Histórico
A
crítica à Sociedade foi uma vertente muito ativa na literatura dos séculos XVII
e XVIII, num reflexo direto das novas ideias Iluministas que escancararam as
injustas condições em que vivia o povo, em contraponto aos privilégios gozados
pela aristocracia, pelo clero e por outras camadas privilegiadas.
E
dentre vários autores que se especializaram nesse segmento brilhou o talento de
Beaumarchais (Pierre-Augustin
Caronde, 1732-1799, França) que além de outros reconhecimentos,
teve duas de suas três sátiras de costumes transformadas em óperas por compositores
de escol como Paisiello (Giovanni Battista,
1740-1816, Itália atual) e Rossini que fizeram a primeira, “O Barbeiro de Sevilha”; e Mozart que se encarregou da segunda, “As
Bodas de Fígaro”, uma continuação da primeira.
A
obra de Beaumarchais foi publicada pela primeira vez em 1775 e já no ano
seguinte, 1776, foi levada à cena lírica por Paisiello que à época desfrutava
de muito prestígio, embora hoje esteja semiesquecido, tal qual a sua versão.
Porém,
quando Rossini, em 1816, pretendeu fazer nova Ópera sobre a comédia de Fígaro,
foi naquela primeira versão que ele buscou o suporte de que necessitava para
compor uma das óperas que mais se destacaram em todos os tempos, como bem se vê
nos dias atuais pelo arrebatamento que ainda causa em críticos especializados,
em simples diletantes e, até, no público leigo.
O
processo de recriação da peça de Paisiello não foi uma tarefa fácil para
Rossini em razão do prestígio daquele compositor e das inevitáveis cobranças e
comparações que o seu trabalho suscitava.
Todavia,
graças a sua genialidade, ele concluiu parcialmente o trabalho em apenas uma
quinzena. A exiguidade de tempo não foi uma opção sua, devendo-se mais ao curto
prazo que lhe foi concedido pelo Duque
Cesarini que contava estrear duas* peças no Carnaval daquele ano,
previsto para meados de fevereiro.
E
a pressa no processo deu azo para a ocorrência de vários acontecimentos
singulares e até hilários, como, por exemplo:
1) Embora
trabalhasse arduamente, Rossini não conseguiu apresentar para a noite de estreia
a “Abertura” da Ópera e usou, então, a “Abertura” de outra obra, “Elizabeth, Rainha da Inglaterra”, que
havia sido encenada anos antes, com pouca repercussão e que estava esquecida na
ocasião. O fato hilário foi que vários autoproclamados “entendidos”, “eruditos”,
“especialistas” etc. viram (sic)
naquela Abertura postiça, vários elementos e personagens de “O Barbeiro”. Note-se,
pois, que a prepotente jactância por presumida erudição não é um fenômeno dos
dias de hoje, sendo um pecado tão antigo, quanto à história do homem...
2) E
as “trocas”, os “empréstimos” não se restringiram a esse fato, pois algumas Árias
de outras obras também foram usadas, como, por exemplo, “Ecco Ridente in Ciello”
que originalmente pertence a “Aureliano em Palmira” e a famosa “La Calunnia” que compõe o acervo de “Sigismondo”...
3) Ademais
a ária cantada na cena “Lição de Música” acabou tendo a sua partitura extraviada
e como Rossini recusou-se a escrever outra, até hoje os Sopranos são liberados
para executarem a ária que lhes agradar, com a única exigência de que tenha
alguma relação com o contexto.
Improvisações
que acrescentaram um sabor mais picante ao prazer de se escutar a obra-prima de
um jovem de vinte e quatro anos de idade que soube, como raríssimos, dar ao
Mundo um de seus mais belos momentos.
Nota do Autor – A primeira obra para o evento foi
“Torvaldo e Doliska” que atualmente está esquecida; sendo a segunda a inesquecível
“O Barbeiro de Sevilha”, que desde a sua estreia no Teatro Argentina, em Roma,
conquistou a admiração geral.
São Paulo, 28 de fevereiro de 2015.
Lettré, l´art et la Culture. Rio de Janeiro, Verão de 2015.
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