o deus grego PAN, ou ANANSI,
a grande aranha divina africana, ou, ainda, um simples mágico ou palhaço.
Os
arquétipos e os sonhos
JUNG acreditava que os
sonhos formam uma espécie de ponte entre o Inconsciente e o Self, ou ego
consciente, e que os arquétipos tem importância fundamental para a decifração
dos mesmos, já que eles atuam como símbolos dentro dos sonhos, facilitando a
conversa. Acreditava, ainda, que cada arquétipo tem um significado especifico
no contexto do que foi sonhado. O “Velho (a)” sábio (a), por exemplo, pode ser
representado no sonho pela figura de um líder espiritual, um pai, um mestre, um
médico etc. indicando aquelas pessoas que oferecem conselho, orientação e
sabedoria. Ou, então, a “Grande Mãe” que pode aparecer como a própria mãe, a avó
de quem sonha, significando a criadora que oferta cuidados e reconhecimento.
Outro exemplo pode ser a “Criança Divina” representante do “Verdadeiro Self” em
sua forma mais pura, que simboliza inocência e vulnerabilidade e aparece nos
sonhos como um bebê, podendo ser associado à natureza intuitiva e espontânea. E
como existem em nosso inconsciente, podem afetar nosso estado de humor, as nossas
reações e até manifestar-se em forma de profecia, no caso da feminina Anima; ou em discursos frios e racionais no
caso do Animus.
Usando
os arquétipos
Segundo JUNG os arquétipos estão presentes na
mente humana antes mesmo dos primeiros pensamentos conscientes e, por isso,
exercem um poderoso impacto sobre a percepção que temos de nossas vivências.
Seja qual for a nossa
opinião consciente sobre o que está acontecendo, quem realmente escolhe o que
iremos perceber e vivenciar são aquelas ideias preestabelecidas que habitam o
nosso Inconsciente. O nosso lado “racional” apenas obedece às suas linhas
gerais e só dentro das mesmas é que dispõe de alguma autoridade.
Dessa forma, na
verdade, é o Inconsciente coletivo que controla o estado consciente do indivíduo
e muito do que consideramos ser um pensamento consciente ou uma deliberação
autêntica, não passa de uma orientação dada pelo subconsciente, sobretudo através
dos arquétipos organizadores.
O
verdadeiro Self
Como se viu, JUNG identificou
uma série de figuras, ou arquétipos, que representam as partes que forma a
nossa Psique. E dentre todos, ele colocou como o arquétipo principal aquele que
chamou de “O verdadeiro Self, ou Ego”, haja vista a posição central e destacada
que ele possui por ser o organizador que busca harmonizar todos os outros aspectos
e com isso formar um indivíduo íntegro, inteiro, completo.
Essa posição de
destaque associa-se diretamente com o objetivo verdadeiro da vida que é a
autorrealizaçao do individuo. A partir de seu pleno autoconhecimento o
indivíduo livra-se das questões menores que anteriormente causavam-lhe
angústia, sofrimento, desejos impossíveis, frustrações etc. e passa a vivenciar
uma liberdade que antes desconhecia. De certo modo, atinge uma espécie de
nirvana e consegue compreender a amplitude da vida, quando dela são expurgados
os sentimentos medíocres.
Será sempre um caminho
árduo até que se atinja esse patamar, mas a recompensa é altamente vantajosa,
pois nas palavras do próprio JUNG:
“(apenas) entendendo o Inconsciente é que nos
libertamos de seu domínio”.
Para JUNG quando o
verdadeiro Self ou Ego é inteiramente compreendido, esse arquétipo torna-se
fonte de sabedoria e de verdade, capaz até de conectar o indivíduo, ou o seu
Ego racional e consciente com a sua dimensão mais ampla, ou espiritual, para alguns.
Personalidade
introvertida e extrovertida. A associação de palavras.
Além dos estudos que
realizou com os arquétipos e o Inconsciente coletivo, JUNG foi o pioneiro nas
investigações acerca da prática “associação de palavras” e na introdução das noções
sobre os tipos de personalidades existentes, a “introvertida” e a “extrovertida”.
Esta divisão foi fundamental para o surgimento dos célebres “testes de personalidades”
que ainda são utilizados, como, por exemplo, a “classificação tipológica de MEYERS-BRIGGS (MBTI)”.
Epílogo
Em razão de todas as
valiosas contribuições que ofertou ao saber humano, CARL GUSTAV JUNG tornou-se
uma celebridade no campo da Psicanálise, da Antropologia e até no da
Espiritualidade, graças às suas investigações sobre tradicionais oráculos, como
o Tarô e o I Ching.
Os “seus” arquétipos
popularizaram-se de tal modo que podem ser facilmente reconhecidos em filmes,
em livros e noutras várias manifestações culturais que retratam os tipos
humanos universais.
São Paulo, 01 de agosto
de 2013.
Produção e divulgação de
YARA MONTENEGRO, assessoria de RP, da Cidade Maravilhosa de São Sebastião do
Rio de Janeiro, no Verão de 2014.
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