FREUD, Sigmund
1856 – 1939
O
inconsciente é a verdadeira “Realidade Psíquica”
Prefácio
Raríssimos cientistas
aproximaram-se tanto do público leigo quanto FREUD. Suas teses foram absorvidas pelas pessoas
comuns que através das mesmas se conscientizaram de que as suas mazelas
psíquicas e sentimentais eram enfermidades passíveis de tratamento e não
“castigos divinos” ou imposições inelutáveis da natureza. Talvez, aliás, seja
essa a causa principal da popularidade desse austríaco e menos a sua
genialidade. Afinal foi ele quem descerrou a cortina que escondia as motivações
mais intimas do Ser humano e fez do
homem o sujeito de sua história. Libertou-o da triste condição de mero joguete
da “ira divina” ou das “sortes do destino”. Deu-lhe a dignidade de ser um
paciente de uma enfermidade que poderia ser curada e o livrou do estigma de ser
uma aberração. Ou, então, reles cobaias cujos comportamentos poderiam ser
adestrados mediante os métodos behaviorista preconizados por WATSON e SKINNER,
entre outros. Demonstrou cientificamente que o homem é maior que qualquer
teoria reducionista, seja ela de cunho psicológico, social, econômico ou
religioso.
Contudo, paralelamente,
aos benefícios dessa popularização, não tardou a surgir a vulgarização dos
conceitos por ele estabelecidos, tanto por ingenuidade quanto por má fé. Logo,
os “psicólogos de botequim” e as “psicologias de sarjeta” passaram a concorrer
com os estudos sérios da matéria, pois como o próprio “FREUD explicaria” a
natureza abstrata da disciplina e a impossibilidade de se mensurar resultados
ensejou o aparecimento de todo tipo de charlatanismo.
Assim, a proposta do
presente Ensaio é expor em linguagem coloquial o pensamento magistral do “pai
da Psicanálise” que devolveu ao homem a sua dimensão espiritual sem as arapucas
que as religiões espalham pelos caminhos e que durante milênios foram a sua
única forma de acessar a metafísica. Esperamos atingir o objetivo, mas sempre
colocando-nos ao inteiro dispor para corrigirmos falhas eventuais e involuntárias.
Mas
o que é realmente a Psicanálise e a Psicoterapia?
Quando certas ideias,
memórias, impulsos ou sentimentos são dolorosos ou inapropriados em demasia
para que o consciente consiga
suportá-los, por um mecanismo de autodefesa a psique os reprime e os armazena
noutra parte da mente, chamada de inconsciente.
Ali, eles se agregam aos impulsos instintivos e todos se tornam inacessíveis à
reflexão racional, voluntária. Com o tempo as divergências entre os conteúdos do
inconsciente e do consciente colidem e disso resulta a chamada “Tensão
Psíquica” que é a causa de angústias, fobias, depressões e, em casos mais
severos, distúrbios mentais de alta complexidade que podem acarretar o risco da
agressividade, da inércia, ou do suicídio. São condições que dificultam o
cotidiano do paciente e podem impedir as suas conquistas, realizações, afetos,
alegrias etc., porém são transtornos que podem ser curados parcial ou
totalmente através da correta aplicação de terapias apropriadas que, geralmente,
trazem ao consciente esses pensamentos ou sentimentos reprimidos, permitindo
que uma vez à luz da razão, eles possam ser racionalizados e extirpados.
Revertendo crenças
ancestrais, FREUD demonstrou que a cura da alma está na mesma e que as
fantasias litúrgicas ou místicas não passam de tolas fantasias, cujo único e
duvidoso beneficio talvez seja o de abrir as portas do inconsciente graças à
sua simbologia. Muito pouco, principalmente para homens que viviam como ele a
nova era do avanço cientifico. E menos ainda para homens hodiernos que se
conscientizaram que não há mérito no sofrimento e nem virtude na dor. Que as
doenças, sejam físicas ou mentais, devem ser tratadas e curadas. Por isso, o
nome de FREUD recebe as loas que lhes são devidas. Oxalá, o seu exemplo de
dedicação, abertura e inteligência continue a semear essa visão e que a
humanidade caminhe cada vez mais para a felicidade de todos.
Notas
biográficas
SIGISMUND SCHLOMO FREUD
nasceu em Freiberg, Morávia, e ao
completar quatro anos mudou-se com a família para Viena (onde se tornou Sigmund).
Após uma exitosa carreira como estudante, formou-se em Medicina em 1886 e logo
depois abriu seu consultório especializando-se em Neurologia. Casou-se com
MARTHA BERNAYS com quem viveu um longo e feliz matrimônio.
Depois de clinicar por
certo tempo, desenvolveu o método batizado de “Cura pela fala” que se tornaria
uma forma de abordagem psicológica revolucionária: a Psicanálise. Em 1908
fundou a “Sociedade de Psicanálise” que garantiu a continuidade de sua corrente
de pensamentos, enquanto se tornava um referencial para toda uma nova geração
de psicólogos que discordavam do behaviorismo que era, então, predominante.
Durante a 2ª Guerra
Mundial, a sua condição de judeu tornou-o um alvo para os nazistas que dentre
outras formas de perseguição queimaram os seus escritos em várias praças
públicas. Para escapar de consequências ainda piores, ele e a família
refugiaram-se em Londres onde ele
acabou com a vida praticando um suicídio assistido, após ter sido diagnosticado
como paciente de um câncer na boca.
As
obras principais
- A
interpretação dos sonhos, de 1900.
- Sobre
a psicopatologia da vida cotidiana, de 1904.
- Três
ensaios sobre a teoria da sexualidade, de 1905.
- O
mal estar na civilização, de 1930.
O
inconsciente
Os textos sagrados do Hinduísmo, os VEDAS, estimados
em 2500 AEC,
descrevem a consciência como um “campo abstrato, silencioso e completamente
desconhecido”. Milênios depois, o médico e místico suíço conhecido como
“Paracelso” descreveu-o em termos médicos pela primeira vez. Na
contemporaneidade, FREUD disse:
“poetas e Filósofos
descobriram o inconsciente antes de mim... O que eu descobri foi o método
cientifico para estudá-lo...”.
Vê-se, pois, que embora
seja imaterial, o homem sempre teve noção da existência de algo que ia além de
seu próprio físico. Se antes, e ainda parcialmente agora, essa existência
vagava nas ondas do misticismo ou do pensamento abstrato filosófico, a partir
de FREUD o que era apenas uma intuição, tornou-se uma certeza cientifica.
O
inconsciente
O inconsciente ou
subconsciente é um dos conceitos mais misteriosos da psicologia. Por um lado é
visto como um depósito que guarda todas as experiências, vivências e idiossincrasias
do homem e por outra perspectiva surge como se estive “fora” do indivíduo. Um
“lugar” inatingível pela razão ou raciocínio e totalmente livre de controle
humano ou social. Um “espaço” incognoscível onde se armazenam os instintos,
pensamentos e sentimentos. Também chamado de “alma”, “espírito” etc. o inconsciente
sempre fascinou a todos, independentemente das luzes que cada qual possui.
Assim, desde os mais letrados até os mais tacanhos, em todas as épocas da
história, sempre foi tratado com curiosa reverência.
E com o célebre
neurologista e psiquiatra austríaco não foi diferente. Quase que obsessivamente,
FREUD buscou descobrir se seria possível explicar o que até então parecia
inexplicável. Seus antecessores temiam que ele contivesse uma atividade
psíquica que fosse poderosa em excesso e que pudesse ser nociva. Algo como um
“monstro incontrolável”, uma “caixa de Pandora” que uma vez aberta, ou
desvendada, liberaria todos os males. E foi justamente nesse ponto que a
genialidade FREUD começou a se revelar, pois o seu destemor em enfrentar aquela
“fera” fez o seu trabalho ser o primeiro contributo deveras positivo para a
solução dos enigmas e para o inicio dos procedimentos terapêuticos capazes de
curar as enfermidades oriundas dos desequilíbrios inconscientes. Seu labor
iniciou-se quando ele descreveu a estrutura da mente, dividindo-a em:
- Consciente
- Inconsciente
- Pré-consciente,
enquanto popularizava
as concepções de que estava no subconsciente a base da personalidade e a noção
de que ele é a “parte” da mente que define e explica os mecanismos responsáveis
pelas habilidades de pensar e de sentir.
Hipnose
e histeria
A aproximação de FREUD
ao inconsciente aconteceu em 1885 quando ele conheceu o trabalho que vinha
sendo realizado pelo neurologista francês JEAN-MARTIN CHACOT que aparentemente
lograva êxito ao tratar os sintomas de distúrbios mentais através do uso de
técnicas de hipnose. CHARCHOT considerava a histeria um distúrbio causado por
anormalidades no sistema nervoso, o que era uma concepção inédita e que
proporcionava novas e importantes possibilidades de terapêutica.
Após conhecer seus
métodos, FREUD retornou para Viena
ansioso para utilizar aquela forma de tratamento, mas encontrou dificuldades
para localizar uma técnica que fosse isenta do ranço de superstição e que fosse
considerada realmente cientifica. Nessa época, ele travou conhecimentos com
JOSEF BREUER, respeitado médico que descobrira ser possível reduzir em larga
escala as inconveniências da sintomatologia dos distúrbios mentais de uma de
suas pacientes usando apenas uma simples e aparentemente descompromissada
conversa informal, na qual ela descrevia as suas fantasias e alucinações. Para
reforçar a terapia, BREUER introduzira a hipnose para acessar mais facilmente
as recordações dos eventos traumáticos que perturbavam a moça e com essa
medida, após um breve tempo, os sintomas foram extintos ou substancialmente
reduzidos. Um resultado deveras exitoso, ainda que se tenha questionado se o
ocorrido foi ciência real, ou apenas charlatanismo, pois se duvidava inclusive
se a moça portava de fato enfermidades psíquicas. Também não faltaram os
argumentos favoráveis ao simples sugestionamento como o que ocorre nos
confessionários onde o indivíduo narra os seus pecados, as suas “ideias sujas”,
os seus “desejos sórdidos e proibidos” e acredita que foi perdoado graças à
intercessão de seu confessor. Na verdade, essa argumentação favorável à
sugestão ainda é muito repetida e não é raro encontrar quem julgue os
“problemas psicológicos” como falsos e a Psicologia como uma espécie de
charlatanismo. O certo é que apesar da consolidação e da popularização da
disciplina como ciência, recai sobre a mesma uma série de dúvidas que
obviamente estão relacionadas ao fato da mesma se dedicar a coisas abstratas,
imateriais e sutis, distantes do universo dos homens mais grosseiros e,
portanto, materialistas. Todavia é indubitável que o sofrimento psíquico e/ou
emocional é real. Existe mesmo que seja solapado pela urgência das questões concretas
e pela diminuição progressiva da sensibilidade humana.
De todo modo, após o
sucesso no tratamento BREVER concluiu que os sintomas daquela paciente eram
produzidos por lembranças perturbadoras que se escondiam nos meandros do
inconsciente e que ao serem expostas à luz da razão ou do consciente sumiram
como somem as sombras perante a luz.
Esse primeiro caso de
“Terapia Psicanalítica” celebrizado com o nome da paciente, “Srta. ANNA O.”,
consolidou essa forma de abordagem psicológica e foi a base, o alicerce sobre o
qual FREUD construiu o seu sistema. Em pouco tempo os dois cientistas travaram
relações e iniciaram uma sólida amizade e uma profícua parceira cientifica.
Juntos eles desenvolveram e popularizaram a nova metodologia de tratamento,
cuja base era a concepção de que várias formas de distúrbios, como o medo
fóbico, a angústia, a histeria, as paralisias e as dores imaginárias, algumas
paranoias etc., eram decorrentes de acontecimentos funestos ou experiências
negativas que haviam ocorrido no passado do indivíduo e que se ocultavam em seu
subconsciente causando-lhe enorme sofrimento.
Na sequência dos
trabalhos, ambos escreveram a obra Estudos sobre a histeria, de 1895,
na qual afirmavam terem encontrado a maneira de liberar as memórias reprimidas
e armazenadas no inconsciente, propiciando ao paciente trazer à luz da razão as
experiências negativas que davam origem ao seu padecimento, ocorrendo nesse
desvendamento a cura dos distúrbios.
Apesar da coautoria,
BREVER não compartilhava da ênfase exagerada, segundo sua ótica, que FREUD dava
aos aspectos ligados à sexualidade, os quais, segundo o austríaco, estariam na
raiz e nos conteúdos de todas as patologias mentais. E por conta dessa
divergência, o relacionamento amistoso e profissional entre ambos terminou.
Posteriormente a questão da ênfase na sexualidade voltaria a causar
divergências entre FREUD e alguns seguidores, dentre os quais o mais célebre
foi CARL GUSTAV JUNG.
A
mente e o cotidiano
Geralmente supomos que
a totalidade absoluta de nossos pensamentos, memórias, sentimentos, emoções
etc. estejam alojados na parte consciente de nossa mente. Para FREUD, porém, o
consciente ou a razão é apenas uma fração da nossa psique, ou mente, ou
espírito. O “estado ativo” da consciência, ou a “mente operacional” que utilizamos
para o exercício das funções rotineiras do cotidiano é apenas uma parte do
conjunto de forças que agem e constroem a nossa “Realidade Psicológica”.
O consciente existe em
um nível que nos é direta, imediata e facilmente acessível. Apartado do mesmo,
porém, encontra-se o inconsciente que armazena em suas dimensões infinitas os
“estados cognitivos*” ativos e os “comportamentos”, ou seja, as condições que
estabelecem como serão as nossas atitudes.
NOTA
do AUTOR – estados cognitivos* - as formas ou maneiras como
processamos as ideias, a percepção, a memória etc.
Pode-se dizer que o
consciente é subordinado ao inconsciente, já que segundo FREUD a razão ou
racionalidade é apenas a superfície de um “complexo e profundo oceano”. Dessa
sorte, a abrangência do inconsciente é total e contem em si o consciente e
outra área que o mestre chamou de “pré-consciente”. Tudo que é consciente
esteve em algum momento imerso nas profundezas do inconsciente e dele emergiu
num dado instante e por algum motivo.
Porém, nem tudo que
está contido no inconsciente emerge e se torna acessível. Ao contrário,
permanece oculto e influenciando o indivíduo. Por outro lado, as lembranças que
não chegam à nossa memória cotidiana, mas que não foram reprimidas por não
serem negativas habitam o “pré-consciente”, de onde podem acessadas pelo
consciente, pois este não necessita “defender-se” das mesmas, vez que elas são
inofensivas.
Todavia, aquelas
recordações traumáticas, dolorosas, que estão além da capacidade de
processamento mental do indivíduo, ficam represadas no inconsciente, pois,
segundo FREUD, toda a carga emocional negativa que podem deflagrar
inviabilizaria a vida do sujeito, que para se defender, instintivamente, as
remete para esse receptáculo e com isso consegue manter uma vida social
aparentemente normal, embora padeça de um imenso sofrimento intimo.
O
ID, o Ego e o Superego
No desenvolvimento de
seu trabalho FREUD mudou a nomenclatura das partes em que a psique se subdivide
e substituiu os conceitos de “consciente”, “inconsciente” e “pré-consciente”
passando a chamá-los de ID, Ego e Superego.
O ID, formado pelos impulsos primitivos seria regido pelo “principio
do prazer” que preconiza a satisfação de todos os desejos. Tudo deveria ser
feito imediatamente conforme a sua vontade.
Contudo, o Ego que seria regulado pelo “principio
da realidade” atua como um freio e impede que o ID prevaleça. Através do Ego se
sabe que nem tudo é possível, pois as circunstâncias da vida são limitadoras.
Existe entre essas duas
partes uma espécie de negociação, cabendo ao Ego buscar maneiras realistas e
socialmente aceitas para ajudar ao ID satisfazer as suas vontades, minimizando
as consequências nocivas.
Ao Superego caberia controlar o Ego, mostrando-lhe quais seriam essas
maneiras realistas e sensatas de auxiliar ao ID. A formação de seus parâmetros
morais teria origem no aprendizado que se recebe de pais, mestres, amigos e
outros. O Superego atuaria, pois, como um “julgador” e também como a
consciência de que algo foi feito e, ainda, como a fonte da culpa e do
arrependimento nos casos em que as ações praticadas divergiram de seus
julgamentos.
Segundo FREUD, o
inconsciente abriga uma vasta quantidade de “forças conflitantes”, pois além
das pulsões de vida e de morte, armazena as memórias intelectuais e emocionais
que foram reprimidas. Ademais, contém os aspectos contraditórios inerentes à nossa
forma de perceber a realidade física, já que a mesma está permeada pela outra
realidade que reprimimos. O confronto entre essas forças contraditórias é a
base de todo “conflito psicológico” que, por sua vez, está na raiz de todo
sofrimento exteriorizado através das fobias, angústias, neuroses etc.
A
passagem do consciente para o inconsciente
Outra influência
decisiva que FREUD recebeu veio do psicólogo ERNST BRUCKE, considerado um dos
fundadores da nova psicologia do século XIX.
A tese central de BRUCKE era a de procurar explicações mecânicas para todos os
fenômenos orgânicos, ou seja, para todas as ocorrências no corpo físico do
indivíduo. Afirmava, por exemplo, que como todos os outros Seres vivos, o homem seria em essência um “sistema de energia” e
que deveria comportar-se conforme o “principio de conservação de energia” que
preconiza que a quantidade total de energia de um sistema permanece constante
ao longo do tempo, não podendo ser destruída, mas apenas transferida ou
transformada.
FREUD utilizou esse
raciocínio aplicando-o aos “Processos Mentais*” e criando o conceito de
“Energia Psíquica” que, também, é indestrutível e pode sofrer transformações,
transmissões e conversões. Assim, se o indivíduo tiver uma lembrança traumática
para o consciente, a mente só pode remetê-lo para o subconsciente em uma
operação que ele batizou de “Recalque”, já que tal memória negativa é
indestrutível.
Pulsões
motivadoras
Além das memórias
recalcadas ou reprimidas, o inconsciente também é o abrigo onde habitam as
“pulsões instintivas” biológicas que orientam o comportamento do indivíduo e o
direcionam a optar por aquilo que lhe promete suprir suas necessidades básicas.
Com isso, garante a sobrevivência física do homem vez que o faz buscar água,
comida, abrigo, calor e companhia. E, mais importante em termos biológicos, faz
com ele sinta desejo sexual que resulta na preservação da espécie.
Além dessas pulsões, o
inconsciente também guarda a chamada “pulsão de morte” que é lhe inata e que o
impulsiona a seguir continuamente, mesmo que a cada passo ele se aproxime mais
de seu fim. Freud classificava essa pulsão como autodestrutiva justamente por
essa característica.
Tratamento
psicanalítico.
Sendo o inconsciente inacessível
e os distúrbios perceptíveis apenas quando se manifestam indiretamente o
tratamento psicanalítico necessariamente difere dos demais procedimentos de
cura, já que é obvia a inexistência de uma panaceia material para corrigir
males abstratos.
Segundo FREUD, o
sofrimento emocional resulta de um confronto inconsciente, sendo impossível lutar-se
minuto a minuto contra as pulsões “indevidas” e as “memórias reprimidas” que os
provocam. Sofrimento, aliás, que em alguns casos manifesta-se no corpo físico,
no chamado processo “psicossomático”.
Por conta dessas características,
foi necessária que a genialidade freudiana criasse uma nova forma de terapia,
absolutamente inovadora, a “Psicoterapia Psicanalítica”, ou “Psicanálise”. Sua abordagem
para lidar com os distúrbios psicológicos consiste em adentrar ao inconsciente
do paciente e trabalhar nesse “espaço” com os conflitos aí existentes, visando
livrar a pessoa das memórias recalcadas, das pulsões e desejos indevidos etc.
É um tratamento longo, difícil
e demorado. E como os seus resultados tardam ou são poucos visíveis, não é raro
que seja interrompido pelo paciente, o que, obviamente, inibe os bons
resultados e fomenta certa descrença sobre a terapêutica.
Por exigir um alto grau
de conhecimentos técnicos e humanos, a Psicanálise só é realizada por
terapeutas devidamente capacitados e especializados na técnica freudiana de
abordagem, que normalmente é executada com o paciente relaxado em um divã onde
ele fala livremente durante as sessões que podem durar horas e ocorrerem
diversas vezes na semana, por longos anos.
Esse modelo de
tratamento é plenamente justificável porque se sabe que o inconsciente não é acessível
apenas por uma simples vontade, tampouco por introspecção voltada para essa
finalidade. O único modo de se chegar a ele é saber captar as mensagens subliminares
que ele envia ao consciente, através de preferências, tendências, habilidades, limitações
etc. que o indivíduo demonstra possuir, assim como a maneira do mesmo
compreender as coisas, os fatos e as vicissitudes da vida.
Esse conjunto de características,
mais os símbolos que o indivíduo cria e/ou segue é a sua chamada “personalidade”,
ou o seu modo de ser. É a exteriorização daquilo que o seu inconsciente abriga
e que se comunica, como já disse, através das mensagens silenciosas que ele
envia e cuja decifração e interpretação demanda o concurso do Psicanalista,
pois apenas alguém capacitado para a tarefa será capaz de filtrar as memórias traumáticas
que impedem o indivíduo de viver plenamente.
Durante o processo terapêutico,
o Psicanalista age como se fosse um “mediador” que procura abrir brechas por
onde possam jorrar os pensamentos e sentimentos dolorosos e nocivos. Ele busca
abrir espaço para que esses elementos negativos venham à luz da razão para aí
serem racionalidades e curados.
É um trabalho deveras difícil,
pois as mensagens produzidas pelos conflitos entre o consciente e o inconsciente
geralmente surgem camufladas ou codificadas de tal forma que apenas os
profissionais gabaritados conseguem pinçá-las eficazmente.
As
técnicas terapêuticas
Com o tempo e com o
desenvolvimento dos saberes sobre o tema, várias técnicas foram criadas e
incorporadas ao arsenal curativo. Em comum todas tem a característica de
permitir o afloramento do inconsciente. Na sequência, as mais populares:
Sonhos
– uma das primeiras a serem utilizadas por FREUD foi a clássica “análise dos
sonhos”, pois para ele:
“a
interpretação dos sonhos é principal via de acesso para se conhecer as
atividades inconscientes da mente”.
E a importância que ele
via nos mesmos pode ser medida pelo fato de que foram os seus próprios sonhos
que embasaram a sua obra “A interpretação dos sonhos”, de 1900. Nela, ele expõe
a sua teoria de que todo sonho representa (como um ator no teatro)
a realização de um desejo, o qual quanto mais for considerado inadequado para o
consciente, mais distorcido, ou disfarçado, surgirá nos sonhos, pois o inconsciente
envia as mensagens codificadas para tentar burlar a vigilância exercida pelo juízo
do Superego.
Dentro desse tipo de
abordagem até os prédios, as casas e outros locais tem um significado oculto. As
escadarias, os subterrâneos, as portas trancas, ou um pequeno prédio num beco
escuro podem representar sentimentos reprimidos, geralmente de cunho sexual.
Acessando
o inconsciente
Outras manifestações do
inconsciente tornaram-se bastante conhecidas graças à popularização das teses
freudianas. Citaremos as duas mais conhecidas:
- O
“ato falho”, o processo de “associação
livre” etc. O primeiro caso consiste de um erro verbal, de uma espécie de
colapso de linguagem que revela uma convicção, um pensamento, ou um sentimento
que o indivíduo possui, mas que não demonstra por vários motivos e num
certo momento “escapa” a contragosto. É uma substituição involuntária e
indesejada de uma palavra por outra, similar fonética ou graficamente, que
expõe o que estava reprimido.
- A
“livre associação” é uma técnica
criada por JUNG e que FREUD usava com frequência. É praticada com o paciente
ouvindo certa palavra e dizendo em seguida o que primeiro lhe chegue à
mente. Acreditava-se que esse processo permitia que o inconsciente
emergisse, já que os “pensamentos reprimidos” poderiam ser externados
antes que o consciente pudesse bloqueá-lo.
Com essas e outras técnicas,
FREUD buscava ajudar os pacientes a se livrarem de suas memórias dolorosas,
pois ao trabalhar com as mesmas sob a luz objetiva do consciente, eles poderiam
“exorcizar” esses fantasmas, haja vista que ao mensurá-los objetivamente,
ver-se-ia que os mesmos eram menores e menos graves do que se temia. Em certos
casos a lida com os traumas vai além da extirpação dos mesmos e avança para a prevenção
de novos sofrimentos, pois o paciente, a partir de então, passa a trabalhar com
os aborrecimentos de maneira mais positiva. Deixa de sofrer passivamente e
parte em busca de tratamentos, ao invés de recalcar as emoções que antes o
levava até mesmo a ser agressivo, dependente químico, depressivo etc. Felizmente
os casos graves de distúrbios psicológicos são raros e geralmente são motivados
por traumas tão escondidos que o paciente nem se da conta de possuí-los. E é a
tentativa de repelir o que ele não percebe que o leva aos extremos de
comportamento. Nesse ponto é que entra a Psicanálise que permite a emersão desses
“fantasmas ocultos”, ou segundo a terminologia, a “Catarse”.
Escolas
ou tendências da Psicanálise
Ao enveredar por essa
ramo da medicina é provável que o Dr. SIGISMUND SCHOLOMO FREUD não tivesse a noção
exata da revolução que estava iniciando. O fato é que a partir da fundação da
Sociedade de Psicanálise em Viena um
novo mundo foi revelado e cada vez mais vem sendo desvendado.
O inconsciente deixou
de ser um ente abstrato, quase místico, para se tornar a chave que permite a
cura de males que por milênios infernizou a vida de tantas pessoas. A partir da
poderosa influência que ele passou a exercer sobre a comunidade dos
profissionais da saúde mental ele conseguir definir quais práticas eram aceitáveis
e com o tempo, os alunos e os outros profissionais fizeram a complementação da
obra que ele iniciou, contribuindo cada qual com novas ideias e
aperfeiçoamentos.
É certo que algumas alterações
e divergências acabaram por cindir a corrente de pensamento original. Dentre outros
segmentos, três se destacam:
- Freudianos
– que permaneceram fiéis às ideias originais.
- Kleinianos
– adeptos de MELAINE KLEIN
- Neofreudianos
– que posteriormente incorporaram às ideias originais de FREUD, outras práticas
e concepções.
Atualmente a Psicanálise
conta com cerca de vinte e duas tendências diferentes, mas todas embasadas pelo
pensamento do mestre austríaco que foi, indubitavelmente, um dos maiores
benfeitores da humanidade.
São Paulo, 25 de julho de 2013.
Produção e divulgação de YARA MONTENEGRO, assessoria de RP., do Rio de
Janeiro, no verão de 2014.
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